A Cidade da Dor: um conto de Teju Cole
O escritor nigeriano-americano criou uma parábola sobre o nosso tempo. É um conto inédito, A Cidade da Dor, que o Ípsilon publica em exclusivo em Portugal. Teju Cole imaginou uma mulher a chegar a uma cidade nova, criada por refugiados e afectada por um mal.
E depois de uma daquelas viagens que envolveram o desenhar de uma linha imaginária à volta da terra, um voo que a conduziu até ao brilhante nada de um aeroporto às primeiras horas da madrugada, a viajante apanhou outro voo, por volta do meio-dia, e continuou a sua viagem. Passou seis horas naquele avião, ou talvez tenham sido dezasseis; a diferença entre ambas era difícil de perceber naquela suspensão aérea. O relógio de pulso da viajante afirmava uma coisa, o seu calendário outra, e o fuso horário do seu corpo, uma terceira. Finalmente, por volta do meio dia, o avião iniciou a aterragem e a viajante pôde ver do ar o que parecia, em quase todos os aspectos, uma metrópole familiar: o mesmo entrelaçar de vias rápidas, os mesmos jardins oblongos, a repetição das mesmas torres. Lembrou-lhe, como sempre lhe lembravam as vistas aéreas, o que a mãe uma vez lhe contou sobre o colapso de estrelas enormes, que podiam encolher até ficarem com uma amplitude não maior do que uma cidade. A avaliar apenas pela distância percorrida, a viajante podia muito bem ter dado a volta ao globo e regressado ao lugar de onde tinha partido. Mas havia qualquer coisa naquela vista que a convencia do contrário: a cidade imensa era circular e o emaranhado de vias rápidas no centro ordenava-se em direcção a vias maiores que avançavam para fora como os aros de uma roda. Foi essa regularidade cartográfica que a fez saber que tinha chegado, pela primeira vez, à cidade de Reggiana.
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E depois de uma daquelas viagens que envolveram o desenhar de uma linha imaginária à volta da terra, um voo que a conduziu até ao brilhante nada de um aeroporto às primeiras horas da madrugada, a viajante apanhou outro voo, por volta do meio-dia, e continuou a sua viagem. Passou seis horas naquele avião, ou talvez tenham sido dezasseis; a diferença entre ambas era difícil de perceber naquela suspensão aérea. O relógio de pulso da viajante afirmava uma coisa, o seu calendário outra, e o fuso horário do seu corpo, uma terceira. Finalmente, por volta do meio dia, o avião iniciou a aterragem e a viajante pôde ver do ar o que parecia, em quase todos os aspectos, uma metrópole familiar: o mesmo entrelaçar de vias rápidas, os mesmos jardins oblongos, a repetição das mesmas torres. Lembrou-lhe, como sempre lhe lembravam as vistas aéreas, o que a mãe uma vez lhe contou sobre o colapso de estrelas enormes, que podiam encolher até ficarem com uma amplitude não maior do que uma cidade. A avaliar apenas pela distância percorrida, a viajante podia muito bem ter dado a volta ao globo e regressado ao lugar de onde tinha partido. Mas havia qualquer coisa naquela vista que a convencia do contrário: a cidade imensa era circular e o emaranhado de vias rápidas no centro ordenava-se em direcção a vias maiores que avançavam para fora como os aros de uma roda. Foi essa regularidade cartográfica que a fez saber que tinha chegado, pela primeira vez, à cidade de Reggiana.