Portugal pode ir buscar 26 mil milhões ao novo fundo de recuperação económica
Para aceder aos fundos adicionais de 750 mil milhões de euros que a Comissão Europeia vai arrecadar aos mercados, Estados-membros terão de se comprometer com a execução de um programa previamente negociado com Bruxelas. Envelope nacional ascende a 26 mil milhões de euros.
Portugal será elegível para um financiamento global de 26,361 mil milhões de euros no âmbito do novo instrumento de recuperação e resiliência de 750 mil milhões de euros proposto pelo executivo comunitário para apoiar a retoma e transformação da economia da União Europeia.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Portugal será elegível para um financiamento global de 26,361 mil milhões de euros no âmbito do novo instrumento de recuperação e resiliência de 750 mil milhões de euros proposto pelo executivo comunitário para apoiar a retoma e transformação da economia da União Europeia.
Segundo a chave de alocação dos fundos, Portugal poderá beneficiar de transferências directas (subvenções) no valor de 15,526 mil milhões de euros, e ainda aceder a uma parcela adicional de 10,835 mil milhões em empréstimos em condições favoráveis (segundo as estimativas dos serviços técnicos da Comissão).
O financiamento do novo instrumento não vai seguir o modelo de “empréstimos por empréstimos”, como exigiam os líderes “frugais”, mas também não vai ser o “dinheiro grátis” que reclamavam os governos dos países mais afectados pela pandemia do novo coronavírus. Para aceder aos fundos, os Estados-membros vão ter de respeitar condições estritas e comprometer-se com a execução de um plano de reformas previamente negociado com Bruxelas.
De acordo com a proposta desvendada nesta quarta-feira pela Comissão Europeia, os países interessados em recorrer ao novo instrumento baptizado como “Próxima Geração UE” serão obrigados a submeter à aprovação um detalhado plano nacional de recuperação e resiliência: um Programa Nacional de Reformas mais abrangente, definido “em linha com as recomendações específicas do Semestre Europeu, as prioridades dos respectivos planos nacionais de energia e clima, e articulado com as acções dos planos territoriais de transição justa e os acordos de parceria e programas operacionais do quadro financeiro plurianual”.
Não se exige exactamente a assinatura de um “memorando de entendimento”, com metas macroeconómicas a ser atingidas em troca do financiamento extraordinário, que estará disponível para todos os Estados-membros numa base voluntária. Mas a transferência do dinheiro implica a definição de um caderno de encargos para a dupla transição energética e digital, que terá de ser aprovado pela Comissão e pelo Conselho da UE (por maioria qualificada).
Ao desenhar o novo instrumento, que quer ter disponível logo no arranque do próximo orçamento de longo prazo, a 1 de Janeiro de 2021, a Comissão procurou respeitar as sensibilidades das duas “facções” que se opõem no debate sobre o financiamento do próximo quadro financeiro plurianual da União. Em termos de volume, modelo de financiamento e alocação das verbas, foram atendidas as exigências de uns e outros, e salvaguardada a ambição de um novo Plano Marshall, com uma dotação extraordinária de 750 mil milhões de euros.
O executivo seguiu a linha defendida pela chanceler da Alemanha e pelo Presidente francês, que defenderam a constituição de um fundo de recuperação de 500 mil milhões de euros, adicional ao orçamento comunitário e distribuído através dos programas já existentes, ou ainda a criar, do quadro financeiro plurianual (subvenções).
A Comissão manteve esse montante inalterado no capítulo das transferências a fundo perdido — mas juntou-lhe uma outra parcela de 250 mil milhões de euros (ou 33,3%), a distribuir na forma de “empréstimos” conforme pediram os frugais.
Mutualização da dívida
Para reunir o montante de 750 mil milhões de euros, o executivo vai directamente aos mercados financeiros, evitando assim que os Estados-membros incorram em mais despesa e aliviando a pressão sobre as finanças públicas no momento em que a margem orçamental dos governos está completamente esgotada.
A Comissão será responsável pela emissão de dívida em nome dos 27, beneficiando no seu financiamento do rating de AAA e garantindo o seu reembolso através de um aumento para 2% do tecto dos recursos próprios do orçamento comunitário, que, segundo as contas do executivo, serão suficientes para sustentar o pagamento do capital e dos juros (e para fortalecer a sua posição, o executivo vai pedir para serem acrescentadas novas fontes de recursos próprios ao próximo quadro financeiro plurianual).
Os empréstimos terão maturidades longas, num máximo de 30 anos, e um deferimento dos pagamentos até ao fim do actual quadro plurianual — ou seja, até 2028.
É uma proposta com significado histórico: apesar de já ter assumido operações semelhantes no passado — por exemplo, para financiar os programas de assistência financeira durante a crise do euro —, a envergadura do exercício agora proposto abre definitivamente a porta a uma efectiva mutualização da dívida europeia, e às transferências entre Estados-membros, porventura o maior tabu do processo de construção de uma verdadeira união económica e monetária.
Porém, a Comissão reconheceu também alguns dos argumentos do chamado “grupo dos frugais”, que é constituído pela Áustria, Dinamarca, Países Baixos e Suécia e ameaçava bloquear as negociações para a aprovação do novo pacote de relançamento económico no Conselho Europeu. Daí que o recurso ao novo instrumento de recuperação e resiliência venha carregado de condicionalidades — ou como preferem dizer os técnicos, critérios e condições para a aplicação do dinheiro.
O financiamento só será autorizado para suportar as despesas de investimentos e reformas que aproximem os Estados-membros das metas de redução de emissões de gases de efeito de estufa até 2030 e neutralidade climática até 2050 fixadas pela Comissão Europeia, ou então que promovam a competitividade da indústria ou acelerem a transição da economia para o digital.