Sair da emergência. Dez ideias para o mês que aí vem
Os líderes parlamentares e deputados únicos dos partidos representados na Assembleia da República, e ainda a deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, deixam as suas ideias para o próximo mês de um país à espera de sair do estado de emergência.
1. Evitar a insolvência
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1. Evitar a insolvência
Ana Catarina Mendes, PS
“Um dos principais desafios que se colocam à economia nacional é o de evitar somar às dificuldades resultantes dos últimos meses, a destruição de valor e de postos de trabalho que resultariam de uma vaga descontrolada de insolvências.
Para isso, será necessário garantir que existem alternativas, designadamente, facilitando a aprovação de planos de recuperação para empresas viáveis, em especial, através de instrumentos com pouca ou nenhuma intervenção dos tribunais, como é o caso do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas ou do Processo Especial de Revitalização. O acesso a estes instrumentos deverá ser alargado, para que as empresas possam reestruturar a sua dívida e continuar no mercado, preservando postos de trabalho e, assim, reduzindo a pressão sobre o sistema previdencial.
Neste contexto, será ainda fundamental garantir que o Estado, enquanto credor por créditos fiscais ou contributivos, fale a uma só voz e seja mais flexível quanto às suas próprias condições de pagamento.
A opção por instrumentos de recuperação, preventivos e extrajudiciais é, de resto, o caminho apontado pela Directiva Europeia sobre Reestruturação Preventiva (em fase de transposição) e está em linha com algumas das reformas já em curso noutros países, como é o caso da Holanda, do Reino Unido ou dos Estados Unidos da América.”
2. Controlo de preços e contenção das margens de lucro
Adão Silva, PSD
“O nosso principal desafio para o próximo mês é conseguir continuar a conter a pandemia e ao mesmo tempo conseguir planear a abertura gradual da nossa economia, sem ceder ao vírus; sendo certo que esta guerra só será ganha na sua plenitude quando tivermos uma vacina, o que irá ainda demorar muitos meses.
Por isso mesmo, é imperativo retomar a chamada ‘normalidade’ e evitar que a crise económica e social atinja proporções ainda maiores do que aquelas que as instituições nacionais e internacionais já vão avançando.
Para esse regresso, vamos ter de ser exigentes connosco e com os outros. Temos de continuar a cumprir as regras de distanciamento social, aderir ao uso generalizado das máscaras e não descurar a tão importante parte da higienização. Foi a pensar nestas medidas que o PSD propôs esta semana no Parlamento a redução do IVA das máscaras e dos produtos desinfectantes para 6%, tendo igualmente apelado ao controlo dos preços e contenção das margens de lucro relacionadas com os novos bens de primeira necessidade.
Mas tão importante como as medidas que vão ser tomadas no mediato, é fundamental começar já a programar o médio prazo, o que nem sempre tem acontecido no nosso país. Portugal tem de estar preparado para uma eventual nova vaga da doença no próximo inverno; nessa altura, temos de ter uma melhor oferta hospitalar, com uma organização em rede, capaz de responder aos doentes da covid-19, mas também aos outros doentes, mais e melhores meios de protecção individual e, ainda, conseguir reforçar o sistema imunológico das pessoas em geral; tendo o PSD proposto, para o efeito, a redução para a taxa mínima de IVA dos nutrientes que estejam cientificamente comprovados como necessários ao reforço do nosso sistema imunológico.
Aprender com a actual situação e preparar melhor o futuro é decisivo para este combate. Os portugueses em geral e aqueles que estão na primeira linha de combate merecem o nosso louvor e serão sempre o melhor exemplo que podemos dar.”
3. Defesa do emprego
Pedro Filipe Soares, BE
“Perante a crise económica que se abre diante de nós, a prioridade tem de ser a defesa do emprego. Impedir os despedimentos e reintegrar os trabalhadores que foram despedidos desde o início da crise é o que protege agora o rendimento das famílias e, com isso, a economia do país.
Esta é uma medida que defende os trabalhadores, recuperando do desemprego os milhares de precários que foram entretanto despedidos, dando garantias sobre o seu futuro imediato. Mas é, também, uma medida fundamental para a economia, porque assegura o funcionamento do mercado interno num momento em que as relações económicas internacionais estão brutalmente reduzidas e há muitos bens essenciais que temos de passar a produzir.
A retoma económica será tão mais capaz quanto mais tivermos conseguido manter a nossa capacidade produtiva. Cada emprego protegido hoje será menos um desempregado por resgatar amanhã. A sensatez levou a que esta medida tenha sido implementada em países como Espanha ou Itália. O tempo urge e Portugal deve fazê-lo agora.”
4. Fim do estado de emergência
João Oliveira, PCP
“Há muita gente a fazer confusão entre medidas de combate à epidemia e estado de emergência, mas são duas coisas diferentes.
As medidas de contenção foram decididas antes e à margem do estado de emergência. O distanciamento social, a lavagem ou desinfecção das mãos, a redução das saídas de casa ou o encerramento das escolas são medidas que terão de manter-se para lá do fim do estado de emergência e que só podem ser levantadas de forma gradual.
O estado de emergência não era necessário para as medidas que foram tomadas e foi desproporcional porque os portugueses cumpriram-nas de forma generalizada.
No entanto, o estado de emergência tem servido de pretexto para despedimentos abusivos, cortes de salários, imposição de férias forçadas, imposição de bancos de horas e outras violações dos direitos dos trabalhadores.
E tem servido também os grandes grupos económicos que transformaram o combate à epidemia num negócio chorudo e se apropriam de recursos públicos (como acontece com as verbas do layoff).
