Três mudanças nas nossas vidas por causa da covid-19
Alguns hábitos são difíceis de quebrar, mas o teletrabalho, receber a comida em casa e continuar a fazer compras online podem não ser alguns deles.
Depois de quase três meses em casa por causa da covid-19, voltar à vida normal não vai ser fácil. Pouco a pouco, o país vai-se adaptando a sair do conforto do lar e enfrentar as ruas. O teletrabalho, as entregas ao domicílio e as compras online, já tão entranhados na rotina dos portugueses, poderão vir a deixar de ter uma presença tão marcante no regresso à normalidade. Ou talvez não. O PÚBLICO fez um apanhado das notícias que foram sendo publicadas e o que foi sendo dito sobre estes temas.
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Depois de quase três meses em casa por causa da covid-19, voltar à vida normal não vai ser fácil. Pouco a pouco, o país vai-se adaptando a sair do conforto do lar e enfrentar as ruas. O teletrabalho, as entregas ao domicílio e as compras online, já tão entranhados na rotina dos portugueses, poderão vir a deixar de ter uma presença tão marcante no regresso à normalidade. Ou talvez não. O PÚBLICO fez um apanhado das notícias que foram sendo publicadas e o que foi sendo dito sobre estes temas.
1. O teletrabalho veio para ficar?
A pandemia que levou a que grande parte da população a trabalhar a partir de casa abriu os olhos para certos aspectos da vida profissional dos portugueses. Para António Brandão Moniz, professor na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, tornou-se evidente que era possível realizar-se o “trabalho de forma sobretudo digital, à distância, não presente num local de trabalho determinado”, tendo o teletrabalho “todas as potencialidades para aumentar a seguir” à presente crise.
As “resistências” ao teletrabalho já eram uma realidade antes da pandemia, tanto por parte de trabalhadores como das entidades empregadoras, segundo diz João Leal Amado, professor na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, na mesma notícia. Os trabalhadores tinham receio de que misturar a “vida profissional com a vida pessoal” se tornasse uma jornada “ilimitada” de trabalho. Por seu lado, João Leal Amado, alerta para o “risco de invasão do tempo da vida privada e familiar pelo trabalho”. “A pessoa deixa de ter referências temporais e passa a ter que praticamente estar disponível e a trabalhar a qualquer momento”, sinaliza.
Já os empregadores pensavam que perdiam “o controlo sobre o próprio trabalhador e sobre a execução do trabalho”, assinala António Brandão Moniz, mas com o teletrabalho como única opção, ambas as partes tiveram a oportunidade de perceber as vantagens e desvantagens desta modalidade. O especialista apoia que o teletrabalho, em certos casos, “deveria ser mais aplicado, sobretudo para que possa apoiar situações de trabalhadores que, por alguma razão, têm de ficar em casa para apoio à família ou por algum problema”.
Apesar de a pandemia ter alterado certas noções sobre o teletrabalho, Joana Vicente, professora da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, duvida que Portugal adopte uma solução tão ambiciosa como a que está a ser discutida pela Alemanha: “a possibilidade do teletrabalho passar a ser um direito dos trabalhadores”. No entanto, no webinar organizado pelo Cedipre - Centro de Estudos de Direito Público e Regulação, a especialista explica que a directiva comunitária que obriga Portugal a alargar o direito dos pais recorrerem ao teletrabalho até os filhos terem, pelo menos, oito anos, vai garantir um acesso alargado a esta modalidade por parte dos pais, no futuro. Cuidadores também poderão beneficiar deste regime.
Também o Governo tem como “objectivo mínimo” manter pelo menos um quarto dos 68 mil funcionários públicos em teletrabalho. A ministra da Modernização do Estado e da Administração, em audição parlamentar, no início de Maio, explicou que a percepção de que o teletrabalho “é uma forma por excelência de conciliação da vida profissional com a vida familiar” e “que se faz sem redução da produtividade e até com melhoria da qualidade de vida” fez com que o regime viesse “para ficar”.
