Solas de sapatilhas a partir de bolas de ténis: um ás contra o desperdício
A ISI Soles foi desafiada a aproveitar restos de bolas de ténis no fabrico de solas para um par de sapatilhas sustentável. O produto final está a atrair interessados de várias partes do mundo.
Todos os anos são produzidas, globalmente, centenas de milhões de bolas de ténis, apenas para cada uma ser usada durante algumas horas antes de ir parar ao lixo — ainda não há no mercado qualquer método viável de reciclagem. E se fosse possível aproveitar bolas em fim de vida para outras indústrias? A ISI Soles - Indústria das Solas Injectadas, uma empresa sediada em Felgueiras, foi desafiada a tentar desenvolver solas de sapatilhas a partir de restos triturados de bolas de ténis.
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Todos os anos são produzidas, globalmente, centenas de milhões de bolas de ténis, apenas para cada uma ser usada durante algumas horas antes de ir parar ao lixo — ainda não há no mercado qualquer método viável de reciclagem. E se fosse possível aproveitar bolas em fim de vida para outras indústrias? A ISI Soles - Indústria das Solas Injectadas, uma empresa sediada em Felgueiras, foi desafiada a tentar desenvolver solas de sapatilhas a partir de restos triturados de bolas de ténis.
A ideia foi sugerida por um empresário holandês que disponibiliza aos funcionários da empresa courts de ténis para actividade desportiva nas horas vagas. Os trabalhadores foram recolhendo as bolas gastas ao longo das sessões de jogo durante o ano e a empresa decidiu tentar aproveitar a acumulação para um fim diferente.
As bolas de ténis têm, regra geral, um período de vida muito curto. Segundo Alberto Miguel, director técnico da Escola do Clube de Ténis do Porto, uma bola resiste, “em condições óptimas de jogo”, entre 30 minutos a uma hora antes de perder características importantes. Por essa altura, acabam por ficar “carecas”, sem pêlo. Ainda podem ser utilizadas, particularmente em escalões mais jovens, mas a menor resistência faz com que fiquem mais rápidas durante os jogos.
O desafio proposto pelo empresário consistiu, então, em tentar incorporar a borracha das bolas gastas em solas de “sapatilhas sustentáveis”, a serem oferecidas aos colaboradores durante um torneio da empresa. A ideia é recente: o desafio foi lançado à ISI Soles em finais de 2019 e a produção da encomenda foi feita já no início de 2020.
Numa pesquisa à base de “tentativa e erro”, a equipa liderada por Ana Ferreira, engenheira ambiental da ISI Soles, chegou a um equilíbrio entre os restos de bolas de ténis e o termoplástico utilizado no fabrico de solas. Nesta primeira experiência, a mistura ainda contou com uma baixa percentagem de material proveniente das bolas de ténis, “a rondar os 10%”. No entanto, Ana está confiante com o processo e explica que ainda há margem para progresso quanto ao rácio de incorporação das bolas de ténis.
“Consideramos que conseguimos mais do que duplicar os valores de incorporação da matéria-prima nas solas”, afirmou a engenheira ambiental. A maior percentagem passa por conseguir um granulado mais pequeno a partir da trituração da matéria, algo que não foi conseguido uma vez que as bolas já chegaram tratadas à fábrica.
Para ser injectada nos moldes de aço, a mistura do granulado com o termoplástico é aquecida até uma temperatura que ronda os 140 graus Celsius. É dos resíduos resultantes desta parte do processo que a empresa faz o termoplástico reciclado. Mas o aproveitamento do desperdício industrial não se limita ao termoplástico utilizado na fábrica, explica Ana Ferreira: “Há solas de borracha, mas nós não produzimos a borracha, compramos resíduos de outras empresas para incorporar nas nossas solas.”
As práticas sustentáveis valeram à ISI Soles a certificação com a norma de sistemas de gestão ambiental ISO 14001, focada na protecção ambiental e na prevenção de poluição, fazendo da empresa a primeira portuguesa de solas para calçado certificada com esta norma.
Apesar de a mistura utilizada na encomenda para a Holanda ter sido feita com termoplástico virgem, também é possível utilizar termoplástico reciclado. De acordo com Ana Ferreira, “95% dos resíduos provenientes do processo de injecção” são aproveitados pela empresa para criar material reciclado. A única diferença é que os produtos provenientes dessa matéria não têm cor personalizável: as solas “têm de ser pretas”, o que acaba por agradar a um mercado mais reduzido.
Foi também utilizada cortiça nestas primeiras solas, uma percentagem pequena, mas o máximo possível dadas as propriedades do material: a cortiça é pouco densa e muito volumosa. O novo produto já tem conquistado vários interessados: as solas “geraram grande interesse” nas feiras internacionais e já há em carteira encomendas de países como os Estados Unidos. A empresa ainda não estabeleceu parcerias com clubes de ténis para a obtenção das bolas em fim de vida, mas a receptividade tem sido grande, com contactos “até de clubes da zona de Lisboa”.