O CDS no labirinto da irrelevância
O CDS de 2020 enfrenta um problema grave, o da sua própria sobrevivência.
O CDS nunca foi “centrista”. Tanto o seu “povo” como os dirigentes eram estruturalmente de direita. O partido aglutinou algumas elites identificadas com o regime deposto a 25 de Abril (Freitas do Amaral, Adriano Moreira), algum povo igualmente apreensivo com a revolução e integrou-se notavelmente na democracia, levando a que o seu eleitorado acabasse por fazer o mesmo. Nunca foi um partido de massas, mas teve uma enorme relevância política.
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O CDS nunca foi “centrista”. Tanto o seu “povo” como os dirigentes eram estruturalmente de direita. O partido aglutinou algumas elites identificadas com o regime deposto a 25 de Abril (Freitas do Amaral, Adriano Moreira), algum povo igualmente apreensivo com a revolução e integrou-se notavelmente na democracia, levando a que o seu eleitorado acabasse por fazer o mesmo. Nunca foi um partido de massas, mas teve uma enorme relevância política.
Sempre que teve arroubos centristas, o CDS falhou. O CDS/PP de Paulo Portas e o CDS/PP de Manuel Monteiro vieram responder ao falhanço da passagem ao centrismo de Freitas do Amaral que no princípio dos anos 90 deixava o partido com 4,4%, duas décimas acima dos 4,2% de Cristas nas legislativas.
Portas achava – e bem – que entre ele e a parede não podia haver mais nada. Ao falhanço da “centrista” Assunção Cristas sucedeu “Chicão”, o novo líder que iria conduzir as massas para a verdadeira direita. Mas, para que ninguém se assustasse muito, “Chicão” passou os primeiros tempos a jurar simpaticamente que não é tão à direita como o pintam. Para já, olhando as sondagens, o sucesso está a ser nulo.
Talvez por isso, e pela subida do fenómeno Ventura nos estudos de opinião, o CDS agora dedica-se a causas tão surreais como a contestar que um programa da nova telescola tenha incluído um excerto anódino de um programa do historiador Rui Tavares sobre a Exposição do Mundo Português. Se tudo se limitasse a um tweet do azougado Nuno Melo era como o outro. Mas não: o CDS entregou uma pergunta ao Governo (!), esse instrumento parlamentar dedicado a endossar protestos. Os deputados Telmo Correia, um histórico do partido, e Ana Rita Bessa querem “medidas para corrigir a situação de modo a que não se repita” (!!!). Isto porque Rui Tavares é “um político”.
Além de se basear em factos falsos (Rui Tavares não “deu aulas na telescola”, a professora é que recorreu a uma parte de um programa com dois anos), o CDS mostra uma vertigem censória inacreditável que só tem um precedente delirante quando o seu histórico Nuno Abecasis, antigo presidente da Câmara de Lisboa, organizava manifestações à porta da Cinemateca por causa da exibição do filme de Godard Je Vous Salue, Marie, prometendo “escaqueirar tudo”. Mas estávamos em 1985.
O CDS de 2020 enfrenta um problema grave, o da sua própria sobrevivência enquanto partido relevante. Com a ascensão de Ventura nos estudos de opinião começa a haver algo – perigoso – entre o partido e a parede. Concorde-se ou não com as suas ideias, o CDS faz falta à democracia portuguesa. Mas este nível de intervenções no espaço público mostra como está confinado num labirinto de irrelevância do qual talvez já não vá sair e isso tem consequências graves para o regime tal como o conhecemos.