Precários acusam Casa da Música de os ter dispensado em “represália” por protesto público

Alguns participantes na vigília que decorreu em simultâneo com o concerto de reabertura da instituição viram as prestações de serviços que tinham agendadas para este mês canceladas por email, denunciam os subscritores de um novo documento visando a administração.

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A vigília de protesto de segunda-feira PAULO PIMENTA

Alguns trabalhadores precários da Casa da Música, que na segunda-feira foi palco de uma vigília de protesto contra a forma como a fundação está a tratar os seus colaboradores neste período de pandemia, acusam os responsáveis da instituição de “represálias”, após a sua participação naquele acto público. Num comunicado difundido ao final da tarde desta terça-feira, um grupo destes trabalhadores denuncia que, no final do concerto da Orquestra Barroca e da vigília que paralelamente decorreu à entrada, oito assistentes de sala receberam uma mensagem do seu superior hierárquico a comunicar-lhes que “estavam dispensados do trabalho já agendado para Junho”.

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Alguns trabalhadores precários da Casa da Música, que na segunda-feira foi palco de uma vigília de protesto contra a forma como a fundação está a tratar os seus colaboradores neste período de pandemia, acusam os responsáveis da instituição de “represálias”, após a sua participação naquele acto público. Num comunicado difundido ao final da tarde desta terça-feira, um grupo destes trabalhadores denuncia que, no final do concerto da Orquestra Barroca e da vigília que paralelamente decorreu à entrada, oito assistentes de sala receberam uma mensagem do seu superior hierárquico a comunicar-lhes que “estavam dispensados do trabalho já agendado para Junho”.

No mesmo documento, atestam que dois técnicos de palco que trabalham há década e meia na Casa da Música “foram também proscritos”, tendo ambos em comum o facto de terem subscrito o abaixo-assinado com que, no dia 18 de Abril, 92 pessoas protestaram contra a gestão do director-geral e apelaram “à responsabilidade social da instituição”. O comunicado refere ainda que, após essa tomada de posição conjunta, “vários trabalhadores a recibo verde começaram a ser sujeitos a reuniões individuais intimidatórias, com directores e coordenadores”. 

O PÚBLICO tentou obter uma reacção da administração da Casa da Música a estas acusações, mas não obteve resposta até ao fecho desta notícia.

Depois de dois meses e meio de paralisação das suas actividades, a Casa da Música retomou a actividade pública ao final da tarde de segunda-feira, com um concerto da Orquestra Barroca, que seguiu as regras determinadas pelo Governo e pela Direcção-Geral de Saúde para o funcionamento das casas de espectáculos nesta primeira fase de desconfinamento, e que “lotou” a Sala Suggia apenas com 176 espectadores.

Durante o concerto, cerca de três dezenas de trabalhadores precários da Casa da Música, acompanhados por alguns colaboradores da Fundação de Serralves, que também se queixam de terem sido esquecidos por esta fundação, mantiveram-se em vigília silenciosa no exterior do edifício, empunhando cartazes de protesto.

Num contexto em que a Casa da Música já anunciou a sua programação para este mês de Junho, com dezena e meia de eventos agendados, André Silva, técnico de palco que trabalha com a instituição desde a sua abertura em 2005, em regime de recibos verdes, estranha não ter sido chamado para retomar a sua actividade. “Aconteceu-me a mim e a outros colegas que subscreveram o abaixo-assinado em Abril”, diz ao PÚBLICO, adiantando que os responsáveis da Casa tentaram calar os protestos, e premiaram os que entretanto retiraram o seu nome daquela denúncia pública.

No comunicado agora tornado público, é dito que “alguns técnicos foram ameaçados explicitamente de represálias pelo seu coordenador”. É também nomeada a situação de parte dos assistentes de sala, que terão também sido alvo de “represálias” ao verem-se “dispensados, por email”, no final da vigília de segunda-feira: “Não será necessária a vossa presença nos concertos anteriormente alocados”, ter-lhes-á sido comunicado por escrito.

Os trabalhadores contestam a decisão, alegando que para cada concerto estavam inicialmente escalados oito assistentes de sala, número que foi cortado para apenas quatro, “o que se revelou insuficiente no concerto de 1 de Junho”.

Já aos músicos-formadores do Serviço Educativo terá sido transmitido que não eram “trabalhadores da Casa da Música”, mas apenas “colaboradores, prestadores de serviços.”

Também os guias das visitas ao edifício desenhado por Rem Koolhaas se queixam de não lhes ter sido ainda prestada informação sobre o seu regresso. Teresa Aguiar, arquitecta e guia em part-time, também subscritora dos protestos e da “causa dos precários”, disse ao PÚBLICO que este grupo, que normalmente integra dezena e meia de colaboradores, tem sido tratado como “descartável”. “Já não se trata apenas de uma questão económica, mas emocional e moral”, acrescenta a guia, lamentando a falta de abertura ao diálogo por parte da instituição.

No comunicado desta terça-feira, os precários acusam ainda a Casa da Música de ter contratado um operador de câmara para filmar os participantes na vigília durante o concerto da Orquestra Barroca.

Em resposta, o deputado do Bloco de Esquerda José Soeiro fez já chegar à Assembleia da República um requerimento para, “com carácter de urgência, serem chamados à Comissão Parlamentar de Trabalho a Administração da Casa da Música, os representantes dos trabalhadores precários e a Autoridade para as Condições de Trabalho”, escreveu na sua conta de Facebook.