Praga de plantas invasoras afecta Albufeira de Vale de Gaio, em Alcácer do Sal

Manto de Jacintos-de-água e lentilhas-de-água alastra na barragem desde Janeiro por causa da elevada carga orgânica transportada pela ribeira do Xarrama.

Foto
Rui Gaudencio

Mais de metade do espelho de água da albufeira da barragem de Vale de Gaio desapareceu sob um manto de de jacintos-de-água (Eichhornia crassipes) e de lentilhas-de-água, (Lemna minor). Detectada em Janeiro, a situação vem-se agravando e está a preocupar agricultores e a população da freguesia de Torrão, no concelho de Alcácer-do-Sal.

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Mais de metade do espelho de água da albufeira da barragem de Vale de Gaio desapareceu sob um manto de de jacintos-de-água (Eichhornia crassipes) e de lentilhas-de-água, (Lemna minor). Detectada em Janeiro, a situação vem-se agravando e está a preocupar agricultores e a população da freguesia de Torrão, no concelho de Alcácer-do-Sal.

O presidente da Junta do Torrão, Hélder Montinhos, teme os efeitos da invasão do jacinto-de-água e da lentilha-de-água, plantas exóticas que representam uma ameaça para o ecossistema. O seu crescimento extremamente rápido, mais elevado ainda na Primavera, impede o aparecimento de algas responsáveis pela oxigenação da água, causando a morte de outros organismos aquáticos. Este fenómeno traduz-se na morte de peixes, por privação de oxigénio, num local que “é muito procurado por pescadores”. 

Os danos estendem-se à oferta turística, que tem um grande peso económico para a freguesia do Torrão. A albufeira de Vale de Gaio “possui uma das maiores e melhores pistas de remo da Europa (tem 2.500 metros de comprimento por 75 metros de largura) e, todos os anos, recebe diversas equipas e selecções de vários países” realça o presidente da junta.

Praga cobre já 250 hectares

No entanto, a imagem que a albufeira apresenta “desincentiva os praticantes do remo que acabam por ir embora por não terem condições para remar”, descreve o autarca, acrescentando que a situação “é muito preocupante, uma vez que a praga de jacintos e lentilhas de águas já cobre mais de 50 por cento do espelho de água”, (aproximadamente uma área com 250 hectares).

Hélder Montinhos referiu que os primeiros sinais da presença das infestantes foram observados no início do ano. “Fizemos chegar as nossas preocupações à Agência Portuguesa do Ambiente (APA) mas informou-nos não ser possível actuar por causa da pandemia da COVID-19 e até agora, nada foi resolvido”.

A única intervenção de que teve conhecimento, nota, resumiu-se a duas pessoas da Associação de Regantes e Beneficiários do Vale do Sado (ARBVS) que “andaram a retirar algumas plantas. Mas esta é uma operação que requer outros meios. É necessário algo com uma envergadura diferente”, observou.

Lince Faria, presidente da ARBVS, adiantou ao PÚBLICO que não é à associação de regantes que devem ser pedias explicações ou respostas para o problema, mas sim à Administração Regional Hidrográfica do Alentejo (ARH) entidade na dependência da APA, que não prestou ao PÚBLICO os esclarecimentos que lhe foram solicitados.

Vários focos de poluição

O PÚBLICO apurou que são vários os focos poluentes a descarregar para a ribeira do Xarrama, linha de água onde foi concluída no seu troço final, em 1949, a barragem de Vale de Gaio. Esta reserva de água para fins agrícolas e produção de energia, dispõe de uma capacidade total de armazenamento de cerca de 63 milhões de metros cúbicos e cobre uma superfície com 550 hectares. No final de Maio, a reserva de água era de 42.095 milhões de metros cúbicos, cerca de dois terços da sua capacidade máxima de enchimento.

Não se trata, pois, de um problema associado à escassez de água, até porque a albufeira de Vale de Gaio, recebe transvases de água, assegurados pela Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA), mas ao excedente de matéria orgânica proveniente das escorrências de várias instalações de suinicultura instaladas a montante da albufeira. Também a Estação de Tratamento de Águas Residuais de Évora descarrega os seus efluentes tratados para a ribeira do Xarrama.

Ao longo do curso desta ribeira foram plantados nos últimos anos centenas de hectares de culturas intensivas que vieram contribuir para os elevados níveis de azoto e fósforo presentes na água da albufeira, criando assim condições propícias ao aparecimento do jacinto-de-água e da lentilha-de-água.

Risco para a bacia do Sado

A EDIA adiantou ao PÚBLICO ter sido “alertada em Março” para o problema, que confirmou no local, e garante ter informado a APA e a ARBVS (entidade que gere a barragem de Vale de Gaio), “disponibilizando-se” junto desta última entidade para “colaborar na solução do problema, incluindo a colocação de uma embarcação ao serviço da Associação”. Mas até à passada terça-feira “não houve mais nenhum desenvolvimento”.

Se fragmentos ou plantas do jacinto-de-água transpuserem o descarregador de água para rega, há o risco de a planta exótica se disseminar pela bacia do Sado, afectando as culturas de arroz, adiantou ao PÚBLICO um biólogo que tem acompanhado o evoluir da situação na albufeira de Vale de Gaio.