Tribunal de Contas chumba contrato para a recuperação de habitats na Serra de São Mamede

ICNF abriu um concurso para uma intervenção no parque natural mas a exclusão de um concorrente por causa de uma assinatura digital mereceu críticas do TdC.

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RG RUI GAUDENCIO - PòBLICO

Dúvidas suscitadas pelo júri sobre a validade de uma assinatura digital da sociedade Mata Verde – Estudos e Projetos, Ld.ª, um dos concorrentes ao concurso para a recuperação e valorização dos habitats naturais do Parque Natural da Serra de S. Mamede (PNSM), levaram à exclusão da sua candidatura. A proposta tinha apresentado o preço mais baixo, precisamente o principal critério de adjudicação. Agora, o Tribunal de Contas recusou o visto prévio ao contrato de adjudicação a assinar entre o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) e um outro candidato, dizendo que as razões para afastar a Mata Verde não são válidas.

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Dúvidas suscitadas pelo júri sobre a validade de uma assinatura digital da sociedade Mata Verde – Estudos e Projetos, Ld.ª, um dos concorrentes ao concurso para a recuperação e valorização dos habitats naturais do Parque Natural da Serra de S. Mamede (PNSM), levaram à exclusão da sua candidatura. A proposta tinha apresentado o preço mais baixo, precisamente o principal critério de adjudicação. Agora, o Tribunal de Contas recusou o visto prévio ao contrato de adjudicação a assinar entre o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) e um outro candidato, dizendo que as razões para afastar a Mata Verde não são válidas.

O relatório do Tribunal de Contas (TdC), a que o PÚBLICO teve acesso, refere que o júri do concurso alegou em 19 de Outubro de 2019 que a descrição da assinatura digital apresentada pela sociedade excluída “não demonstrava a respectiva função e poder”.

A sociedade Mata Verde referiu que para efeitos de assinatura digital, o seu gerente, José Ramiro Cordeiro Rodrigues, “tem poderes bastantes para assinar electronicamente em nome e representação da sociedade”. Para reforçar a sua argumentação, juntou à pronúncia uma declaração emitida pela entidade certificadora de assinaturas e certificados digitais, a DigitalSign, entidade que “afirma essa titularidade”, reconhece o TdC . Na declaração emitida pela DigitalSign consta que o representante da sociedade Mata Verde – Estudos e Projetos, Ld.ª “poderá assinar em plataformas electrónicas de contratação, na qualidade de seu legal representante.”

O TdC, a quem o ICNF remetera o contrato que adjudicara à empresa Florecha – Forest Solutions, SA, para efeitos de fiscalização prévia, considerou que a exclusão da Mata Verde “viola os princípios da legalidade, igualdade, justiça, imparcialidade e boa-fé.” E acrescenta: a recusa de uma candidatura “exclusivamente por força de mera formalidade não essencial” contraria o articulado do Código dos Contratos Públicos (CCP) no seu artigo 72º ponto 3: “O júri deve solicitar aos candidatos e concorrentes que, no prazo máximo de cinco dias, procedam ao suprimento das irregularidades das suas propostas e candidaturas (…)”

No caso em apreço verificou-se “a agravante de nem sequer ter sido concedido ao concorrente qualquer prazo para satisfazer a formalidade” que suscitou a exclusão da candidatura, sublinha o acórdão. Perante as conclusões subtraídas, o TdC decidiu “recusar o visto ao contrato”. 

Foram apresentadas a concurso quatro propostas e a da sociedade Mata Verde – Estudos e Projetos, Ld.ª inscreveu um preço contratual de 1.231.063 euros, inferior ao apresentado pela Florecha (que era segunda com valor mais baixo, 1.299.318 euros) e que veio a ser seleccionada por ter o mais baixo preço das três que não foram excluídas.  

Para o TdC, o impacto no resultado financeiro “é evidente” já que o preço contratual da proposta excluída “é inferior ao da proposta sobre a qual recaiu a adjudicação e o único critério de adjudicação era o preço, pelo que, a ser admitida, a proposta excluída seria a vencedora.”

A sociedade Mata Verde intentou a impugnação do acto administrativo de exclusão da proposta por si apresentada e do acto de adjudicação da proposta apresentada pela Florecha contra o ICNF no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.

Nos esclarecimentos prestados ao PÚBLICO, o ICNF salienta que a questão suscitada pelo Tribunal de Contas no acórdão em causa “é apenas de ordem processual e não substantiva”. Esta questão “decorre da existência de posições diferentes do TdC e do ICNF quanto à aplicação do enquadramento legal em matéria de assinaturas qualificadas e da vinculação das sociedades comerciais em procedimentos pré-contratuais”, observa o ICNF, sublinhando que a decisão do TdC “não suscita questões de violação das regras da concorrência, nem de ilegalidade, nem de despesa pública.”

Mesmo assim, “não existe, nem existiu, qualquer execução material ou financeira desse contrato”, diz o ICNF, acrescentando que “ainda está em prazo para recorrer dessa decisão”, facto que justifica o seu propósito de “não tecer mais comentários.”

O objecto central do concurso que o ICNF accionou contempla a aquisição de serviços para “valorização dos habitats naturais” e aplicação de novas soluções de prevenção contra incêndios no Parque Natural da Serra de São Mamede (PNSSM) que se estende pelos concelhos de Arronches, Castelo de Vide, Marvão e Portalegre.

O parque natural foi profundamente afectado por vários incêndios em 2003, que destruíram um território com cerca de 10 mil hectares, preenchido na sua maioria de um coberto vegetal com grande diversidade paisagística de espécies autóctones (pinheiro bravo, sobreiro, azinheira, carvalho negral e castanheiro). Neste momento assiste-se à regeneração natural numa área com cerca de 550 hectares mas carecem de intervenção “cerca de 2.465 hectares”, refere o ICNF, acrescentando que é na Serra de S. Mamede que o castanheiro possui a maior área de ocupação a sul do rio Tejo.