Defesa de autarca de Castelo Branco diz que lei que determinou perda de mandato é inconstitucional

Após confirmação do Supremo Administrativo que validou afastamento do presidente da autarquia socialista, Luís Correia recorre para o Tribunal Constitucional para impedir que decisão se torne definitiva.

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Presidente da Câmara de Castelo Branco recorre para o Tribunal Constitucional da decisão de perda de mandato evr Enric Vives-Rubio

O advogado de defesa do presidente Câmara de Castelo Branco, Artur Marques, alega que “não está provado em lado nenhum do acórdão” que Luís Correia “tenha actuado com intenção de favorecer familiares” no caso dos três contratos que o município albicastrense celebrou com uma empresa detida pelo pai do autarca socialista, entre 2014 e 2016, no valor de 180 mil euros. Um tio da mulher do presidente da câmara, a deputada Hortense Martins - líder da distrital do PS e mulher de Luís Correia - também faz parte da firma que fez contratos com a autarquia socialista.

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O advogado de defesa do presidente Câmara de Castelo Branco, Artur Marques, alega que “não está provado em lado nenhum do acórdão” que Luís Correia “tenha actuado com intenção de favorecer familiares” no caso dos três contratos que o município albicastrense celebrou com uma empresa detida pelo pai do autarca socialista, entre 2014 e 2016, no valor de 180 mil euros. Um tio da mulher do presidente da câmara, a deputada Hortense Martins - líder da distrital do PS e mulher de Luís Correia - também faz parte da firma que fez contratos com a autarquia socialista.

No recurso que interpôs para o Tribunal Constitucional (TC) na sequência da decisão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) que se pronunciou pela perda de mandato do autarca -, Artur Marques foca-se naquilo que considera ser uma “questão fundamental”: “Não está dado como provado que o presidente tivesse actuado com intenção de favorecer familiares”.

Ao longo de 12 páginas, o advogado detém-se a explicar as circunstâncias em que ocorre a perda de mandato e critica a tese adoptada no acórdão do STA de que o juízo de proporcionalidade já está integrado na norma que prevê a perda de mandato como consequência da preterição do impedimento. A defesa considera inconstitucional “a ideia de que a preterição de um impedimento gera ‘uma presunção absoluta de parcialidade’”.

“À luz do sentido constitucionalmente admissível do art.º 8º, nº2 da Lei 27/96, a aplicabilidade da sanção de perda de mandato num caso concreto terá de ser legitimada por um raciocínio ponderativo que conclua pela sua conformidade com o princípio da proporcionalidade à luz das circunstâncias do caso concreto”, defendo o advogado, observando que “a ponderação estruturar-se-á em torno do confronto entre os direitos, liberdades e garantias do titular do órgão da Administração que seriam afectadas pela perda de mandato e os princípios e valores constitucionais protegidos pela norma ou pelas normas que instituem o fundamento”.

O recurso precisa que “o direito de permanecer e exercer o cargo autárquico para o qual se foi eleito correlaciona-se com o valor constitucionalmente protegido da administração autárquica democrática, que se apoia no direito de os residentes escolherem os titulares dos órgãos da autarquia e de não verem essa escolha perturbada ou quebrada, salvo com fundamento constitucional”.

Artur Marques detém-se no n.º 3 do art.º 242º da CRP, que determina que “sanção tutelar ‘só’ possa intervir perante ilegalidades ‘graves’”, para dizer que este mesmo artigo “enuncia directivas para uma ponderação de proporcionalidade: o ’só’ estabelece um nível de protecção de direitos, liberdades e garantias, cuja afectação em consequência de uma conduta ilegal só permite para além de uma certa medida”.

O advogado lamenta, no recurso enviado para o TC, que a Lei 27/96 tenha tomado “uma opção entre o tudo e o nada: ou sancionar com a perda de mandato ou não aplicar sanção, visto que nenhuma outra se encontra tipificada na lei”.

“Acresce que a gravidade do acto violador do impedimento incorpora (…) uma componente de dolo específico, no sentido de que só é passível de ser sancionada com a perda de mandato a conduta do autarca quem, através dela, visou uma vantagem patrimonial para si ou para terceiro (…)”, acrescenta-se no recurso, precisando que “esse dolo específico (…) é um facto que não se presume, que tem de ser alegado e provado, como requisito insuprível da sanção da perda de mandato”.

O advogado de defesa do presidente da Câmara de Castelo Branco diz que a referida norma da Lei 27/96 “ofende, por isso, os princípios constitucionais da restrição mínima dos direitos, liberdades e garantias, da tipicidade das sanções, do direito à cidadania, com nome e reputação, da presunção de inocência, de acesso ao desempenho de cargos públicos e da proporcionalidade e adequação da sanção de perda de mandato, quando interpretado, como foi, no sentido de que o requisito em causa fica satisfeito com a mera demonstração do dolo directo do autarca (no sentido de ter agido com a intenção ou consciência de violar o impedimento), sem necessidade de alegação e demonstração do dolo específico (intenção de obter uma vantagem patrimonial para si ou para terceiro)”.