A roupa da No Gender é para quem a quiser — e fala de racismo e homofobia

É para todas as identidades. Depois de Odete, chegou a Sibling, a segunda colecção da marca No Gender de Mário de Carvalho, inspirada em temas como as desigualdades raciais e a homofobia.

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Mário de Carvalho DR

Se a roupa sem género não é uma novidade, é verdade que a criação de colecções para todos é uma tendência em crescimento nos últimos anosÉ, por isso, com simplicidade que Mário de Carvalho afirma que “só não se pode usar alguma coisa se não se pagar por ela”. Aos 25 anos, o estilista acaba de lançar a segunda colecção da No Gender.

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Se a roupa sem género não é uma novidade, é verdade que a criação de colecções para todos é uma tendência em crescimento nos últimos anosÉ, por isso, com simplicidade que Mário de Carvalho afirma que “só não se pode usar alguma coisa se não se pagar por ela”. Aos 25 anos, o estilista acaba de lançar a segunda colecção da No Gender.

A marca foi lançada em Março e ganhou vida com a colecção Odete, inspirada pela avó. “A minha avó sempre foi o meu ‘autocarro dos sonhos’ porque se privou de muitas coisas para eu ter aquilo que tenho e ensinou-me que efectivamente as coisas não têm género. Nascemos como uma tela branca e, nesse sentido, tanto pela parte da minha mãe e sobretudo da minha avó fui uma tela bem pintada, que se fez liberal e consciente da sociedade”, revela Mário de Carvalho ao P3. Odete contou com cinco peças com um estampado simples com o nome da marca: uma camisola, duas t-shirts, uma camisola com capuz e um saco de pano.

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Já a mais recente Sibling homenageia os irmãos, sejam eles familiares ou amigos. João Pedro Anjos, que recentemente levou a bandeira LGBT à manifestação do Chega, é uma das inspirações e um dos modelos da colecção. A irmã mais velha do criador é também uma grande influência, dado ter assumido um papel importante durante uma fase mais difícil do estilista. “Chama-se Sibling porque é um substantivo sem género para definir irmão ou irmã e é dedicada ao meu irmão e à minha irmã. Outra razão é porque entre tribos todos se tratam por irmãos, daí que um dos slogans seja ‘já te juntaste à tribo?’”, explica.

Se a primeira colecção serviu para afirmar a identidade da marca, a segunda tem como mote questões sociais relevantes, como as desigualdades raciais ou a homofobia, um assunto particularmente importante para Mário de Carvalho, que é abertamente homossexual. Numa das camisolas lê-se “you don't have to be a man to be gay" ("não é preciso ser homem para ser gay”, em tradução livre") e tem causado “muitas dúvidas”.

“Surgiu por dois motivos: porque a representatividade lésbica no meio artístico é substancialmente inferior à representatividade homossexual com homens e também por causa de um estudo com o qual me deparei que justificava o porquê de os homens heteronormativos serem mais tolerantes para com duas lésbicas do que para com dois homens — é porque são os maiores consumidores de pornografia lésbica do mundo”, explica Mário, que com esta peça quer “apontar essa hipocrisia”, conta.

A produção é totalmente portuguesa, uma opção consciente. “Aquilo que se faz em Portugal, sobretudo no que diz respeito à moda, é óptimo. Basta vermos etiquetas da Maison Margiela ou acabamentos da Louis Vuitton ou da Prada que dizem made in Portugal. Preferi encarecer, mas ter a certeza que [o artigo] vai à máquina e não vai perder a estampa”, diz Mário. Todas as peças são 100% algodão e as totebags são inteiramente produzidas de material reciclado”, realça. Apesar do processo de fabrico ser mais caro, para o estilista é muito satisfatório ouvir “as pessoas que recebem o produto em casa dizer que a qualidade é muito boa”. Neste momento, as peças podem ser compradas através do Instagram da marca e na loja New Black Concept Store, em Lisboa, e custam entre 20 e 70 euros.

A moda é uma presença na vida de Mário de Carvalho há já 12 anos, apesar de também ser formado em Jornalismo. “Depois tirei uma pós-graduação em Marketing de Moda e posteriormente formei-me em Styling e Consultoria de Imagem, mas comecei a trabalhar na moda como modelo com 13 anos”, afirma. Desde então, tornou-se no primeiro homem com uma rubrica na revista Activa e é comentador de moda em vários programas televisivos.

E o que reserva o futuro? “A próxima colecção estreia-se em Outubro, chama-se Mãe e vai ter como tema central a saúde mental. Vai ter mais peças e vai provavelmente ser a mais completa até agora”, adianta. “Tenho uma psicopatologia e faz todo o sentido dar a cara pela minha verdade e naquilo que depender de mim, enquanto pessoa que tem uma voz activa, quero desmitificar que quem tem problemas de saúde mental não é menor que ninguém.”

Texto editado por Amanda Ribeiro