O estado de excepção do Novo Banco é um escândalo nacional
No dia em que se sabe que o desemprego aumenta e a covid-19 nos coloca à beira de uma nova crise económica, o estado de excepção do Novo Banco é um escândalo nacional.
Os bancos não aprenderam nada com a crise financeira de 2008. Havia uma esperança, na época, de que o choque obrigasse a uma reforma profunda no sistema financeiro — não aconteceu. Foi preciso mudar alguma coisa para que tudo ficasse na mesma, glosando a famosa e repetida frase de O Leopardo. Em geral, os hábitos e o modus operandi pré-2008 prosseguiram, com mais ou menos vergonha.
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Os bancos não aprenderam nada com a crise financeira de 2008. Havia uma esperança, na época, de que o choque obrigasse a uma reforma profunda no sistema financeiro — não aconteceu. Foi preciso mudar alguma coisa para que tudo ficasse na mesma, glosando a famosa e repetida frase de O Leopardo. Em geral, os hábitos e o modus operandi pré-2008 prosseguiram, com mais ou menos vergonha.
As classes sociais da Idade Média, antes do advento da burguesia, eram três: clero, nobreza e povo. Os bancos pertencem à aristocracia — na nossa sociedade não são tratados como os demais, particulares e empresas. Devem mesmo possuir um direito sobre a terra e os rendimentos atribuídos por um rei que é investido alegadamente por Deus. Os escândalos do BES radicam nesta noção de estar acima de todos.
Foi-se o BES e ficou o “banco bom” — o Novo Banco —, que acabou de receber mais uma tranche de favores do Estado: os famosos 850 milhões que iam provocando uma crise política e que nos demonstraram como o nosso Estado (primeiro-ministro, Presidente da República) é um portento à infantilidade. Os dois defendiam que não fosse feita uma transferência enquanto uma determinada auditoria não estivesse pronta; a transferência foi feita pelo ministro das Finanças porque já estava aprovada; não aconteceu nada. Afinal, segundo o gabinete do primeiro-ministro, auditorias já havia muitas.
O que Cristina Ferreira nos conta nesta quarta-feira no PÚBLICO é de fazer espumar de indignação o mais sóbrio dos portugueses. Apesar de acumular prejuízos em cima de prejuízos e de continuar a ter capital injectado pelo Estado — sim, é um empréstimo, mas qualquer contribuinte adoraria ter um empréstimo daqueles a várias décadas —, os salários dos administradores do Novo Banco subiram 75% com a venda à Lone Star.
Um caso manifesto de hubris. Afinal, o Estado cá está para pagar — ou emprestar durante décadas — a conta. E as auditorias foram todas feitas e devem ter corrido excepcionalmente bem, como nos garantiu o tal comunicado do primeiro-ministro escrito depois das tréguas com Mário Centeno. E vêm aí prémios aos gestores — responsáveis pelo sucesso dos prejuízos — que o Governo e o PS candidamente questionam, sugerindo que se reverta a decisão.
No dia em que se sabe que o desemprego aumenta e a covid-19 nos coloca à beira de uma nova crise económica, o estado de excepção do Novo Banco é um escândalo nacional.