Não siga os passos da Grã-Bretanha: uma refutação a Constança Urbano de Sousa
Peço a Constança Urbano de Sousa que não siga o exemplo da Grã-Bretanha para remover as oportunidades e os direitos dos cidadãos. Portugal deve orgulhar-se de oferecer nacionalidade, como oferece desde 2015, aos descendentes das vítimas do período mais sombrio de sua história.
Em 16 de abril, publiquei um artigo no The New European explicando como consegui a cidadania portuguesa e o que isso significa para mim enquanto cidadão britânico e europeu. Urbano de Sousa não apenas truncou o que eu escrevi, mas usou o artigo para brincar com os preconceitos das pessoas em relação aos migrantes no momento em que uma pandemia multiplicou a xenofobia na Europa.
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Em 16 de abril, publiquei um artigo no The New European explicando como consegui a cidadania portuguesa e o que isso significa para mim enquanto cidadão britânico e europeu. Urbano de Sousa não apenas truncou o que eu escrevi, mas usou o artigo para brincar com os preconceitos das pessoas em relação aos migrantes no momento em que uma pandemia multiplicou a xenofobia na Europa.
Para impor a tese de que pedi a nacionalidade portuguesa unicamente para obter um passaporte da União Europeia, a autora afirma que antes do “Brexit” eu nunca me havia identificado como judeu sefardita. Claramente ignorou o contexto do artigo. Antes do “Brexit”, eu sentia-me inglês, britânico e europeu e não acreditava que as minhas origens pudessem ter algo a ver com isso. Os abusos antissemitas que recebi na escola anglicana fizeram o meu judaísmo parecer real demais.
É uma questão de genealogia, não de religião. Independentemente da minha vontade, sou considerado judeu pelo Estado de Israel e por todas as tendências do judaísmo que não a mais ortodoxa. A minha tradição de pertença a uma comunidade sefardita portuguesa foi objetivada pela comunidade portuguesa e espanhola de Londres, onde foi filiado o meu pai, judeu sefardita de família búlgara e egípcia radicada em Londres desde meados do século XX.
Aquando da expulsão do Egipto, alguns dos nossos primos preferiram estabelecer-se no Porto, em Portugal, onde já existia a sinagoga Kadoorie. Todos buscavam uma vida melhor. Felizmente prosperaram e deram sempre emprego a muita gente. Henry Tillo, já falecido, tornou-se um dos maiores empreendedores do Norte do país. Foi presidente da Exponor, da Associação Industrial Portuense, da Assembleia Geral da Comunidade Judaica do Porto e de muitas outras organizações. Privou de perto com Rui Moreira, Rui Rio e Fernando Gomes e foi nomeado comendador, contra a sua vontade de homem humilde, pelo Presidente da República Mário Soares.
Eu nunca pediria a nacionalidade em Espanha, um pesadelo de obstáculos burocráticos que fez daquela lei um gesto sem sentido, como demonstrou o português Leon Amiras, do Colégio de Advogados de Israel. Quando há três anos resolvi pedir a nacionalidade em Portugal, apesar do apoio dos meus familiares do Porto, que fazem parte da Comunidade Judaica local desde 1960, só obtive o meu certificado depois de enviar ao rabinato muitos documentos oficiais sobre as rotas e os casamentos da família e um certificado da Spanish & Portuguese Synagogue de Londres. O processo existe. É só consultá-lo.
Em 7 de abril, Boris Johnson foi levado para os cuidados intensivos por ter contraído o vírus covid-19. Mais tarde prestou homenagem ao enfermeiro português Luís Pitarma, também do Porto, que salvou a sua vida e que foi saudado pelo Presidente da República portuguesa Marcelo Rebelo de Sousa, ele próprio de herança judaica. Pitarma vive na Grã-Bretanha por ser cidadão da União Europeia, da mesma forma que eu tenho a oportunidade de fazer o mesmo em Portugal. Ao perseguir o “Brexit”, o meu primeiro-ministro tornou a vida de Luís mais difícil, colocando barreiras para ele viver e trabalhar.
Peço a Constança Urbano de Sousa que não siga o exemplo da Grã-Bretanha para remover as oportunidades e os direitos dos cidadãos. Portugal deve orgulhar-se de oferecer nacionalidade, como oferece desde 2015, aos descendentes das vítimas do período mais sombrio de sua história, que têm os mesmos direitos que todos os outros, incluindo as liberdades de trabalhar, estudar, viver e amar nas 27 nações da União Europeia, que eu pessoalmente havia perdido com o “Brexit” e que Urbano de Sousa quer voltar a remover.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico