Reacção inflamatória rara que pode estar associada à covid-19 detectada em 230 crianças na Europa
Autoridade europeia da saúde pede a médicos e pais que estejam atentos a eventuais sinais desta patologia. Em Portugal, foi detectado um caso num adolescente de 13 anos que já teve, entretanto, alta hospitalar. ECDC salienta que esta é uma condição rara e que o “potencial vínculo com a covid-19”, embora pareça plausível, não só não está estabelecido como não é “bem compreendido”.
Nas últimas semanas foram diagnosticados 230 casos suspeitos de síndrome inflamatória multissistémica em crianças na Europa. Esta reacção rara que tem sido ligada à covid-19 já causou a morte a duas crianças (uma em França, outra no Reino Unido).
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Nas últimas semanas foram diagnosticados 230 casos suspeitos de síndrome inflamatória multissistémica em crianças na Europa. Esta reacção rara que tem sido ligada à covid-19 já causou a morte a duas crianças (uma em França, outra no Reino Unido).
De acordo com um boletim do Centro Europeu de Controlo de Doenças (ECDC), divulgado esta sexta-feira, os sintomas são uma mistura dos da doença de Kawasaki e dos da síndrome de choque tóxico: febre, dor abdominal e complicações cardíacas, entre outros. A associação com a covid-19 está a ser avaliada porque a presença do novo coronavírus foi detectado em algumas destas crianças.
No total, e em todo o mundo, o ECDC diz que já foram identificados 322 casos em doze países, entre estes um caso em Portugal, mas também na Áustria, Canadá, França, Alemanha, Grécia, Itália, Luxemburgo, Espanha, Suécia, Suíça, Reino Unido e Estados Unidos — casos que a autoridade europeia da saúde diz estarem a ser investigados “detalhadamente”.
No início de Abril associações de pediatria do Reino Unido, da Itália e de Espanha pediram aos médicos para estarem atentos a crianças com um quadro inflamatório raro porque suspeitavam que a doença podia estar ligada ao novo coronavírus, que causa a doença covid-19.
Do que já é conhecido sobre este novo coronavírus, sabe-se que as crianças estão entre os grupos menos afectados. Os dados do ECDC revelam mesmo que apenas 2,1% de todos os casos confirmados em laboratório e registado pelo Sistema Europeu de Vigilância (TESSy, na sigla inglesa) foram detectados em crianças até aos 14 anos.
No documento, e tendo em conta o que se sabe sobre a covid-19, o ECDC faz uma avaliação dos riscos das duas patologias em crianças. O risco geral da covid-19 em crianças nos países da União Europeia (UE) e no Reino Unido é considerado “baixo” e o impacto da doença é “moderado”. No caso da síndrome inflamatória rara, a autoridade europeia da saúde afirma que o risco também é baixo, mas realça que a doença pode ter um “impacto alto” nas crianças.
Embora seja dito que a “gestão clínica” destes casos já identificados é uma “prioridade absoluta”, o ECDC afirma que a recolha de mais dados nos países da União Europeia e do Reino Unido fortaleceria o conjunto de informações já existentes sobre esta condição rara e permitiria uma melhor análise destes casos. “Uma análise dos dados de vigilância poderia esclarecer a incidência da doença de Kawasaki ou da síndrome inflamatória rara multissistémica e identificar as faixas etárias mais afectadas e os factores de risco associados a ambas as condições”, lê-se no documento esta sexta-feira divulgado.
Apesar da associação das duas patologias “parecer ser plausível”, a autoridade da saúde realça que esta é uma condição rara e que o “potencial vínculo com a covid-19” não só não está estabelecido como não é “bem compreendido”. O ECDC diz que é necessário conscientizar não só a comunidade médica, mas também pais e cuidadores, para que estejam atentos a potenciais sinais e sintomas. “A importância do contacto com um profissional de saúde deve ser enfatizada”, escreve.
Entretanto, o ECDC e as autoridades de saúde dos estados-membros da UE e do Reino Unido concordaram em incluir a síndrome rara como uma possível complicação a ser relatada para vigilância da covid-19 em território europeu, e prometem investigar.
O caso português
Em Portugal, no final de Abril, a directora-geral da Saúde afirmou que foi detectado um caso depois de terem sido questionados “todos os serviços de pediatria”. No entanto, alguns dias depois, Graça Freitas aproveitou para explicar que a criança internada com quadro inflamatório não tinha síndrome de Kawasaki, acrescentando que a criança infectada com covid-19 tinha “uma evolução favorável”.
Este caso português consta do boletim do ECDC agora divulgado. De acordo com o documento, o caso foi reportado a 4 de Maio numa criança de 13 anos. O menino apresentava febre alta, conjuntivite bilateral, dores abdominais e no tórax e algumas complicações cardíacas. Além disso, a criança apresentava “lesões de pele” que foram analisadas e cujos resultados estão ainda pendentes. Depois de vários testes, a criança foi confirmada como infectada com o novo coronavírus e exames raio-x mostraram pneumonia grave associada á doenaç.
Esta sexta-feira, na conferência de imprensa diária da covid-19, Graça Freitas voltou a comentar o caso da criança portuguesa. “Felizmente foi uma criança que, tanto quanto sabemos, já teve alta”, disse a directora-geral. Graça Freitas garantiu que os serviços de pediatria estão atentos e “prontos não só para diagnosticar, como também para tratar” eventuais casos que surgem.
OMS estuda ligação entre as patologias
A Organização Mundial de Saúde (OMS) está à procura de provas sobre a ligação entre a covid-19 e a doença de Kawasaki, revelou esta sexta-feira o presidente da entidade, Tedros Adhanom Gjebreyesus. “As hipóteses iniciais indicam que essa síndrome pode estar ligada à covid-19”, afirmou o responsável em conferência de imprensa através da Internet, sublinhando que o estudo desta relação “é crítico e urgente”.
Por isso, o líder da OMS apelou a “todos os médicos do mundo para que trabalhem com as suas autoridades nacionais e com a OMS para estarem alerta e melhor se compreender esta síndrome nas crianças”.