O ódio sagrado ao mundo
Esta é a quarta conversa da nossa terceira memória, dedicada à globalização.
Fuga sæculi, o ódio sagrado ao mundo, era um sentimento comum a gente religiosa de várias religiões na transição entre a Idade Média e o Renascimento. Neste episódio veremos como Isaac Abravanel, o judeu, abandonou os seus entusiasmos aristotélicos para se dedicar a estudar uma data para o fim do mundo. Outros odeiam o mundo, detestam-no com uma força tal precisamente por ele não ter ainda acabado e para demonstrarem o seu amor maior pela espiritualidade que há-de vir, desprezando a carnalidade, a corporeidade deste mundo desgraçado em que vivemos.
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Fuga sæculi, o ódio sagrado ao mundo, era um sentimento comum a gente religiosa de várias religiões na transição entre a Idade Média e o Renascimento. Neste episódio veremos como Isaac Abravanel, o judeu, abandonou os seus entusiasmos aristotélicos para se dedicar a estudar uma data para o fim do mundo. Outros odeiam o mundo, detestam-no com uma força tal precisamente por ele não ter ainda acabado e para demonstrarem o seu amor maior pela espiritualidade que há-de vir, desprezando a carnalidade, a corporeidade deste mundo desgraçado em que vivemos.
A viragem para o interior da alma vem já da Baixa Idade Média, de um movimento como a Devotio Moderna, que florescera na Alemanha e na Holanda a seguir aos tempos da Peste Negra. Havia que desviar o pensamento das coisas do mundo e concentrá-lo em exercícios espirituais, como os jesuítas hão-de fazer, que ponham a alma num estado de desprezo pelas coisas materiais, em antecipação do mundo que há-de vir. Para isso, é preciso não só esperar pelo fim deste mundo; há que não gostar dele, e demonstrá-lo.
Esse ódio ao mundo vai influenciar católicos e protestantes. Martinho Lutero era particularmente enfático na linguagem com que o exprimia: linguagem escatológica, mas não no sentido que aprendemos antes. É que a escatologia como ciência do fim do mundo vem do grego eschatos, que significa termino. E a escatologia de Lutero vem daí, mas também do gregos skatos, que significa excremento — ou, simplesmente, merda. O mundo é, para ele, uma “casa de merda”.
Esta é a quarta conversa da nossa terceira memória, dedicada à globalização.
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