Inspecção vai auditar avaliações de alunos para travar inflação de notas
A ordem é para reforçar acções que visam detectar inflação artificial de notas. O ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, garante que haverá processos disciplinares sempre que se justifique. Em breve seguem instruções para as escolas a explicar como funcionarão os exames, com perguntas opcionais para garantir que alunos podem não ser avaliados a matérias menos consolidadas.
As notas do 1.º e do 2.º períodos serão analisadas para serem comparadas com os resultados finais. Haverá auditorias aos critérios de avaliação. A Inspecção-Geral da Educação terá de mobilizar mais inspectores para esta tarefa. É que nesta altura o problema da inflação artificial de notas que já existia em algumas escolas pode ter consequências ainda mais graves na equidade do concurso de acesso ao superior. Tiago Brandão Rodrigues não tem dúvidas: “Seria muito danoso para o sistema se oportunisticamente alguém pudesse tirar partido das circunstâncias [excepcionais que vivemos em tempos de pandemia].”
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As notas do 1.º e do 2.º períodos serão analisadas para serem comparadas com os resultados finais. Haverá auditorias aos critérios de avaliação. A Inspecção-Geral da Educação terá de mobilizar mais inspectores para esta tarefa. É que nesta altura o problema da inflação artificial de notas que já existia em algumas escolas pode ter consequências ainda mais graves na equidade do concurso de acesso ao superior. Tiago Brandão Rodrigues não tem dúvidas: “Seria muito danoso para o sistema se oportunisticamente alguém pudesse tirar partido das circunstâncias [excepcionais que vivemos em tempos de pandemia].”
Quando o primeiro-ministro anunciou a 9 de Abril que os alunos até ao 10.º ano não voltavam a ter aulas, a sensação que passou foi que era uma decisão sobretudo para dar previsibilidade às famílias. Continua a achar que foi a melhor solução?
As semanas vão passando e parece que nos esquecemos em que momento é que tomámos aquelas decisões e com que informação. A 9 de Abril era Quinta-Feira Santa. Recordam-se do que já estava em curso nessa quinta-feira, sexta, sábado, Domingo de Páscoa? O confinamento [concelhio], o mais duro que tivemos neste período de pandemia. A sociedade no seu todo estava tolhida na sua acção. Esse movimento foi importante para podermos lutar contra o novo coronavírus, mas havia que dar alguma previsibilidade às famílias, foi a melhor solução.
Estamos agora na 2.ª fase do plano de desconfinamento, com os alunos do 11.º e 12.º anos a voltar esta semana às aulas presenciais. Muitos manifestam receio de voltar. Quantos não voltaram?
O receio é natural. Muitos desses alunos foram à escola na segunda-feira. Não temos o registo pormenorizado de cada uma das escolas, mas confiamos nos directores escolares que, de forma conservadora, disseram que mais de 80% dos alunos tinham ido às escolas [na segunda-feira].
Os alunos que optem por não ir à escola, por receio, têm ensino à distância garantido?
Todos os alunos que fazem parte de grupos de risco vão ter ensino à distância. Outra coisa é todos aqueles que pelo seu livre arbítrio optem por não ir à escola. Não estamos a dizer às escolas que não o façam. Estamos a dizer às escolas que não estão obrigadas a fazê-lo. E devem perceber o que isso significaria: significaria multiplicar por dois a resposta educativa, porque em cada turma bastava haver um aluno que ficasse em casa para, automaticamente, ter de se duplicar a oferta formativa — aulas presenciais para aqueles que iriam e aulas não presenciais [para os que não iam] e todo o leque de disciplinas para todos os outros. Não era comportável em termos de trabalho, já não falo em termos financeiros. Mas tenho falado com muitos directores de escolas e a grande maioria está a oferecer aos alunos um conjunto de materiais. Os professores estão a ser muito solidários.
Quantos professores de grupos de risco existem e apresentaram atestado para poder ficar em casa?
Não sabemos aprioristicamente. É um processo que ocorre em cada escola e mais tarde podemos ter a compilação mais refinada.
Quantos pedidos de substituição de professores têm?
Os directores, tendo professores de risco, têm justa causa para os substituir. Estes professores não estão de baixa e a opção da maior parte das escolas foi que eles continuam a trabalhar com a sua turma [à distância] e há outro professor do corpo docente da escola que está a trabalhar presencialmente com a turma.
O que posso dizer é que, quando comparamos a reserva de recrutamento 30 e a reserva de recrutamento 31 [pedidos de contratação para substituir professores desde 15 de Maio] com o período homólogo do ano passado — quando não havia covid-19 —, não há um aumento do número de pedidos de substituição relativos a condições de saúde. E isto diz-nos claramente que as escolas não utilizaram maciçamente esta ferramenta. [No ano passado no período homólogo as escolas solicitaram mais de 800 professores, este ano cerca de 250, segundo informação actualizada pelo ME nesta quarta-feira; nestes números, informa, estão contemplados quer pedidos de substituição de professores que adoeceram com alguma doença que não covid, quer professores que fazem parte de grupos de risco de covid.]
