As fronteiras estão todos fechadas mas há uma excepção - Rio de Onor é terra de um só povo
Os governos dos dois países decidiram abrir uma excepção para esta aldeia ibérica e dar autorização de passagem para trabalhos agrícolas às quartas-feiras e sábados, durante duas horas, entre as 09h00 e as 11h00. A pé circula-se dos dois lados.
O espanhol Luís Miguel tem propriedades e animais em Portugal e nesta quarta-feira conseguiu passar de tractor para realizar trabalhos agrícolas, pela primeira vez, desde que encerraram as fronteiras devido à pandemia covid-19. Luís vive no lado espanhol da histórica aldeia comunitária de Rio de Onor, em Bragança, e, tal como outros habitantes dos dois lados da raia, a vida divide-se entre Portugal e Espanha.
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O espanhol Luís Miguel tem propriedades e animais em Portugal e nesta quarta-feira conseguiu passar de tractor para realizar trabalhos agrícolas, pela primeira vez, desde que encerraram as fronteiras devido à pandemia covid-19. Luís vive no lado espanhol da histórica aldeia comunitária de Rio de Onor, em Bragança, e, tal como outros habitantes dos dois lados da raia, a vida divide-se entre Portugal e Espanha.
Os governos dos dois países decidiram abrir uma excepção para a peculiar realidade desta aldeia ibérica e, enquanto as fronteiras estiverem encerradas, dar autorização de passagem para trabalhos agrícolas às quartas-feiras e sábados, durante duas horas, entre as 09h00 e as 11h00.
O espanhol tem ovelhas e colmeias em terrenos em volta da aldeia e o único caminho que tinha para passar com o tractor foi bloqueado com grades e fitas pelas autoridades, numa região onde a única passagem autorizada e controlada actualmente é na fronteira de Quintanilha, em Bragança.
“Este é o único caminho que tenho, não tenho outro, portanto tenho de passar por aqui”, contou Luís Miguel, o único que nesta quarta-feira, pouco depois das 09h00, aproveitou a excepção e passou para Portugal com o tractor carregado de fardos para as ovelhas.
A pé, os habitantes dos dois lados mantêm o dia-a-dia, sem constrangimentos, e é assim que Luís tem minimizado também o problema dos trabalhos agrícolas, nas últimas semanas, mas sem o tractor não tem sido possível fazer o necessário.
Diz que já lhe morreram “mais de 60% dos enxames”. No final de Fevereiro instalou 45, ficaram quatro por não poder alimentá-los e cuidá-los. Contas feitas, estima que “perdeu entre seis a nove mil euros num mês”, sem contar com o mel que não vai produzir e os enxames que tem que repor. Quem lhe vai pagar as hipotecas e alimentar a família durante todo o ano, é a pergunta que deixa.
Luís vive em Rihonor de Castilha e garante que não há memória de um tempo assim, mesmo quando existiam as fronteiras físicas nunca os dois povos foram impedidos de se relacionar e circular “Aqui nunca houve fronteira. Aqui é Portugal, aqui é Espanha, mas isto é um povo”, vincou, apontado para os dois lados da aldeia.
O sogro é espanhol, a sogra é portuguesa e têm propriedades de ambos os lados. Garantiu que “60% dos terrenos espanhóis são de portugueses e o contrário em Portugal”.
A autorização para duas vezes por semana passar com o tractor de um lado para o outro “é uma facilidade”, mas duas horas “é pouco” tempo e tem de correr para conseguir fazer os trabalhos agrícolas. O espanhol salienta que apesar das medidas necessárias para a prevenção da pandemia, o acesso em causa “não deixa de ser um caminho agrícola e o tractor não leva o coronavírus”.
“E eu tão pouco, levo três meses sem sair do triste povo, sem me cruzar com ninguém, as primeiras pessoas sois vós”, disse, dirigindo-se aos jornalistas portugueses e espanhóis que hoje acompanharam a abertura temporária da fronteira.
Alertou ainda como é que irá ser para a aldeia - com 14 pessoas do lado espanhol e cerca de 50 do português - se outra vaga da pandemia se instalar no Outono, a época da apanha da castanha, da vindima e da recolha do mel.
Os governos de Portugal e Espanha reconheceram as particularidades de Rio de Onor onde “a actividade do dia-a-dia decorre como se fosse uma aldeia única”, como apontou o comandante distrital de Bragança da GNR, Carlos Felizardo.
Para minimizar os constrangimentos criados com a reposição das fronteiras, Portugal e Espanha acederam aos pedidos das autarquias locais dos dois lados para que houvesse uma excepção e fosse permitido o acesso aos terrenos e para tratar dos animais.
A abertura temporária é controlada pela GNR e Guarda Civil e, até ao momento, apenas três habitantes solicitaram autorização, dois espanhóis e um português.
“As pessoas estão devidamente certificadas para passar, as autoridades têm a relação das pessoas e das viaturas autorizadas”, esclareceu o comandante da GNR, indicando que outros pedidos nas mesmas condições poderão ser autorizados desde que se justifique.
A situação deverá manter-se até ao dia 14 de Maio, data até à qual o Governo português decidiu fechar as fronteiras devido à pandemia covid-19