Peru, um dos primeiros países a entrar em quarentena, continua sem conseguir travar pandemia
Hospitais estão cheios e há falta de médicos e materiais de saúde. Mais de 70% dos trabalhadores peruanos estão inseridos no sector informal e precisam de quebrar quarentena para conseguirem trabalho que lhes possibilite comprar alimentos.
O Peru, segundo país com mais infectados com covid-19 na América Latina, ultrapassou a barreira das 160 mil infecções no domingo, depois de um recorde diário de oito mil novos casos, e tem os hospitais no limite, com relatos de falta de ventiladores, camas e médicos. Com uma população que vive essencialmente no sector informal, as medidas de confinamento não se estão a revelar eficazes e a situação parece longe de estar controlada.
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O Peru, segundo país com mais infectados com covid-19 na América Latina, ultrapassou a barreira das 160 mil infecções no domingo, depois de um recorde diário de oito mil novos casos, e tem os hospitais no limite, com relatos de falta de ventiladores, camas e médicos. Com uma população que vive essencialmente no sector informal, as medidas de confinamento não se estão a revelar eficazes e a situação parece longe de estar controlada.
Ao contrário do Brasil, onde o Presidente Jair Bolsonaro tem desvalorizado a pandemia, o Peru foi um dos primeiros países a entrar em quarentena na América Latina. Logo no dia 15 de Março, o Presidente Martín Vizcarra declarou o estado de emergência, quando tinham sido detectados 71 casos de infecção. As fronteiras foram encerradas e os peruanos foram proibidos de sair de casa, excepto para comprarem comida e para trabalhos essenciais.
No entanto, o número de infectados não parou de crescer e o estado de emergência continua em vigor no país, pelo menos, até final do mês de Junho. Esta segunda-feira, numa visita a um hospital em Huaraz, a cerca de 400 km de Lima, o Presidente Vizcarra disse que o Peru ainda só está a meio do combate à covid-19 e admitiu que “concluir o processo pode levar entre seis a oito meses”.
Segundo o El País, os hospitais peruanos estão a ficar cheios e as equipas de saúde estão sem recursos para atender toda a gente. Com as salas dos hospitais lotadas, têm sido montados toldos nos parques de estacionamento dos hospitais, com os doentes que precisam de receber assistência a terem de trazer colchões de casa.
Os especialistas em saúde pública explicam que as condições de vida e de trabalho no país de 33 milhões de habitantes tornam praticamente impossível que os peruanos cumpram as medidas de quarentena.
Mais de 70% do trabalho no país está inserido na economia informal. Para os que trabalham diariamente neste sector, sobretudo na agricultura, na indústria ou no turismo, ganhar dinheiro implica sair do isolamento para ir trabalhar. O teletrabalho é, por isso, uma impossibilidade para a maioria da população.
Só funciona para 30%
“A estratégia do Governo funciona para os 30% de peruanos que trabalham no sector formal, que tem vindo a crescer economicamente. Mas existem outros 70%, que trabalham no sector informal e não têm acesso aos serviços de saúde, educação e nutrição, nem às pensões e às redes de segurança financeira”, disse à revista Time Ivan Hidalgo Romero, director académico do Instituto de Governo e Gestão Pública, em Lima.
Além disso, apenas 49% das casas no Peru dispõem de frigoríficos ou congelador (um número que sobre para os 61% nas áreas urbanas). Impossibilitados de armazenar comida em casa, os peruanos vêem-se obrigados a sair de casa para comprarem alimentos, aumentando o risco de contágio. Elmer Huerta, médico peruano ouvido pela CNN, identifica a contradição: “Tem de se evitar o contacto humano numa sociedade em que não é possível ficar em casa.”
Além das medidas de confinamento, o Governo peruano aprovou programas de ajuda social e empresarial para vários sectores da população. Contudo, a ajuda não está a chegar a quem mais necessita.
Ajudas não ajudam
De acordo com a CNN, apenas 38% dos peruanos adultos têm uma conta bancária. A falta de acesso ao sistema financeiro faz com que o Governo não consiga transferir directamente o dinheiro para as famílias carenciadas, obrigando-as a deslocarem-se aos bancos, para receber os apoios estatais. Segundo o El País, muitas pessoas que não precisam de ajuda dizem ter recebido apoios do estado, enquanto outras famílias carenciadas continuam sem qualquer ajuda.
Com a economia paralisada, cerca de 30% dos peruanos perdeu o emprego desde o início da quarentena, o que tem levado a alguma contestação contra o até agora popular Governo de Vicente Zeballos, primeiro-ministro peruano, que reconheceu que o estado está a ter dificuldade em identificar e encaminhar ajuda económica aos cidadãos mais carenciados.
A América Latina ultrapassou esta segunda-feira um milhão de casos de SARS-Cov-2. Segundo os dados da Universidade Johns Hopkins, o Peru regista 164.476 casos de covid-19 e 4506 mortos devido à doença causada pelo novo coronavírus. Só na capital do país, Lima, são mais de 100 mil as pessoas infectadas.