Fernando Medina, presidente da câmara de Lisboa, durante uma videoconferência promovida pela Associação Nacional de Jovens Empresários, no início de Maio, defendeu que o teletrabalho poupa tempo em deslocações e facilita a marcação de reuniões “para juntar pessoas de origens diferentes”.
2. O restaurante passará a ser em casa?
De portas fechadas, os restaurantes tiveram de se reinventar. Muitos optaram por aderir às entregas ao domicílio e ao take-away, enquanto outros escolheram os vouchers.
Rui Bento e Nuno Rodrigues, responsáveis pelo lançamento da Uber em Portugal, desenvolveram, em conjunto com os restaurantes, “cozinhas especialmente desenhadas para o serviço de entrega de comida” – a cozinha virtual Kitch. A ideia não nasceu durante a pandemia; com as entregas ao domicílio a crescer “a um ritmo acelerado” e a transformarem-se num “hábito”, Rui Bento e Nuno Rodrigues explicaram à Fugas que já começaram a trabalhar no conceito há mais de um ano.
Num incentivo às encomendas de comida, a Uber Eats deixou de cobrar taxa de entrega durante a hora de almoço, e o Burguer King começou a fazer entregas ao domicílio. Mas também houve quem optasse pelos vouchers. O Feitoria do Hotel Altis Belém (uma estrela Michelin) e o Attla, ambos em Lisboa, aderiram à ideia do “compre agora e desfrute depois”.
Depois de a clientela se ter habituado ao conforto de receber a comida em casa, o sector da restauração enfrenta agora o desafio de voltar a atrair os clientes para fora de casa. Nidal Barake, consultor gastronómico ouvido pela Fugas, faz notar que muitas vezes os chefs veem as viagens como fonte de inspiração e aprendizagem, algo que com as fronteiras fechadas não é possível por agora. “Temo que esses restaurantes precisarão de se adaptar e atrair a clientela local, tendo uma oferta mais democrática, actualizando os seus menus com mais frequência ou oferecendo alternativas”, defende.
Vasco Coelho Santos, dos restaurantes Euskalduna Studio e Semea, no Porto, acredita que os chefs devem procurar inspiração na culinária nacional. Em declarações à Fugas, o chef faz ver que a situação actual pode levar a que os cozinheiros trabalhem mais com fornecedores locais e a uma maior valorização da cozinha portuguesa e dos produtos (e produtores) de Portugal.
3. Em vez da ida às lojas, comprar a partir do sofá?
Fechados em casa, os portugueses entraram no mundo das compras online. “As vendas nos supermercados online mantiveram crescimentos muito elevados, subindo 110% na semana entre 6 e 12 de Abril e aumentando 128% em novos lares”, segundo relatório divulgado pela Nielsen.
Dados da plataforma SIBS Analytics revelam que na semana de 18 a 24 de Maio, os sectores de entrega de comida e take-away, entretenimento, cultura e subscrições, comércio alimentar e retalho, farmácias e parafarmácias, perfumaria e cosmética, jogos e brinquedos e decoração e artigos para o lar, representaram menos de metade das compras online feitas pelos portugueses, pela primeira vez desde que foi decretado o estado de emergência.
Isto forçou os negócios com lojas físicas a adaptarem-se e diversificar os canais de venda durante a pandemia. Os serviços de entregas como a Glovo ou a Uber Eats que antes se limitavam às refeições, abriram as aplicações a entregas de outros produtos.
As redes sociais foram uma grande aposta por parte das marcas, que procuraram manter os clientes ligados através de promoções e concursos. A Sephora foi mais longe e criou uma aplicação para smartphones que para além de ter o serviço de compras online, dava a conhecer as novidades e as críticas aos produtos.
Evitar tocar em dinheiro também foi algo que os cuidados com a pandemia trouxeram aos hábitos dos portugueses. Muitos supermercados, restaurantes e outros serviços já ofereciam a opção de pagar com cartão, online ou através de aplicações móveis. Agora, estes meios de pagamento podem vir a ser incorporados em comércios que ainda não os disponibilizavam, aumentando assim os pagamentos digitais.
Texto editado por Bárbara Wong