Como se produzem células que nos protegem contra infecções?
Cientistas em Portugal perceberam como certas células são necessárias para o desenvolvimento eficaz de outras importantes contra invasores externos.
Há células nos tecidos do nosso corpo que funcionam como autênticas vigilantes. Estão nos tecidos dos intestinos, dos pulmões ou da pele e protegem-nos contra microorganismos invasores. Mas como são produzidas? Um estudo liderado por cientistas em Portugal mostra que há células reguladoras que estimulam o desenvolvimento dessas outras células vigilantes nesses tecidos em ratinhos. Publicado esta segunda-feira na revista científica Nature Immunology, este é um conhecimento importante a nível das vacinas e da imunoterapia.
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Há células nos tecidos do nosso corpo que funcionam como autênticas vigilantes. Estão nos tecidos dos intestinos, dos pulmões ou da pele e protegem-nos contra microorganismos invasores. Mas como são produzidas? Um estudo liderado por cientistas em Portugal mostra que há células reguladoras que estimulam o desenvolvimento dessas outras células vigilantes nesses tecidos em ratinhos. Publicado esta segunda-feira na revista científica Nature Immunology, este é um conhecimento importante a nível das vacinas e da imunoterapia.
As tais células vigilantes chamam-se, na verdade, “linfócitos T de memória residentes nos tecidos” e são um grupo especializado de linfócitos T. Essas células são cruciais para atacar directamente microorganismos invasores e estão presentes nos tecidos da pele, dos pulmões e dos intestinos.
“Estes linfócitos T residentes nos tecidos desenvolvem-se após uma infecção inicial e fornecem protecção contra futuras infecções, como parte da memória imunitária”, define Cristina Ferreira, investigadora no Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (IMM) – em Lisboa – e primeira autora do artigo num comunicado sobre o trabalho. Além de cientistas do IMM, em Portugal participaram investigadores do Instituto Gulbenkian de Ciência (em Oeiras). O trabalho também envolveu cientistas de instituições de França e da Alemanha.
Marc Veldhoen lembra que este estudo foi iniciado para se tentar perceber melhor como estas células se desenvolvem. “Elas fazem parte de uma primeira linha de defesa e respondem rapidamente para nos proteger contra infecções em locais que são pontos de entrada para os agentes patogénicos”, acrescenta o investigador principal do IMM e líder do estudo.
Inesperadamente, entraram nesta história outras células, os linfócitos T reguladores, e percebeu-se que tinham um papel muito importante: os linfócitos T reguladores são necessários para o desenvolvimento eficaz dos linfócitos T residentes. Marc Veldhoen destaca que isto “é surpreendente” porque os linfócitos T reguladores têm a capacidade de reduzir as respostas imunitárias e, desta forma, evitar que o sistema imunitário danifique os nossos tecidos e nos prejudique.
Mas como se observou essa relação entre as diferentes células? Ao se utilizarem ratinhos sem linfócitos T reguladores, viu-se que o número de linfócitos T residentes nos tecidos dos seus intestinos era muito menor. No comunicado, Cristina Ferreira explica que se verificou que os linfócitos T são recrutados para irem para o local de infecção. Depois, quando lá estão, “promovem a disponibilidade” da molécula TGF-beta. “De acordo com os nossos resultados, esta molécula é crucial para produzir os linfócitos T residentes nos tecidos”, nota a investigadora.
Marc Veldhoen faz mesmo uma comparação: é como se o “sistema de vigilância” no intestino fosse desligado, porque o menor número de linfócitos T residentes nos tecidos levou a uma menor protecção contra microorganismos invasores.
Apesar de o estudo ter sido feito em ratinhos, os linfócitos T residentes também estão presentes nos humanos. “Pensamos que os nossos resultados se aplicarão também à imunologia humana”, realça Marc Veldhoen. O cientista avisa ainda que, se o trabalho nos ratinhos evoluir bem, a sua equipa irá investigar se os linfócitos T residentes são produzidas de forma semelhante nos humanos.
Das vacinas à imunoterapia
Este trabalho traz-nos informações importantes sobre como os linfócitos T residentes se desenvolvem. Para Marc Veldhoen, isto será um contributo para as vacinações e pode ser importante para a imunoterapia antitumoral.
E porquê? O investigador indica que seria bom que os linfócitos T residentes fossem produzidos depois da vacinação e na resposta contra o cancro. “O nosso trabalho mostra que o envolvimento de um subconjunto de linfócitos T reguladores será benéfico para um bom desenvolvimento dos linfócitos T residentes – algo que é desejável após a vacinação.”
Este estudo pode ainda fornecer mais conhecimento sobre como os linfócitos T residentes são produzidos em doenças crónicas ou durante respostas imunitárias indesejadas, como as que são observadas na doença celíaca.
Marc Veldhoen diz que já se dedica há algum tempo aos linfócitos T residentes e que vai continuar interessando em perceber o papel dessas células em diferentes tipos de infecções. “Isto poderá ser importante para se conceberem vacinas contra os diferentes tipos de infecções, por exemplo de bactérias e vírus”, assinala. Também se pretende usar o conhecimento destes estudos para se aproveitar estas células na imunoterapia.