Museus de todo o mundo exibem durante 48 horas vídeo de Arthur Jafa sobre a América negra

Actualmente exposta na Casa do Cinema, em Serralves, a icónica obra Love is the Message, The Message is Death, ganhou uma ainda mais dramática actualidade após o homicídio de George Floyd. Em Hollywood, 300 actores e realizadores afro-americanos enviaram uma carta aberta a exigir que a indústria invista em conteúdos anti-racistas.

Foto
Nelson Garrido

Love is the Message, The Message is Death, o icónico vídeo em que Arthur Jafa rastreia a construção da identidade afro-americana – e que os portuenses podem actualmente ver em Serralves, na Casa do Cinema –, vai ser exibido ininterruptamente durante 48 horas, das 17h (hora portuguesa) de dia 26 às 17h de dia 28, nos sites de 14 museus de todo o mundo. A iniciativa partiu do Hirshhorn Museum e do Smithsonian American Art Museum, ambos sediados em Washington.

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Love is the Message, The Message is Death, o icónico vídeo em que Arthur Jafa rastreia a construção da identidade afro-americana – e que os portuenses podem actualmente ver em Serralves, na Casa do Cinema –, vai ser exibido ininterruptamente durante 48 horas, das 17h (hora portuguesa) de dia 26 às 17h de dia 28, nos sites de 14 museus de todo o mundo. A iniciativa partiu do Hirshhorn Museum e do Smithsonian American Art Museum, ambos sediados em Washington.

Realizador, director de fotografia e artista visual, Jafa recorreu à montagem de imagens contemporâneas – algumas filmadas por ele próprio, muitas encontradas na Internet e numa multiplicidade de outras fontes – para condensar num épico vídeo de sete minutos a história de violência suportada pelos afro-americanos, mas também os triunfos da sua cultura. O fortíssimo impacto que o filme teve em 2016, quando foi estreado, intensificou-se agora ainda mais no contexto da campanha anti-racista resultante do homicídio do afro-americano George Floyd por um polícia de Minneapolis, no final de Maio.

Uma das imagens de Love is the Message, The Message is Death, que dialoga com a música de Kanye West, mostra um desarmado motorista negro, Walter Scott, a ser mortalmente atingido por um polícia da Carolina do Sul em 2015. Noutro momento do vídeo vemos Barack Obama, também em 2015, a cantar o hino espiritual Amazing Grace durante o elogio fúnebre a nove paroquianos de uma igreja metodista de Charleston assassinados por um supremacista branco.

Líderes políticos como Martin Luther King ou Malcolm X, mas também artistas como Michael Jackson ou Beyoncé, aparecem em Love is the Message, The Message is Death, uma das peças em destaque na grande exposição de Arthur Jafa que Serralves manterá até final de Setembro, e que se divide entre o Museu de Arte Contemporânea e a Casa do Cinema.

A par de materiais de arquivo das lutas pelos direitos civis, de filmagens de operações policiais ou de excertos de vídeos de música pop, há uma imagem recorrente do Sol no filme de Jafa, que o realizador explica com o desejo de que a vida dos negros seja vista numa escala cosmológica e que os espectadores da sua obra “olhem para cima para estas coisas que estão a acontecer aos afro-americanos, do mesmo modo que fitariam o Sol”.

Justificando este projecto, a directora do Hirshhorn Museum, Melissa Chiu esclarece: “Em diálogo com Arthur Jafa e com os museus nossos parceiros que também têm um exemplar desta obra nas suas colecções, achámos que Love is the Message, The Message is Death tem algo de profundo a dizer acerca deste momento no tempo.”

Além dos dois museus de Washington e de outros museus americanos, como o Dallas Museum of Art, o Glenstone Museum, em Maryland, o High Museum of Art de Atlanta, o Los Angeles Museum of Contemporary Art e o Studio Museum do Harlem, em Nova Iorque, a iniciativa abarca a Tate, em Londres, a Julia Stoschek Collection, em Berlim, a Luma Arles, em Zurique, a Pinault Collection, em Paris, o Palazzo Grassi, em Veneza, e o Stedelijk Museum de Amsterdão.

Carta aberta a Hollywood

Num mesmo movimento de combate ao persistente racismo da sociedade norte-americana, mais de 300 actores e realizadores afro-americanos, incluindo Idris Elba, Queen Latifah, Zoë Kravitz, Viola Davis, Billy Porter ou Michael B. Jordan, assinaram uma carta aberta a pedir à indústria do cinema que deixe de promover conteúdos contra os negros e que glorificam a brutalidade policial e que invista em projectos anti-racistas.

“Temos uma influência significativa na cultura e na política e dispomos da capacidade para a utilizar em favor de um mundo melhor. E no entanto, historicamente e no presente, Hollywood encoraja a epidemia de violência policial e a cultura anti-negros”, denuncia a carta, publicada esta terça-feira na revista Variety.

Os signatários lamentam a apetência dos estúdios por histórias que descredibilizam a comunidade afro-americana e veiculam “persistentes lugares-comuns”, como a sugestão de que a violência seria um traço de personalidade dos negros. “Devemos pôr fim à exaltação de polícias brutais que agem fora da lei e são retratados como heróis”, defende o documento, observando que são justamente representações como essas que “encorajam agentes como Derek Chauvin, o assassino de George Floyd”.

Atribuindo à indústria do cinema uma importante responsabilidade na opressão dos negros, os artistas que assinam esta carta querem que “Hollywood prove que dá importância às vidas dos negros” (uma alusão ao lema do movimento Black Lives Matter) e “tome medidas audaciosas” para as “afirmar e defender”. O documento encerra com um conjunto de exigências: “Invistam nas nossas carreiras; invistam em conteúdos anti-racistas; invistam na nossa comunidade”.