Arqueólogos recriam um vinho da época romana no Douro
Baseando-se em documentos históricos, dois arqueólogos portugueses recriaram um vinho romano que é doce, condimentado com mel e especiarias.
Arqueólogos recriaram na Região Demarcada do Douro um vinho da época romana, condimentado com mel e especiarias, e que pretende levar os consumidores numa viagem pelos sabores da história.
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Arqueólogos recriaram na Região Demarcada do Douro um vinho da época romana, condimentado com mel e especiarias, e que pretende levar os consumidores numa viagem pelos sabores da história.
O vinho Anphoras da Gallaecia - Roman Spiced Wine from Douro (vinho romano condimentado do Douro) resulta de um trabalho de arqueologia experimental desenvolvido por Gerardo Vidal Gonçalves e Dina Pereira, da Associação de História e Arqueologia de Sabrosa, distrito de Vila Real, que tem sede no pólo arqueológico da aldeia de Garganta. “Ao bebermos este vinho estamos a fazer uma viagem pelos sabores da história”, afirmou Gerardo Vidal Gonçalves à agência Lusa.
Os arqueólogos quiseram recriar um vinho da época romana e o resultado é um néctar doce, condimentado com mel e especiarias.
Segundo o investigador, o Anphoras da Gallaecia é inspirado numa receita original que faz parte de um manuscrito romano e que, depois, foi reformulada já na época medieval, com a “introdução de novos condimentos”.
Os arqueólogos basearam o seu trabalho em dois documentos históricos, o primeiro é um livro de culinária de Marco Gávio Apício, do século I d.C, altura do imperador Tibério, e o segundo, datado de 1438, pertence a uma colecção privada.
“É feito com vinho tinto do Douro, que sai de um lagar da região. Esse vinho passa depois por um processo de combinação com outros ingredientes, como o mel, ervas e especiarias, como o tomilho ou o caroço das tâmaras torrado”, explicou Gerardo Vidal Gonçalves.
O processo de fabrico é moroso, requer o aquecimento do vinho em várias fases e um período de cerca de seis meses de repouso. O arqueólogo disse que o produto final resultou também de muito trabalho de laboratório, principalmente para se definirem as quantidades certas dos ingredientes.
“Penso que conseguimos uma versão que estará muito próxima da original da época romana”, frisou. “Ainda por cima, aqui na Região Demarcada do Douro há uma ligação tão forte ao vinho e certamente que os romanos por cá passaram e produziram vinho. Há vestígios espalhados pela região”, salientou o investigador.
Pelo território foram descobertos lagares de vinho romanos escavados na rocha. Por exemplo, no concelho vizinho de Alijó, perto da aldeia de Vale de Mir, foram descobertos lagares datados do século I d.C. “Há depois toda uma parafernália de materiais arqueológicos que evidenciam o comércio do vinho e do azeite, como o caso das ânforas (vasos antigos) que são às centenas”, apontou.
O objectivo do projecto é, segundo Gerardo Vidal Gonçalves, “testar, nesta área da arqueologia experimental, uma das possibilidades porque certamente haverá outras” e, também, divulgar os produtos locais que são usados neste vinho licoroso que tem cerca de oito graus de teor alcoólico.
Dina Pereira disse que o vinho está pronto para ser comercializado e apontou como mercado alvo espaços museológicos ligados ao vinho e à cultura romana, bem como a restauração. “Este vinho demonstra o que se fazia na época”, salientou.
Nesta primeira fase foram produzidos à volta de cem litros e Dina Pereira aconselha que deve ser bebido tépido, um pouco aquecido, para “se desenvolver o aroma”.
A arqueóloga disse ainda que este produto participou no concurso “NewFood”, promovido pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) para incentivar o desenvolvimento de produtos alimentares tradicionais, orientados para a inovação e competitividade e respectiva valorização.
O projecto do vinho de época romana visa também, acrescentou, divulgar a Associação de História e Arqueologia de Sabrosa, criada para “estudar, preservar e divulgar o património do concelho”. A nível patrimonial, Dina Pereira apontou a mamoa das Madorras, a necrópole das Touças onde se iniciou uma intervenção arqueológica ou a Senhora da Azinheira onde existe arte rupestre. A actividade é desenvolvida em colaboração com a Câmara de Sabrosa e a Junta de Freguesia de São Martinho de Anta.