Um gancho para abrir portas ou uma pulseira para não tocar na face: a tecnologia ao serviço da covid-19
Multiplicam-se as invenções tecnológicas para fazer face à pandemia de covid-19. Num mundo global, desenvolvimentos vindos de todos os continentes focam-se numa luta sanitária, que já faz lembra a onda de inovação dos tempos da II Guerra Mundial.
Um dia no fim de Março, enquanto estava a conduzir para a sua fábrica a Oeste de Londres, o designer Steve Brooks não conseguia deixar de pensar no novo coronavírus. O que poderia fazer para conseguir abrir uma porta sem tocar no puxador? “Toda a gente tem de usar o dedo mindinho ou encontrar a parte da porta em que ninguém tocou”, diz à Reuters o designer e proprietário da DDB Ltd, uma empresa que produz mobiliário de escritório. E, assim, idealizou um gancho para completar a tarefa.
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Um dia no fim de Março, enquanto estava a conduzir para a sua fábrica a Oeste de Londres, o designer Steve Brooks não conseguia deixar de pensar no novo coronavírus. O que poderia fazer para conseguir abrir uma porta sem tocar no puxador? “Toda a gente tem de usar o dedo mindinho ou encontrar a parte da porta em que ninguém tocou”, diz à Reuters o designer e proprietário da DDB Ltd, uma empresa que produz mobiliário de escritório. E, assim, idealizou um gancho para completar a tarefa.
O chamado Hygienehook ("gancho de higiene”, em tradução livre) é pequeno o suficiente para caber num bolso e é feito de um material não poroso, o que facilita a sua limpeza. É uma das centenas de aparelhos inventados nas últimas semanas, para ajudar a evitar que as pessoas espalhem o SARS-Cov-2.
De fabricantes de mobiliário a criadores de software de inteligência artificial (IA), empresas de todo o mundo estão a adaptar produtos existentes ou a inventar novos para ajudar a combater a pandemia ou apenas para facilitar a vida daqueles que trabalham a partir de casa e em hospitais ou que estão em quarentena.
A onda de inovação passa por empresas como a Ford e a Airbus até à grande retalhista de produtos de luxo LVMH. Muitas fábricas estão a reestruturar-se para produzir equipamento crítico, como dispensadores de álcool, ventiladores e máscaras.
Em anos que já lá vão era com grandes empresas como estas, com grande capacidade financeira e de fabrico, que habitualmente se contava para se passar rapidamente da concepção de um protótipo à produção. Uma diferença crucial agora, porém, é que a produção nunca foi tão rápida graças a impressoras 3D e software de alta tecnologia — e tanto por empresas grandes como pequenas.
“Há definitivamente uma vastidão de pessoas, com recursos 3D, dispostas a ajudar”, conta MacKenzie Brown, fundador da empresa de design de produto CAD Crowd, sediada na Califórnia. Em meados de Março, a sua empresa lançou um concurso para a criação de dispositivos práticos para fazer frente ao novo mundo do coronavírus. Deram entrada dezenas de candidaturas, incluindo um pulverizador de desinfectante para usar no pulso, metades de luvas para carregar em botões e um dispositivo que permite abrir as portas do carro sem tocar no puxador, destinado a utilizadores de táxis. À medida que a pandemia torna as pessoas bem mais conscientes da questão da higiene, alguns novos produtos podem vir a ter longevidade para lá da crise actual.
“Tínhamos o algoritmo”
As startups estão a renovar a sua tecnologia. Em Seattle, os irmãos Joseph e Matthew Toles e o amigo Justin Ith, proprietários de uma jovem empresa chamada Slightly Robot, desenvolveram uma pulseira quando acabaram a faculdade para ajudar a reduzir comportamentos compulsivos, como beliscões, roer as unhas ou arrancar cabelos. Quando a sua cidade natal registou as primeiras fatalidades do vírus, adaptaram o design para criar uma nova smartband, a Immutouch, que vibra quando a mão se aproxima do rosto.
“Tínhamos o algoritmo, tínhamos o software e o hardware. Demos-lhe um novo propósito para o toque na face”, informa Matthew Toles. “Fizemos 350 dispositivos e abrimos um site numa semana, e agora produzimos o mais rápido que podemos.”
A empresa romena de software para robótica UiPath encontrou, entretanto, uma maneira de os enfermeiros do Hospital Universitário Mater Misericordiae, na capital irlandesa de Dublin, se livrarem dos morosos processos de introdução de dados, automatizando o registo dos resultados dos testes ao vírus. A empresa espera replicar o sistema noutros hospitais.
A Scylla, uma empresa americana de IA que fabrica sistemas de detecção de armas para escolas e casinos, virou-se para o vírus quando a China, o epicentro original do surto, comunicou os seus primeiros casos há três meses. Redireccionaram então um software de análise para a medição de temperatura da testa de um indivíduo, que envia um alerta caso seja detectada febre. Registando imagens a partir de uma câmara térmica, o programa pode ser usado em edifícios públicos, como hospitais e aeroportos, e escritórios de empresas, revelou o director de tecnologia, Ara Ghazaryan. O governo de uma nação sul-americana já encomendou 5 mil licenças para usar em edifícios públicos e sistema de transportes, desvendou Ghazaryan, preferindo não identificar o país.
Inovação da II Guerra Mundial
Uma convulsão global geralmente gera novos produtos e inovação. A actual explosão de criatividade pode vir a comparar-se à verificada durante a II Guerra Mundial, quando empresas, governos e cientistas embarcaram em projectos que tiveram consequências a longo prazo. A tecnologia utilizada para ajudar a guiar os foguetões acabou por conduzir aos primeiros satélites e por levar o humano à Lua.
“Não há dúvida de que os inventores vão aparecer com centenas, senão milhares, de novas ideias”, disse Kane Kramer, inventor e co-fundador da British Inventor's Society. Foi ele o primeiro a conceber a ideia de descarregar música e dados, no final dos anos 70. “Toda a gente baixou as armas e só as está a erguer para combater o vírus. É uma guerra global.”
Muitas empresas estão a doar os seus novos produtos ou a vendê-los ao preço de custo. Os designs do concurso da CAD Crowd, por exemplo, podem ser descarregados gratuitamente. Para algumas empresas, no entanto, o negócio extra poderia proporcionar uma almofada financeira, num momento em que outras fontes de rendimento se dissipam perante a pandemia.
Steve Brooks, da DDB, perto de Londres, tem trabalhado com afinco. Menos de uma semana depois do protótipo, foram postos à venda quatro modelos de gancho pelo preço de cerca de 15 libras (17,20 euros) cada. Está a doar um gancho, por cada um que venda. Agora, Brooks está a dedicar a sua criatividade a outro aparelho com um fim semelhante. “Já recebemos um pedido do Serviço Nacional de Saúde do País de Gales para desenhar algo para empurrar uma porta.”