O melhor amigo do regime chinês
Com mais ou menos intensidade na guerra comercial ou na nova guerra fria, a presidência de Trump acabou por se tornar na melhor coisa que aconteceu aos interesses do regime chinês e de Xi Jinping.
Caro leitor, se ainda não ouviu, oiça uma pequena parte que seja do último comício de Trump em Tulsa. Não fique por aí. Desperdice dois minutos da sua vida e leia os seus últimos tweets. Agora, pare escute e perca muito ou pouco tempo, conforme o interesse, a observar e a ler as comunicações do regime de Xi Jinping. Ao longo deste exercício, ponha de lado qualquer ideologia que possa existir na observação de um e outro. Não é para aqui chamada. Analise apenas a forma força e a credibilidade do que é transmitido. Neste seu papel de outsider relativo a qualquer um dos dois países, o que conclui depois de o ter feito?
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Caro leitor, se ainda não ouviu, oiça uma pequena parte que seja do último comício de Trump em Tulsa. Não fique por aí. Desperdice dois minutos da sua vida e leia os seus últimos tweets. Agora, pare escute e perca muito ou pouco tempo, conforme o interesse, a observar e a ler as comunicações do regime de Xi Jinping. Ao longo deste exercício, ponha de lado qualquer ideologia que possa existir na observação de um e outro. Não é para aqui chamada. Analise apenas a forma força e a credibilidade do que é transmitido. Neste seu papel de outsider relativo a qualquer um dos dois países, o que conclui depois de o ter feito?
Pois, na resposta a esta pergunta reside a explicação da ascensão meteórica de grande potência para superpotência global da China nos últimos três anos e meio. Tão simples quanto isso.
Quase sempre, o mundo geopolítico tende a explicar-se por fatores complexos, mas a sua base obedece à ordem natural ou racional das coisas e Trump torna tudo bastante simples.
Em pouco tempo, ficámos a conhecer mais do que em largos anos sobre algumas das práticas do regime chinês. As suspeitas passaram a factos sem contraditório. Os campos de concentração em Xinjiang, as manifestações em Hong Kong, as violações constantes aos direitos humanos e até o racismo latente que não fica atrás do americano em muitos pontos do país. Tudo somado até ao encobrir de factos relevantes no surgimento do vírus que comanda o mundo há largos meses, indiciam que bastaria uma presidência americana aceitável para descredibilizar ou desmantelar algum do poder e visão expansionista de Xi Jinping. Só que não e a atual, por mais ruído que faça e pelo que é notório, só o fortalece. Tanto assim é que muitos dos que há três anos relativizavam o atual presidente americano, hoje desvalorizam estes mesmos factos ligados ao regime chinês e à sua génese, exatamente porque do outro lado está quem está! Não deixa de ser irónico.
Mas esta explicação mais simples, também se afunila noutra mais complexa e que funciona como cimento desta realidade.
Muito para além do visível e do que às vezes sobressai, todas as políticas da Administração americana foram ao encontro desta ascensão chinesa que se reflete, por exemplo, na atual composição das mais variadas organizações multilaterais. A influência e o investimento chinês nessas instituições, grande parte das quais delineadas e criadas pelos americanos, cresceu como nunca em poucos anos e com resultados concretos. Em sentido inverso, a retração geopolítica dos EUA que obedece a uma estratégia concertada, andou de mãos dadas com a abertura de portas e o estender da passadeira ao regime de Xi Jinping. A Organização Mundial de Saúde, de que Trump se queixou tanto ontem, é só um exemplo entre muitos. Hoje, mais do dobro dos diplomatas chineses comandam agências chave das Nações Unidas em comparação com o número de diplomatas americanos naquela entidade. O cenário é idêntico na Organização Mundial do Comércio ou na da Propriedade Intelectual, área não menos relevante e que já é controlada pela China. Há pouco menos de dez, vinte ou trinta anos isto era totalmente impensável na ordem mundial e nem nos sonhos de Mao Tsé – Tung os fatores externos se teriam alinhado tanto e de forma tão facilitada para a sua concretização.
Muito se tem escrito e dito sobre o falhanço completo da estratégia do america first para os próprios americanos e questionam-se os efeitos dessa realidade nas eleições de novembro. Conforme avança o The Economist desta semana, numa sondagem do Chicago Council on Global Affairs, sete em dez americanos pretendem que o país desempenhe um papel credível na política internacional e acreditam que é melhor para a economia e o emprego americano que haja um comprometimento na esfera global. Só que demasiados demoraram a entendê-lo e a fragmentação interna atual sugere que pode ser tarde para emendar.
É que hoje também já não é só aos russos que interessa meter dinheiro na eleição de Trump. Com mais ou menos intensidade na guerra comercial ou na nova guerra fria, a sua presidência acabou por se tornar na melhor coisa que aconteceu aos interesses do regime chinês e de Xi Jinping. Trump até pode insultar ou elogiá-lo como faz repetidamente que tudo serve o presidente chinês da melhor forma e a outro nível.
Tulsa não desaparece. É a raiz, o mundo assiste e ele sabe-o.
Sem se aperceber, Donald John Trump é hoje uma marioneta nas mãos de regimes totalitários e do mais poderoso deles todos. E por mais que o cimentar da China como nação indispensável ao mundo nos possa arrepiar, é isso que se pode esperar de forma ainda mais fulminante e irreversível com mais quatro anos desta administração na Casa Branca. Todos os outros fatores da sua reeleição perdem relevância para os portugueses e europeus ao pé deste.
É importante entendê-lo até novembro.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico