O elogio do médico de família
Desigualdades à parte, estes tempos de pandemia vieram reforçar a importância dos cuidados de saúde primários, no geral, e dos médicos de família em particular.
Hoje, terça-feira, 19 de Maio, o mundo celebra o Dia Mundial do Médico de Família. Desde o início de Março que ninguém nos bate palmas, mas hoje é dia para, com orgulho, fazer o elogio da Medicina Geral e Familiar, por vezes tida como a parente pobre da Medicina, por utentes e colegas.
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Hoje, terça-feira, 19 de Maio, o mundo celebra o Dia Mundial do Médico de Família. Desde o início de Março que ninguém nos bate palmas, mas hoje é dia para, com orgulho, fazer o elogio da Medicina Geral e Familiar, por vezes tida como a parente pobre da Medicina, por utentes e colegas.
Em Portugal, segundo os dados da Ordem dos Médicos de 2019, existem cerca de 7500 médicos de família. No entanto, e apesar dos recentes esforços políticos, são ainda pelo menos 600 mil os portugueses que não têm acesso aos cuidados destes profissionais. Verdade seja dita: quem não tem reclama que quer, e muitos que têm não aproveitam, tampouco os procuram.
Desigualdades à parte, estes tempos de pandemia vieram reforçar a importância dos cuidados de saúde primários, no geral, e dos médicos de família em particular. Que bem soube, honestamente, escutar o Dr. Filipe Froes, ilustre pneumologista – consultor da Ordem dos Médicos e da Direcção-Geral da Saúde para a resposta à covid-19 – afirmar a meio de Abril, em directo para a Euronews, que, entre outras coisas, os bons resultados de Portugal, comparativamente a Espanha, se deviam ao envolvimento precoce dos cuidados de saúde primários.
De facto, quem está no terreno percebe que na linha da frente não podiam estar só os cuidados hospitalares. Afinal, cerca de 95% dos infectados desenvolvem apenas sintomas ligeiros ou nenhum sintoma mas, não tendo por que estar ou sequer recorrer a um hospital, não deixam de poder infectar outros e, por isso, de precisar de atenção médica. Manter estas pessoas no seu domicílio acompanhadas pelo seu médico de sempre, terá sido, efectivamente, uma das chaves da boa resposta do SNS.
Após a paralisação inicial pelo receio de contágio, assente na falta de meios de protecção individual, a resposta foi eficaz. Durante estas semanas tenho observado médicos a fazer triagem de utentes à porta das unidades de saúde, a fazer teleconsultas e videoconsultas, mantendo as consultas de urgência, bem como as de vigilância de saúde materna e saúde infantil e, ao mesmo tempo, a vigiar milhares de doentes e suspeitos de covid-19, através da aplicação informática Trace Covid criada pela SPMS para o efeito.
O Secretário de Estado da Saúde, António Sales, afirmou recentemente serem mais de 70 mil os profissionais inscritos na referida plataforma. Acrescento que pelo menos 10 mil serão médicos de família, incluindo no somatório os internos da especialidade. Um enorme batalhão de médicos a seguir o doente, esta doença e as outras, a tranquilizar, a aumentar a literacia em saúde, a resolver a burocracia inerente ao isolamento e à incapacidade para o trabalho, a detectar contactos em estreita colaboração com as equipas de Saúde Pública, a sinalizar pessoas com sintomas suspeitos e a zelar pelo bem-estar do doente em todas as suas dimensões, missão última da Medicina e, em especial, da Medicina Geral e Familiar.
Em virtude deste trabalho, nem mesmo os 600 mil cidadãos que não têm médico de família ficaram de fora da vigilância. De igual modo, os imigrantes, os refugiados e os requerentes de asilo, a quem foram atribuídos cuidados de saúde no nosso país, não ficaram de fora da vigilância. Por tudo isto, e neste dia comemorativo, se o leitor me perdoar a ousadia, termino com um agradecimento e um pedido. Ao meu médico, Dr. Rui, obrigado pelas mais de três décadas em que tem zelado pela saúde da minha família. E a si, caro leitor, se tiver como, faça o seu elogio e agradecimento ao seu médico de família, ele vai com certeza gostar.