A pandemia e o extremismo

Não basta combater o vírus. É também necessário apostar em combater a propaganda extremista, os discursos de ódio e as campanhas de desinformação

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Enquanto o mundo, confinado, anseia por uma vacina, o mal continua por aí. É o caso do extremismo. Os grupos extremistas de extrema-direita têm aproveitado as fragilidades sociais e a atenção do mundo em torno da pandemia para recrutar e capitalizar a crise sanitária a seu favor.

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Enquanto o mundo, confinado, anseia por uma vacina, o mal continua por aí. É o caso do extremismo. Os grupos extremistas de extrema-direita têm aproveitado as fragilidades sociais e a atenção do mundo em torno da pandemia para recrutar e capitalizar a crise sanitária a seu favor.

Embora este fenómeno não tenha as mesmas dimensões na Europa, não é de menosprezar os recentes acontecimentos nos EUA. Enquanto no início de Março os movimentos de extrema-direita faziam apelos para os seus seguidores se tornarem uma espécie de “arma viva”, disseminando a covid-19 em mesquitas, sinagogas e outros sítios frequentados por minorias étnicas, migrantes e até apoiantes do confinamento, as recentes manifestações feitas por pessoas armadas contra esta medida têm mostrado que o tom está a ganhar contornos mais violentos.

A literatura científica tem mostrado que a propaganda extremista veiculada nos meios online é suficiente para radicalizar e recrutar pessoas. Esta propaganda dissemina discursos de ódio contra bodes expiatórios criados para sustentar e alimentar a causa extremista, e o seu objectivo último é colocar as pessoas a agir em nome destas crenças, recorrendo a meios violentos. Com a quarentena imposta, a perda de empregos e o aborrecimento instalado, as pessoas tornam-se mais susceptíveis e vulneráveis a esta propaganda. Prova disso são os recentes estudos feitos no Reino Unido que mostram que houve um aumento, desde Março, no consumo de material extremista online. Embora não seja ainda claro o impacto destes dados no recrutamento, é certo que a desinformação encontrou novos espectadores. Os jovens são o grupo que mais preocupa: estão em casa, horas a fio ligados à Internet, susceptíveis à ideologia extremista e às teorias de conspiração, muitas vezes sem uma retaguarda que lhes ofereça uma bagagem que os torne resistentes e resilientes a discursos de ódio. Acima disto: são pessoas que se mexem bem em meios online e que estão habituadas a gerir parte da sua vida social virtualmente, o que acresce o risco de exposição.

Estes factos mostram que em tempos de pandemia não basta combater o vírus. É também necessário apostar em combater a propaganda extremista, os discursos de ódio e as campanhas de desinformação. Não parece uma tarefa fácil, quando existem líderes políticos que são o epicentro de legitimação do ódio, da acusação infundamentada e da discriminação entre grupos, mas é possível se, sobretudo, se agir cedo, de forma consistente e intencional, recorrendo a campanhas de responsabilidade social e de narrativas alternativas. Estas devem assentar em estratégias tais como a promoção de valores como a tolerância à diferença, o pluralismo, a liberdade de expressão e os direitos humanos.

Além disso, para que este combate não seja apenas reactivo, é necessário activamente compreender e actuar nas causas, para que o seu impacto seja minimizado, promovendo, em simultâneo, campanhas de literacia digital.

Em tempos de pandemia, de incerteza e de ansiedade social é vital, mais do que nunca, apostar também em comunicação política eficaz e consciente, recorrendo sistematicamente a factos e a evidência científica, para que o risco de contágio deste vírus extremista seja prevenido. Na verdade, todos temos esta responsabilidade, para prevenir que a propaganda barata, simples e desconexa com a realidade ganhe terreno e tome conta do espaço público, dos meios virtuais e, sobretudo, do sistema de crenças das pessoas e dos mais jovens.