Covid-19 na Rússia cresce ao ritmo de dez mil por dia, com mortalidade baixa
Apesar de uma grande quantidade de infecções, há poucos óbitos, o que levanta a suspeição sobre os números oficiais.
Os números assustam: neste domingo, foram contabilizados mais 10.633 novos casos de covid-19 na Rússia, quando no sábado o número de casos novos de doença tinha andado perto, 9623. O resultado é que o maior país do mundo em território tem agora mais de 134 mil doentes de covid-19 detectados.
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Os números assustam: neste domingo, foram contabilizados mais 10.633 novos casos de covid-19 na Rússia, quando no sábado o número de casos novos de doença tinha andado perto, 9623. O resultado é que o maior país do mundo em território tem agora mais de 134 mil doentes de covid-19 detectados.
Só que, em contraste com o que se passa noutros países, a taxa de letalidade da infecção pelo novo coronavírus mantém-se bastante inferior: segundo os números oficiais, morreram até agora 1280 pessoas. Os especialistas, no entanto, dizem que o número de vítimas mortais não espelha a realidade no terreno.
“Quanto mais infecções descobrimos, mais a taxa de mortalidade diminui proporcionalmente”, disse à Radio Free Europe-Radio Liberty Ievgeni Timakov, especialista russo em doenças infecciosas.
Muitas das mortes, dizem, são justificadas com outras patologias, como pneumonia, que é uma consequência da infecção pelo novo coronavírus. Por exemplo, Moscovo registou 7-312 casos de pneumonia, mais 53% que no mesmo período do ano passado, e em Janeiro o aumento foi de 37%, o que levanta dúvidas sobre se a Rússia beneficiou mesmo de um atraso na propagação mundial do vírus.
“O Governo está a mentir à descarada”, disse à mesma rádio Anastasia Vasilieva, representante do sindicato Aliança de Médicos. “Não querem o pânico, não querem que as pessoas percebam o mau estado do nosso serviço de saúde”.
A baixa taxa de mortalidade (0,9%) contrasta com a do resto do mundo e as autoridades russas têm-na justificado dizendo que a pandemia atingiu os outros países mais cedo, dificultando a sua capacidade de resposta, enquanto na Rússia o atraso lhes permitiu prepararem-se para o que já sabiam que aí vinha. As medidas de isolamento social decretadas, como o confinamento, impediram a propagação do vírus, os serviços de saúde têm conseguido dar resposta, salvando vidas, e a realização de mais testes diminui proporcionalmente a taxa de letalidade, argumentam.
E, ao contrário de outros países, como os Estados Unidos, a Rússia tem seguido “todas orientações e recomendações da Organização Mundial de Saúde”, disse a representante da organização no país, Melita Vujnovic. “A Rússia tomou, desde o início, medidas epidemiológicas e continua a fazê-lo”, continuou a representante, sublinhando que o sistema de saúde “não colapsou”, permitindo continuar a tratar muitas pessoas.
Por exemplo, um homem de 75 anos, que estava a fazer quimioterapia no hospital de Kommunarka, na periferia de Moscovo, viajou para Itália e quando regressou à Rússia acabou por morrer, diz a Radio Free Europe-Radio Liberty. A causa foi atribuída a uma “hemorragia”. E, a 19 de Março, uma mulher de 79 anos morreu de pneumonia, mas as autoridades acabaram por mudar a causa do óbito para “coágulo”.
Ainda a título de exemplo, no mesmo artigo é relato que no Daguestão, no Cáucaso do Norte, um médico relatou a 28 de Abril que só no seu hospital tinham morrido 12 pessoas de pneumonia nos quatro dias anteriores e que “8o a 90% desses casos eram quase de certeza relacionados com o coronavírus”. No entanto, oficialmente, até aquela data, só havia 11 mortes por covid-19 no Daguestão.
O epicentro da pandemia no país é Moscovo e mais de 50% dos casos das últimas 24 horas são de pessoas assintomáticas, o que dificulta bastante a sua detecção, obrigando à realização de cada vez mais testes – mais de 3,5 milhões foram feitos no país.
Antes destes recordes consecutivos, a Rússia registava um aumento entre quatro mil a cinco mil casos por dia e o Presidente russo, Vladimir Putin, garantiu que a situação estava sob controlo, apesar de ser preocupante, e prolongou o confinamento até 11 de Maio, sublinhando que o “pico ainda não tinha sido atingido”.
Moscovo é o epicentro da pandemia na Rússia. Segundo os números oficiais, tem 68 mil casos de covid-19. Mas o presidente da câmara, Serguei Sobianin, escreveu no seu blogue que, com base nos testes à população, os números reais poderão ser bem maiores, chegando aos 250 mil. Moscovo tem 12,7 milhões de habitantes, o que quer dizer que, 2% estarão infectados. “É óbvio que a ameaça continua a crescer”, escreveu.
A pandemia já chegou inclusive ao seio do Governo. O primeiro-ministro russo, Mikhail Mishustin, informou esta semana Putin de que estava infectado, afastando-se temporariamente das suas funções, e mais dois ministros testaram positivo para covid-19.