As escolas garantiram a substituição com os professores que havia na escola, porque existem professores na escola com horário incompleto, e utilizaram as horas restantes desses professores; ou usaram o crédito horário que existe para várias funções que estão interrompidas durante este processo (o número de horas de abertura da biblioteca não é tão alargado, por exemplo)...
Está preparado para voltar a fechar escolas? Qual o plano de contingência que está pensado, caso surjam infecções numa escola? Em França, por exemplo, na primeira semana foram encerradas 70 escolas que tinham reaberto.
O que estamos a tentar é que em cada escola sejam definidas bolhas, com um determinado número de alunos, ficando bem definido que interacções existem nessas bolhas.
Havendo um caso, pode não ser necessário fechar a escola mas só aquela área, é isso?
Acima de tudo teremos a possibilidade de entender o que acontece em determinada área e depois teremos de trabalhar com aqueles alunos. Num prédio com 20 andares se numa determinada família aparece um caso positivo, testamos os elementos da família, não testamos toda a gente do prédio de 20 andares ou o bairro.
Também sabemos que existem equipas do INEM preparadas e as escolas continuam a ter o seu plano de contingência e todos os protocolos das autoridades de Saúde, que têm vindo a melhorar ao longo do tempo.
Os exames do secundário vão ter alterações?
Sairão para as escolas essas regras: estando os exames já preparados [antes da pandemia], os alunos vão ter a possibilidade de escolher de entre um conjunto de itens que vão ser avaliados, para não correremos o risco de que possam ver uma parte da matéria não leccionada ou leccionada com menos qualidade... Imaginemos que de dez itens, oito serão contabilizados e isso permitirá aos alunos ter uma adequação. São medidas excepcionais para tempos excepcionais. Mas há questões que não podem ser opcionais. Levando isto ao ridículo, um aluno de Português não pode optar por não escrever ou não compor.
O facto de as notas finais das disciplinas do secundário este ano só reflectirem a nota interna, dada pelos professores, não vai agravar a desigualdade que existe entre alunos que frequentam escolas que tradicionalmente inflacionam notas (para facilitar o acesso ao superior dos seus estudantes) e os que frequentam escolas que não têm essas práticas de inflação?
Temos de trabalhar para que não aconteça. Nestes quatro anos houve um trabalho sistemático de análise dos desalinhamentos daquilo que habitualmente se chama “inflação de notas”, como estava a dizer, ou seja, práticas sistemáticas, em algumas escolas, em que as classificações internas eram maximizadas artificialmente (e isso depois é possível ver comparando com as classificações dos alunos nos exames nacionais). Já temos um conjunto de disciplinas, tradicionalmente, fora deste contexto de pandemia, em que as classificações das disciplinas não podem ser comparadas [com o exame nacional], porque não têm exame. A Inspecção-Geral de Educação e Ciência [IGEC] fez também um trabalho de análise, de conjuntos de escolas que estavam a maximizar maciçamente essas notas. Actuou e foi conhecido o trabalho.
Não foram conhecidos os resultados dos processos disciplinares instaurados.
Nuns casos foram. Noutros, os prazos têm estado a correr, as pessoas têm o direito de se defenderem. Se se recordam, os decretos de lei [do estado de emergência] suspenderam os tempos de tramitação dos processos. No final da emergência e da calamidade tudo voltará ao seu tempo.
Mas o importante é isto: não podemos pôr em causa a credibilidade da avaliação. Já dei instruções claras à IGEC para alargar a sua acção, mobilizando mais inspectores e abrangendo mais escolas neste trabalho sistemático — para que também nas disciplinas que não são sujeitas a avaliação externa haver este trabalho. Por um lado, haverá auditorias aos critérios de avaliação interna de cada uma das escolas (a avaliação que é dada pelos professores), incluindo nos casos do ensino à distância. Por outro, registos claros de avaliação dos 1.º e 2.º períodos de cada um dos alunos para entendermos exactamente [o que se passa]. Esta análise vai levar necessariamente a acções disciplinares ou a recomendações, se for necessário. O mais importante é que tudo isto tenha um efeito regulador, também de reflexão para o sistema, mas acima tudo que seja dissuasor. Serviu no passado com a nossa acção e tem de servir agora, porque estas classificações finais vão ser analisadas pela IGEC, também para servir de estímulo à existência de critérios consistentes.
É muito importante que se faça este acompanhamento no ensino secundário. Seria muito danoso para o sistema, se oportunisticamente alguém utilizasse as condições excepcionais, pela excepcionalidade da pandemia, para que isso pudesse ser usado em detrimento... a equidade é difícil em todos os momentos no sistema educativo, pelas razões que sabemos, porque a condição de partida de cada um de nós é diferente. Tentamos na escola, com o ensino presencial, mitigar essa falta de equidade. À distância estamos a agudizar essas diferenças, pela existência de contextos económicos, sociais, culturais diferentes. Mas também sabemos que nestas alturas há ainda mais dificuldade. Seria muito danoso que alguém pudesse tirar partido destas circunstâncias e vamos agir.