Coronavírus: a oportunidade de um futuro climate-smart
Precisamos de uma geração de engenheiros de minas e geólogos virada para o futuro, que seja climate-smart e capaz de responder aos grandes desafios que se avizinham no período pós-pandemia.
A pandemia global que atravessamos desafia-nos diariamente, deixa marcas e exige em simultâneo o melhor de cada indivíduo e da sociedade. Aquele que é possivelmente o “maior desafio da minha geração” é, também, um momento único que permitiu abrir a porta a um futuro difícil de imaginar e que põe em causa a generalidade dos modelos adoptados para descrever a nossa vida.
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A pandemia global que atravessamos desafia-nos diariamente, deixa marcas e exige em simultâneo o melhor de cada indivíduo e da sociedade. Aquele que é possivelmente o “maior desafio da minha geração” é, também, um momento único que permitiu abrir a porta a um futuro difícil de imaginar e que põe em causa a generalidade dos modelos adoptados para descrever a nossa vida.
Nos primeiros quatro meses de 2020, assistimos a uma diminuição drástica das emissões de dióxido de carbono para a atmosfera, estimada em cerca de 25% só na China, e um melhoramento generalizado da qualidade do ar nas cidades em que vivemos. Acções essenciais para um combate efectivo à crise climática que também atravessamos e não parou. A economia global entrou num estado de dormência generalizado, resultando na perda de milhões de postos de trabalho em todo o mundo e no colapso das grandes cadeias de gestão logística. Neste mesmo período, a produção e consumo de combustíveis fósseis e derivados caiu abruptamente, levando atrás o valor do barril do petróleo nos principais mercados internacionais. Assistimos a um dia sem precedentes na história dos mercados financeiros, onde o barril de petróleo foi negociado com valores negativos na bolsa de Nova Iorque e atingiu os 15 dólares na bolsa de Londres.
O outro lado da porta deixa-nos ver que o actual modelo económico e de consumo associado à exploração desenfreada de recursos naturais e a um crescimento ilimitado é pouco resiliente a momentos de crise, acentua desigualdades e desprotege os que mais necessitam de ajuda. Estamos, portanto, numa situação privilegiada para repensar e redesenhar uma sociedade mais justa, com uma distribuição de riqueza mais igualitária e que faça uma gestão inteligente dos recursos naturais existentes. Foi esta uma das mensagens chave do Secretário-Geral da Nações Unidas, António Guterres, no Dia Internacional da Terra, celebrado a 22 de Abril.
Esta pequena janela de oportunidade deve servir para repensar a nossa relação com os recursos naturais e chamar à linha da frente conceitos centrais como geociências climate-smart e economia circular. Há mais vida para além da necessidade óbvia de aliviar a dependência em combustíveis fósseis, mais poluentes, e de apostar em fontes de energia renováveis mais limpas. Estas permitem não só mitigar as emissões de CO2 para a atmosfera como se mostram capazes de lidar com a actual crise. Como exemplo, o investimento internacional em parques eólicos offshore terá sido, para já, pouco afectado. Do outro lado da moeda está a necessidade de alimentar estas tecnologias de ponta com recursos minerais que escasseiam na natureza e estão localizados ambientes geológicos complexos. A sua extracção e produção de forma sustentável terá obrigatoriamente de incluir uma rigorosa monitorização das operações em tempo real sob a insígnia Climate-Smart Mining: Minerals for Climate Action, de forma a minimizar impactes ambientais. Mas para um futuro mais verde precisamos de fazer mais.
Estima-se que em toda a Europa existam mais de 500 mil aterros por identificar e caracterizar. Este é um passo necessário e que tem de ser considerado para proteger e recuperar solos já contaminados, que representam um risco para as comunidades. Mas estes depósitos antropogénicos são também uma oportunidade como fonte de recursos naturais raros necessários para a transição energética que tanto desejamos. A potencial exploração destes recursos de forma equilibrada permitirá a sua re-introdução na economia, contribuindo positivamente para a implementação global de uma economia circular.
Estes dois simples exemplos mostram a necessidade de colocar as ciências da terra no centro da decisão. Precisamos de uma geração de engenheiros de minas e geólogos virada para o futuro, que seja climate-smart e capaz de responder aos grandes desafios que se avizinham no período pós-pandemia.