Covid-19: Suécia admite que deveria ter imposto restrições mais severas

O epidemiologista Anders Tegnell fez declaração depois de o primeiro-ministro ter anunciado abertura de inquérito à gestão da doença. Na Suécia, já morreram quase 4500 pessoas devido ao SARS-CoV-2.

Foto
Anders Tegnell, responsável pela gestão da pandemia de covid-19 na Suécia LUSA/HENRIK MONTGOMERY

O epidemiologista Anders Tegnell, responsável pela gestão da pandemia de covid-19 na Suécia, admitiu esta quarta-feira, pela primeira vez, que o país deveria ter imposto medidas de confinamento mais severas para travar o número de mortes.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O epidemiologista Anders Tegnell, responsável pela gestão da pandemia de covid-19 na Suécia, admitiu esta quarta-feira, pela primeira vez, que o país deveria ter imposto medidas de confinamento mais severas para travar o número de mortes.

“Se nos deparássemos com a mesma doença, com aquilo que sabemos hoje, acho que ficaríamos a meio caminho entre o que a Suécia fez e o que resto do mundo fez”, afirmou Anders Tegnell, rosto do combate à pandemia no país, em entrevista à rádio sueca Severiges, citado pelo Financial Times.

O reconhecimento de que a estratégia do país escandinavo podia ter sido diferente — a Suécia, desde o início da pandemia, optou por uma gestão mais suave das restrições, mantendo restaurantes e cafés abertos, bem como muitas escolas — surge depois de Tegnell ter passado meses a criticar medidas de confinamento mais restritivas noutros países, defendendo afincadamente a estratégia sueca.

Questionado sobre já tinham morrido demasiadas pessoas no país devido à covid-19, Tegnell foi peremptório ao afirmar que “sim, absolutamente”, reconhecendo que houve “um potencial para melhorar aquilo que foi feito” na Suécia.

Na passada segunda-feira, o Governo sueco, liderado por Stefan Löfven, anunciou que, antes do Verão, uma comissão de inquérito vai começar a trabalhar na avaliação da gestão da pandemia de SARS-CoV-2, cedendo à pressão da oposição, que começou a questionar a estratégia seguida pelo executivo de centro-esquerda. Além disso, vários países têm criticado a estratégia da Suécia, que se tornou uma referência para quem defende a necessidade de impor menos restrições para poupar a economia e motivo de acesos debates sobre vantagens e desvantagens das medidas de confinamento.

A estratégia sueca tem passado por uma atitude de responsabilização individual e por medidas voluntárias de confinamento. No entanto, à medida que a pandemia alastrava no país, a estratégia seguida revelou-se particularmente trágica nos lares de idosos, onde se registaram aproximadamente metade das mortes no país. 

Annika Linde, epidemiologista que exerceu o cargo de Anders Tegnell entre 2005 e 2013, veio mesmo a público criticar o seu sucessor, denunciando a “falta de estratégia para os mais velhos”, um problema assumido pelo Governo de Stefan Löfven, que admitiu que poderia ter feito mais para travar o elevado número de mortos nos lares. 

Segundo os dados da Universidade Johns Hopkins, a Suécia regista 38.589 pessoas infectadas com covid-19 e 4468 mortes causadas pela doença, enquanto os vizinhos nórdicos, Dinamarca, Noruega e Finlândia, registaram, respectivamente 580, 237 e 320 óbitos. 

Durante uma semana, a Suécia foi o país com maior taxa de mortes per capita da Europa — regista, actualmente, 5,29 mortes diárias por cada milhão de habitantes, mas entre 12 e 19 de Maio, atingiu o valor de 6,25. Quanto ao número total de mortes por cada 100 mil habitantes, a Suécia surge no quinto lugar, atrás de Bélgica, Reino Unido, Espanha e Itália. 

De acordo com as contas do The Guardian, os 4468 óbitos registados na Suécia representam uma taxa de mortalidade de 449 por cada milhão de habitantes, um valor muito superior aos 45 na Noruega, 100 na Dinamarca e 58 na Finlândia. Ainda segundo o mesmo jornal britânico, 7,3% dos habitantes de Estocolmo desenvolveu anticorpos contra a covid-19 em Abril.