Figuras públicas reclamam estatuto de vítima para crianças expostas a violência doméstica
Petição que reivindica a criação do estatuto de vítima para as crianças expostas a violência doméstica precisa de quatro mil assinaturas para chegar ao Parlamento.
Da criadora do Instituto de Apoio à Criança, Manuela Eanes, a Nuno Markl, passando pela actriz Dalila Carmo e pelo ex-ministro Rui Pereira, são várias as figuras públicas que subscrevem a petição que é lançada nesta segunda-feira, Dia Mundial da Criança, e que visa forçar a Assembleia da República a discutir a aprovação do estatuto de vítima para crianças inseridas em contexto de violência doméstica.
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Da criadora do Instituto de Apoio à Criança, Manuela Eanes, a Nuno Markl, passando pela actriz Dalila Carmo e pelo ex-ministro Rui Pereira, são várias as figuras públicas que subscrevem a petição que é lançada nesta segunda-feira, Dia Mundial da Criança, e que visa forçar a Assembleia da República a discutir a aprovação do estatuto de vítima para crianças inseridas em contexto de violência doméstica.
“A realidade tem demonstrado que os fundamentos apresentados no sentido de que as normas legais já existentes já permitiam essa protecção não eram realistas”, argumentam os autores da petição, para acrescentarem que a criação deste estatuto é fundamental para agilizar a protecção das crianças que vivem em contexto familiar de violência doméstica, numa circunstância que tende a degenerar em “patologias, físicas e psíquicas, que afectam profundamente o seu desenvolvimento” e as impede de “crescer de forma harmoniosa”.
Esta não é a primeira vez que o Parlamento debate a criação do estatuto de vítima para estes menores. Em Julho de 2019, o BE propôs a inclusão na categoria de vítima especialmente vulnerável das crianças que vivam em contexto de violência doméstica ou que o testemunhem, numa tentativa de, como sustentou então Catarina Martins, “impedir que os agressores ficassem com o exercício das responsabilidades parentais”. Mas a proposta acabou chumbada com os votos do PS, PCP e CDS. Na altura, a deputada socialista Isabel Moreira argumentou que a iniciativa seria “redundante”, porquanto as crianças expostas a actos de violência doméstica estão abrangidas pela Lei de Promoção e Protecção das Crianças e Jovens em Risco.
A autora desta petição, a escritora e pintora Francisca de Magalhães Barros, discorda. “Trata-se de criar uma ferramenta suplementar que se revelou a mais rápida e eficaz na protecção das crianças”, declarou ao PÚBLICO, para questionar: “Por que motivo se há-de recusar uma ferramenta legal mais eficaz de protecção das crianças, se às mulheres já é concedido este estatuto?” E, porque as crianças continuam a morrer, como se viu no caso de Valentina Fonseca, a criança de nove anos por cujo homicídio o pai e a madrasta estão presos preventivamente, Francisca Barros confia que será possível reunir em pouco tempo as quatro mil assinaturas que são necessárias para forçar o Parlamento a discutir esta proposta.
Há menos de um mês o Parlamento voltou a discutir o tema, à boleia de uma proposta de lei do Governo que acabou por não ir a votos: dadas as críticas de diversos partidos, o Executivo preferiu que o diploma baixasse à comissão para negociações na especialidade, e o mesmo fez o Bloco. A proposta da Iniciativa Liberal para a “consagração expressa do crime de exposição de menor a violência doméstica” foi chumbada por PS, PSD, PCP e PEV (e teve a abstenção do CDS). Só foi aprovado o projecto de lei do PCP que reforça as medidas de protecção das vítimas de violência doméstica (CDS, PAN e Chega abstiveram-se).
No ano passado, 1473 crianças e jovens foram vítimas de crime, segundo a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima. Dá uma média de quatro vítimas por dia, 28 por semana. Em 27% dos casos, as agressões foram cometidas pelos progenitores. E estima-se em 35 o número de mortes por violência doméstica, a que se somam outras 27 tentativas de femicídio.
Este ano, durante a vigência do estado de emergência, as denúncias por violência doméstica baixaram em cerca de 39%. Por recearem que este decréscimo das denúncias decorresse do medo acrescido durante o confinamento, as autoridades criaram novos canais de denúncia, a qual pode ser feita por telefone (800 202 148), e-mail (violencia.covid@cig.gov.pt) e um serviço de mensagens curtas (3060).