Presenteada com alhos e esparguete, ministra da Cultura compromete-se com estatuto do intermitente até ao final do ano
Graça Fonseca recebeu nesta segunda-feira à tarde um cabaz alimentar e 151 euros, protesto simbólico de um grupo de profissionais deste sector severamente afectado pela crise.
A ministra da Cultura, Graça Fonseca, comprometeu-se nesta segunda-feira à tarde, com um grupo de profissionais que foi oferecer-lhe um cabaz com alimentos essenciais e 151 euros, a ter o estatuto do trabalhador intermitente do sector das artes finalizado até ao final do ano. A ideia, explicou, é que “no próximo ano já possa ter impacto na vida dos profissionais do sector”.
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A ministra da Cultura, Graça Fonseca, comprometeu-se nesta segunda-feira à tarde, com um grupo de profissionais que foi oferecer-lhe um cabaz com alimentos essenciais e 151 euros, a ter o estatuto do trabalhador intermitente do sector das artes finalizado até ao final do ano. A ideia, explicou, é que “no próximo ano já possa ter impacto na vida dos profissionais do sector”.
Recordando que “em Fevereiro o Governo já estava a trabalhar na questão das condições laborais — estatuto de intermitência — e das carreiras contributivas dos profissionais das artes e do espectáculo”, Graça Fonseca garantiu, em declarações aos jornalistas, que a alteração legislativa que isso implica será feita “até ao final do ano”. A ministra da Cultura falou com os jornalistas no Palácio Nacional da Ajuda, depois de ter recebido um grupo de profissionais do sector que ali se deslocou numa acção de protesto.
A acção consistia na entrega a Graça Fonseca de 219 euros, numa referência ao valor máximo do apoio a trabalhadores independentes por redução de actividade, e de um cabaz de ajuda alimentar, uma das formas a que os profissionais do sector têm recorrido para se ajudarem “uns aos outros” no actual contexto de redução drástica da actividade.
A entrega foi feita por um grupo de profissionais do sector, que preferiram não se identificar com os seus nomes verdadeiros; dois deles apareceram como encarnações das personagens Bonnie e Clyde, vestidos como o casal de criminosos norte-americano que ficou famoso na década de 1930.
O “casal” chegou ao Palácio Nacional da Ajuda numa Renault 4L branca, que tinha na bagageira um saco de sarapilheira com 151 euros em moedas (o valor angariado na campanha de crowdfunding “Não deixemos a Graça cair na desgraça”, que decorreu na plataforma GoGetFunding), e um cesto de vime com latas de comida, limões, alhos, batatas e esparguete, entre outros alimentos.
Antes de serem recebidos por Graça Fonseca, “Bonnie e Clyde” foram lembrando aos jornalistas como “a situação já era difícil” no sector das Artes e da Cultura antes da pandemia de covid-19, e como os seus profissionais precisam de “apoios de emergência efectivos” e de um “estatuto do intermitente”. Já depois de serem recebidos, contaram aos jornalistas que “a ministra agradeceu e ficou com o cabaz de alimentos”, mas declinou os 151 euros.
“Disse-nos que não pode ficar com os 151 euros porque não é legal, então vamos distribuir por todos os trabalhadores de arte e cultura precários de Portugal”, referiu “Clyde”.
“A senhora ministra comprometeu-se, até ao fim do ano, a termos o estatuto do intermitente. A termos a Segurança Social e o sistema fiscal rectificado, trabalhado e analisado para nós, trabalhadores do tecido cultural português”, contou “Bonnie”.
Os ministérios da Cultura, das Finanças e do Trabalho constituíram no dia 6 um grupo de trabalho para “análise, actualização e adaptação dos regimes legais dos contratos de trabalho dos profissionais do espectáculo e respectivo regime de Segurança Social”. O anúncio foi feito pelo gabinete de Graça Fonseca, horas depois de uma reunião da ministra da Cultura com o Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, Audiovisual e Músicos (Cena-STE).
O referido grupo de trabalho, explicou então o Ministério da Cultura, vai reunir-se de duas em duas semanas e integrará, além de representantes dos três ministérios, elementos da Direcção-Geral das Artes, da Direcção-Geral do Livro, Arquivos e Bibliotecas, do Instituto do Cinema e Audiovisual, da Direcção-Geral da Segurança Social, da Autoridade para as Condições de Trabalho e da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Reforçar o financiamento
O estatuto do intermitente é uma das “prioridades absolutas” da ministra da Cultura, mas Graça Fonseca sublinhou estar a batalhar também por “um maior investimento público na Cultura”. Um reforço que, acrescentou, “se antes já era importante, agora é ainda mais”, visto que “a situação de pandemia tem impacto particular” no sector.
A ministra da Cultura lembrou que tem feito o seu trabalho, “que é defender que a área necessita de um aumento gradual de financiamento, porque tem muitas décadas, muitos anos, de subfinanciamento estrutural”. Mas alertou para a necessidade de se “compreender que não se consegue, num ano ao dois, resolver problemas de décadas”.
Essa “batalha” pelo aumento do financiamento público acontecerá, disse Graça Fonseca, em “dois momentos importantes: o Orçamento Suplementar, e o plano de relançamento da economia no quadro europeu”. “Não posso aceitar que a Cultura não seja incluída em qualquer plano de relançamento da Economia. Batalharei para que possa existir aumento do investimento público na área da Cultura”, afirmou a ministra.
Entre os apoios de emergência ao sector anunciados pelo Ministério da Cultura está a Linha de Apoio de Emergência às Artes, que recebeu 1.025 candidaturas, das quais 636 foram consideradas elegíveis. Destas, apenas 311 receberam apoio.
Anunciada inicialmente com um orçamento de um milhão de euros, a linha foi depois reforçada com 700 mil euros.
Os resultados foram criticados pelas estruturas representativas dos trabalhadores do sector, nomeadamente por se ter tratado de um concurso e por não terem sido anunciados os resultados na íntegra. Recordando que a Linha de Apoio de Emergência às Artes “não é um concurso da Direcção-Geral das Artes”, mas uma “verba do Fundo de Fomento Cultural”, anunciou que “esta semana” as entidades e os artistas beneficiados “vão começar a assinar protocolos para poderem receber” as verbas, e que “depois será divulgada a lista [de beneficiários e valores atribuídos], como sempre se faz no Fundo de Fomento Cultural”.
Em relação ao reforço de 700 mil euros, a ministra esclareceu que este “vem do orçamento do Ministério da Cultura”. “Temos estado a fazer uma gestão flexível dentro do orçamento, de maneira a poder colocar mais verbas para as áreas mais atingidas e mais vulneráveis”, disse. Quando questionada sobre a verba de um milhão de euros destinada ao TV Fest, que acabaria por ser cancelado, Graça Fonseca respondeu que esta verba “desapareceu enquanto verba do TV Fest” e “será mobilizada em função das necessidades”.