Provedora defende apoio a recibos verdes excluídos

Maria Lúcia Amaral escreveu carta à ministra do Trabalho sugerindo incluir no apoio extraordinário quem abriu actividade há poucos meses.

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A Provedora reconhece os constrangimentos financeiros do Estado para acorrer às empresas e cidadãos Rui Gaudêncio

A Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, escreveu à ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, sugerindo que reveja as regras do apoio extraordinário aos trabalhadores independentes, para que a medida não continue a deixar de fora cidadãos em situações laborais mais frágeis — de descontos intermitentes ou com actividade aberta há pouco tempo, por exemplo.

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A Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, escreveu à ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, sugerindo que reveja as regras do apoio extraordinário aos trabalhadores independentes, para que a medida não continue a deixar de fora cidadãos em situações laborais mais frágeis — de descontos intermitentes ou com actividade aberta há pouco tempo, por exemplo.

O Governo de António Costa já reviu duas vezes as regras de acesso para abarcar mais trabalhadores e incluir não apenas quem está com uma paragem total, mas também quem enfrenta quebras muito acentuadas por causa da situação económica desencadeada pela crise sanitária de covid-19, bem como os sócios-gerentes de empresas sem trabalhadores e com uma facturação até 60 mil euros. São, porém, ainda vários os profissionais que continuam excluídos e é para esses que a Provedora pede uma resposta.

Como para aceder ao apoio é preciso ter descontos à Segurança Social em três meses seguidos ou seis meses interpolados há pelo menos 12 meses, não têm direito a ele os trabalhadores que “iniciaram a actividade há menos de 12 meses” e estejam por isso isentos dos descontos. Embora um trabalhador possa facultativamente passar a descontar, a Provedora de Justiça lembra que a isenção inicial é um “incentivo” público ao início da actividade e que, a perda do direito de acesso ao apoio extraordinário numa situação “absolutamente excepcional” como a de hoje é um “sacrifício excessivo”.

“Mais excessivo e mesmo desadequado”, considera a Provedora, é deixar de fora os trabalhadores excluídos que abriram actividade há pouco tempo e que já anteriormente tinham sido trabalhadores por conta de outrem, “não poucas vezes com carreiras contributivas significativas”.

“Tendo optado por investir numa actividade por conta própria há menos de 12 meses e deixado, pois, a condição de trabalhador assalariado, estes trabalhadores independentes vêem-se agora privados de qualquer apoio quando, há poucos meses, teriam asseguradas todas as medidas aprovadas para os trabalhadores por conta de outrem”, particulariza, pedindo o alargamento do apoio por uma questão de “equidade e de solidariedade”.

A provedora também pede que seja adoptada uma medida que acautele a quem tem carreiras contributivas intermitentes por causa da “própria precariedade da actividade” que exercem por conta própria, como é o caso de artistas, que lhe escreveram a expor os seus casos.

A Provedora ressalva que não ignora (“ninguém ignora”) que há limites financeiros que o próprio Governo tem de ter em conta. “Embora pudesse ser pretensão do Estado dar um apoio total a todos aqueles que perdem agora e vão ainda perder, nos próximos meses, rendimento e liquidez, há limites que se lhe impõem para o auxílio financeiro que pode conferir às empresas, às instituições, às famílias, aos cidadãos numa circunstância como esta que nos afecta”. A chamada de atenção que faz é à “diferenciação” que as regras introduzem entre cidadãos.

Que relatos chegaram à Provedora? Artistas sem três meses de descontos seguidos ou seis interpolados há pelo menos 12 meses “por ser demasiado intermitente a sua actividade e já antes se debaterem com dificuldades”; “trabalhadores independentes que não conseguem subsistir exclusivamente do exercício da sua actividade por conta própria, embora seja a sua principal fonte de rendimento, e que, pelo facto de a complementarem com um trabalho por conta de outrem em part-time, não vão agora poder receber qualquer apoio à redução ou completa paragem da referida actividade; ou aqueles que têm rendimento do arrendamento para o alojamento local e, por causa das regras, “estão excluídos do regime contributivo”.

Maria Lúcia Amaral também propõe que o Governo introduza um “factor de correcção objectivo no critério aplicado aos sócios-gerentes e outros membros de órgãos estatutários abrangidos, com eventual recurso a coeficientes” já previstos nos códigos de IRS, IRC e no código dos regimes contributivos “que permitam conferir maior equidade no tratamento das respectivas situações”.

A Provedora aborda ainda a questão dos limites mínimos e máximo dos apoios, tendo em conta a diferença em relação aos trabalhadores independentes que estão a beneficiar do apoio à família (não cumulável com este).

O regime dos trabalhadores independentes inclui não apenas quem passa recibos verdes, mas também quem tem uma actividade comercial, industrial ou quem é empresário em nome individual, por exemplo.

A carta está publicada no site da Provedora de Justiça.