Entre o Tejo e Sado, o futuro de 790 mil portugueses
Há que tratar os empresários da península de Setúbal de forma justa. Uma região onde o PIB per capita não é em nada igual à restante AML (Área Metropolitana de Lisboa), mas que por estar integrada na AML é prejudicada no acesso a fundos comunitários pela cegueira da estatística.
Entre a margem sul do rio Tejo e norte do rio Sado estão nove concelhos. Nesta região vivem cerca de 790 mil habitantes. É a península de Setúbal.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Entre a margem sul do rio Tejo e norte do rio Sado estão nove concelhos. Nesta região vivem cerca de 790 mil habitantes. É a península de Setúbal.
Antes da covid-19 era uma das regiões do país que mais desafios enfrentava e onde eram necessárias mais mudanças estruturais, de forma a permitir vencer problemas que, colocando-se a esta região, prejudicavam o crescimento do país.
Desde o aeroporto no Montijo a uma situação crítica nos transportes públicos e um inexplicável corte no acesso a fundos comunitários, eram muitas as questões que marcavam o debate político há poucas semanas. Não se podia pensar no progresso do país sem pensar na península de Setúbal
E agora não se pode pensar em combater os efeitos económicos da covid-19 sem pensar na península de Setúbal.
Os empresários desta região emprestam um “valente músculo” à produtividade nacional e às exportações portuguesas. Fazem-no com muito poucos ou quase nenhuns fundos comunitários. Há máquinas a trabalhar na indústria, o turismo desperta com os primeiros investimentos. A agricultura tem um ritmo dinâmico entre a produção de vinho, flores, floresta ou suinicultura.
Transversalmente, estes setores ajudaram o país a crescer. E foram transversalmente afetados pela covid-19, como o resto do país. São empresários com um reduzido ou inexistente acesso a uma importante medida do Governo: adiantamento dos pagamentos e reprogramação dos fundos comunitários.
São medidas destinadas a ajudar na liquidez, que escasseia. E porque o mundo mudou, há que reprogramar os investimentos.
As políticas económicas para a península de Setúbal não podem ser as mesmas que estavam pensadas antes da covid-19. Mas isto não significa que não devam existir de todo. A UE tem carregado a pouco e pouco a bazuca orçamental para a economia europeia. Não se sabe bem como essa munição vai ser paga, nem se será suficiente. Certo é que as circunstâncias atuais obrigam a que os fundos comunitários cheguem à península de Setúbal da mesma forma que chegarão ao resto do país.
Com as atuais condições, esse acesso não é possível. Tem sido uma opção do Governo. E caso insista nessa opção podemos ter uma região com os mesmos problemas que o resto país, mas com poucas ou quase nenhumas medidas da UE a chegarem à península de Setúbal. Ainda assim, esta região contribui com mais de 10% das exportações do país.
Este não é um argumento regionalista, é argumento de coesão territorial. Tratar de forma de forma igual quem sofreu de forma igual com os efeitos desta pandemia.
A reação de Bruxelas ao contexto económico tem um especial foco nas empresas e no emprego que estas asseguram. Por via do Banco Europeu de Investimento está a ser posto em prática um mecanismo que disponibiliza 200 mil milhões às empresas europeias. Esta é uma linha que defende quem gera atividade económica e quer fazer a mudança do paradigma económico com as atuais empresas.
Há que tratar os empresários da península de Setúbal de forma justa. Uma região onde o PIB per capita não é em nada igual à restante AML (Área Metropolitana de Lisboa), mas que por estar integrada na AML é prejudicada pela cegueira da estatística.
Os últimos dados disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estatística indicavam que a península de Setúbal contava com um PIB por habitante de 12.519 euros, enquanto o resto da AML apresentava um PIB por habitante de 27.382 euros.
Para não se perder investimento, empresas e emprego é fundamental ter um mecanismo que apoie quem investiu, tem empresas ativas, mantém e gera postos trabalho.
Se o acesso aos fundos comunitários se mantiver (praticamente) vedado às empresas da península de Setúbal, a região terá empresas menos competitivas e desfavorecidas face ao resto do país e europa. Porque agora os fundos comunitários são uma resposta à covid-19, quando todos foram atingidos, a resposta não pode excluir ninguém.
Os instrumentos financeiros disponibilizados por fundos europeus estruturais e de investimento assumirão prioridade na saúde, empresas, despesas sociais e emprego. É difícil explicar nas atuais circunstâncias porque é que uma região não poderá ter acesso transversal a estes fundos comunitários.
É importante para o país que o futuro de cerca de 790 mil portugueses na península de Setúbal não seja tratado de forma diferente dos restantes.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico