Bolsonaro, um remédio contra o populismo
Bolsonaro arrisca-se a ser um vírus contra o populismo que o criou porque, para lá de todos os abusos, é manifestamente incompetente, inculto e com uma visão do mundo reduzida à caserna onde germinou.
Dias depois de assumir a pasta da Saúde, o ministro Nelson Teich bateu com a porta a Jair Bolsonaro. O seu gesto é o mais recente exemplo do custo da contradição entre o discurso dos populistas quando disputam o poder e a sua acção quando o exercem. Teich sai por se recusar mudar o protocolo médico e aceitar, contra a opinião da ciência, o uso generalizado de cloroquina para travar a pandemia; Henrique Mandetta, seu antecessor na Saúde, saiu por defender o confinamento contra a vontade de Bolsonaro; o outrora santificado Sergio Moro saiu da Justiça por se opor à ingerência do Presidente na polícia criminal. Quando o Brasil precisava de tino, vê-se entregue aos desmandos de um incendiário.
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Dias depois de assumir a pasta da Saúde, o ministro Nelson Teich bateu com a porta a Jair Bolsonaro. O seu gesto é o mais recente exemplo do custo da contradição entre o discurso dos populistas quando disputam o poder e a sua acção quando o exercem. Teich sai por se recusar mudar o protocolo médico e aceitar, contra a opinião da ciência, o uso generalizado de cloroquina para travar a pandemia; Henrique Mandetta, seu antecessor na Saúde, saiu por defender o confinamento contra a vontade de Bolsonaro; o outrora santificado Sergio Moro saiu da Justiça por se opor à ingerência do Presidente na polícia criminal. Quando o Brasil precisava de tino, vê-se entregue aos desmandos de um incendiário.
Bolsonaro foi eleito com base na presunção de que a tenda da corrupção montada nos governos do PT seria demolida. Com a crença de que o seu discurso agressivo e básico era fundamental para o resgate da soberania popular. Com a certeza de que um homem sintonizado com a raiva do povo contra os políticos tradicionais só poderia servir a causa do povo. Com a condescendência de que os seus apelos ao autoritarismo da ditadura eram apenas discursos de circunstância. Bolsonaro seduziu no desespero, ao vender soluções simples para problemas difíceis.
O manual do populismo funcionou e Bolsonaro chegou ao poder. O manual da História também funcionou e Bolsonaro é hoje a prova mais acabada de que o populismo é uma ilusão pestilenta. O Brasil sofreria sempre imenso com a covid-19, mas dispensava um presidente que se arroga dizer que, agora, “essa questão da cloroquina passa por mim”, que festeja com apoiantes enquanto médicos e ministros pedem distância social, que manda abrir lojas contra a vontade de governadores, que resume o perigo da pandemia a uma “gripezinha ou resfriadinho”. Numa altura em que o Brasil precisava de rumo e unidade, tem a conduzi-lo um arruaceiro afundado na sua incompetência e enredado nas suas quezílias.
Bolsonaro arrisca-se a ser um vírus contra o populismo que o criou porque, para lá de todos os abusos, é manifestamente incompetente, inculto e com uma visão do mundo reduzida à caserna onde germinou. Terá sempre com ele uma fatia do Brasil que o consagra com igual fervor ao que dirige a pastores evangélicos do quilate de Edir Macedo. Mas há muito Brasil para lá dessa caricatura. O Brasil cosmopolita, moderno, vibrante e culto, o Brasil hoje desorientado e ansioso, aprendeu uma terrível lição. O ódio ou a desilusão com as mentiras do PT não justificam a aposta em tão sinistro personagem. Que sirva de exemplo.