Debaixo de um céu (quase) sem aviões, a lei do ruído passou a ser cumprida no Campo Grande

Tal como há quase um ano, os ambientalistas da Zero voltaram a medir o ruído numa zona de Lisboa muito afectada pelo som constante da passagem dos aviões de e para a Portela. A diferença é assinalável.

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No dia 23 de Abril só houve 17 movimentos de aviões a descolar e aterrar na Portela Andreia Gomes Carvalho

A legislação do ruído tem sido cumprida, nas últimas semanas, no Campo Grande, em Lisboa. O problema é que isso só está a ser conseguido por causa do Estado de Emergência e da fortíssima redução dos movimentos de aeronaves no Aeroporto da Portela, como constatou a associação ambientalista Zero, que voltou a fazer agora, neste ponto da cidade, um exercício de medição do ruído ambiente, semelhante a outro realizado em Julho do ano passado.

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A legislação do ruído tem sido cumprida, nas últimas semanas, no Campo Grande, em Lisboa. O problema é que isso só está a ser conseguido por causa do Estado de Emergência e da fortíssima redução dos movimentos de aeronaves no Aeroporto da Portela, como constatou a associação ambientalista Zero, que voltou a fazer agora, neste ponto da cidade, um exercício de medição do ruído ambiente, semelhante a outro realizado em Julho do ano passado.

Quando ali esteve em Julho do ano passado, para dar números (medidos em decibéis) a uma percepção evidente a quem mora nesta e noutras zonas de Lisboa mais próximas da Portela, a Zero percebeu que somado ao ruído de base, do tráfego automóvel, que já deixava pouca margem abaixo dos limites legais, o barulho dos aviões a descolar ou a aterrar acrescentava ao quotidiano dos habitantes toda uma camada de poluição sonora já em clara violação da lei.

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Aproveitando o inesperado da actual situação, a Zero decidiu voltar ao local do crime com as mesmas ferramentas - um sonómetro devidamente homologado e certificado, operado pela empresa NoiseLab - para um exercício de comparação que ninguém esperava poder realizar em condições normais. A associação bem tem pedido que se reduzam os movimentos à noite, mas foi preciso um vírus, e uma pandemia global que nestes dois dias atirou para quatro o número de aviões a passar ali no período nocturno, para, por más razões, se perceber o impacto disso no ambiente urbano.

O aeroporto não parou, como constaram por exemplo no dia 23, em que houve 17 movimentos aéreos. Mas isso significa uma redução na sua actividade tão forte que o efeito é notório nos gráficos e tabelas que resultaram deste trabalho. Que para o dirigente da Zero Francisco Ferreira, mostra “que é impossível cumprir a legislação em Lisboa com o aeroporto em funcionamento normal” e que “a sua relocalização tem de ser equacionada no médio prazo”. 

A medição foi contínua entre as 16 horas do dia 22 e as 15 horas do dia 24 de Abril. No ano passado tinha decorrido entre 4 e 6 de Julho. Na comparação dos dois períodos constatou-se uma a diferença de 12 dBA relativamente aos indicadores Lden (média ponderada, para 24h, da exposição ao ruído nos períodos diurno, entardecer e noite) e Ln (exposição no período nocturno). “Considerando que uma variação de 10 dB no nível sonoro corresponde tipicamente a uma sensação do dobro em termos de sensação auditiva, a diferença de 12 dBA verificada está claramente acima dessa diferença”, assinala a Zero. 

A Associação lembra ainda que se “deve também ter em conta que a escala de decibel é logarítmica e a intensidade sonora duplica a cada 3 dBA. Em Julho de 2019, o Lden, que não pode ultrapassar para a zona em causa (zona mista / zona próxima de infra-estrutura aeroportuária) os 65 dBA, assumiu um valor de 74 dBA, em clara ultrapassagem do valor limite legal (mais 9 dBA), o mesmo tendo acontecido relativamente ao Ln (correspondente ao período nocturno) que na altura ultrapassou o valor legal em 11 dBA. 

E o que isto permite concluir. Para a Zero duas coisas importantes. A primeira é de que de nada vale fazer mapas de ruído e planos de acção que não tenham em conta o tráfego aéreo. Mexer nas ruas e circulação automóvel terá algum efeito marginal, mas o grande problema, insiste Francisco Ferreira, vem de cima. E se “não se pode mudar um aeroporto de lugar de um dia para o outro”, admite, estes dados deveriam levar o Governo a reflectir sobre o impacto, no bem-estar e na saúde da população afecta, do actual projecto de expansão da Portela e prolongamento da sua actividade por mais quatro décadas, se avançar, como pretende o executivo, a construção de uma infra-estrutura complementar no Montijo.

“Não quero defender aqui outras soluções, mas julgo que é óbvio que se tornará insustentável manter este modelo por 40 anos”, insiste Francisco Ferreira.