Pôr fim ao estado de emergência não significa pôr fim às medidas de contenção que devem continuar a ser cumpridas, significa travar todos esses abusos e arbitrariedades que arruínam a vida dos trabalhadores e comprometem o futuro do país.”
5. Passaportes imunitários
Telmo Correia, CDS
“A ideia que se segue é muito óbvia: preparar o regresso a uma vida mais normal, pôr a economia a funcionar e os portugueses a selectivamente poderem sair para as suas actividades. Para isso, mais do que uma boa ideia é essencial garantir que existem condições e indicações para um uso de máscaras e que estas estejam disponíveis bem como as soluções alcoólicas. A avaliação só possível através da massificação de testes, do nível de imunidade da população instituindo um sistema de ‘passaportes imunitários’. E a garantia de protecção dos mais frágeis. Melhor ideia ainda era uma vacina, mas isso não depende de nós.”
6. Novo modelo de desenvolvimento
Inês Sousa Real, PAN
“É difícil imaginar como estaremos daqui a um mês, quando dias antes de surgir este surto não imaginávamos que pudéssemos ser atingidos por uma crise desta dimensão.
A crise que vivemos, além do impacto na nossa saúde, repercute-se em múltiplas dimensões, como a económica, social, laboral e até ecológica. Se antes da covid-19, além de um orçamento excedentário e de uma economia em recuperação, traçávamos planos para o cumprimento de objectivos tão relevantes para as diferentes esferas da nossa vida, como os da Agenda 2030 ou da descarbonização, hoje podemos ter pela frente uma das maiores recessões da história.
Precisamos de políticas corajosas e solidárias, tanto ao nível interno como da união europeia, que coloquem as pessoas e o respeito pelo planeta (e todas as espécies que nele habitam) no topo das prioridades, assente em opções orçamentais que, evitando a austeridade, captem recursos junto de interesses instalados.
Se há ideia que podemos preservar para daqui a um mês é da necessidade de garantir um novo modelo de desenvolvimento, assente numa economia mais justa e sustentável, rejeitando a lógica de produção voraz até aqui prosseguida.”
7. Reflectir sobre imoralidades
José Luís Ferreira, PEV
“Se tudo correr bem, e nós esperamos que sim, o mês de Maio poderá representar o início de uma longa caminhada, com vista ao regresso à normalidade. Uma caminhada que se adivinha longa e que o bom senso recomenda que seja progressiva e cautelosa.
Mas a dimensão desta caminhada também está muito dependente da forma como o Governo conseguir dar resposta a problemas que persistem. Desde logo, a onda de despedimentos que se está a verificar, com algumas empresas, sobretudo as grandes, a aproveitarem a situação para despedir e despedir. Mas também é urgente retirar dos bancos o poder discricionário de decidir que empresas podem aceder às linhas de crédito, mesmo quando reúnem os requisitos legais, obrigando muitas MPME ao encerramento. São necessárias respostas para os agricultores que não conseguem escoar os seus produtos. É também destas respostas que dependerá o tamanho da caminhada que poderá começar em Maio. Mas, Maio também deveria representar o início de uma reflexão sobre a forma como produzimos, consumimos e vivemos, de reequacionar a importância do papel do Estado na economia, de avaliar as PPP, os paraísos fiscais ou outras imoralidades que nos fomos habituando a aceitar.”
8. Uma estratégia para testes
João Cotrim de Figueiredo, IL
“De entre as várias prioridades imediatas, destacaríamos a necessidade de uma estratégia de longo prazo de testes, tanto virológicos como serológicos. É essencial definir quem, quando, como e em que situações alguém vai ser testado e com que tipo de testes.
Sem uma estratégia de testes não é possível proteger os profissionais de saúde e todos os outros portugueses que asseguram os serviços essenciais. Também não será possível programar a capacidade do sistema de saúde para continuar a tratar dos doentes quer nesta fase, quer em possíveis vagas posteriores da epidemia.
Sem testes é impossível gerir o regresso à actividade económica e à vida social, dando às pessoas a necessária confiança de que os riscos que correm são controlados. Só os testes permitem tomar decisões informadas sobre a reabertura de escolas, de empresas, de fronteiras, de estabelecimentos comerciais ou de actividades lúdicas e desportivas. Todas estas decisões são importantes, todas estão relacionadas entre si. Os pais que não trabalham porque a escola dos filhos está fechada ou porque a sua empresa teve um trabalhador infectado, são as mesmas pessoas que não terão rendimentos para frequentar restaurantes, assistir a um espectáculo, assistir ou praticar desporto ou viajar no país.
Portugal continua muito longe de ter uma estratégia de testes e a falta de transparência nesta matéria tem sido a regra desde o início da crise. Recordamos a confusão inicial sobre o número de testes disponíveis e o número de testes realizados, depois sobre a escassez de zaragatoas ou de reagentes. Actualmente, seis semanas depois do primeiro caso confirmado, o Governo não fez qualquer esforço para aumentar o número de termocicladores nos laboratórios, nem evidencia interesse em constituir stock de testes virológicos multiplex que aumentariam a capacidade de testar para o triplo. Já quanto aos testes serológicos, estamos ainda mais atrasados. Apesar das múltiplas insistências da Iniciativa Liberal, tudo o que está previsto é um teste-piloto (!) para Maio.”
9. Reabrir o país, com confiança
André Ventura, Chega
“Os portugueses foram os reais heróis deste primeiro mês de estado de emergência, cumprindo à risca o determinado pelo Governo, mostrando grande espírito de sacrifício em prol do seu bem e do bem comum.
Porém, as altas esferas do Estado não darão o exemplo, quando deviam ser as primeiras a fazê-lo. Pediram aos cidadãos que celebrassem a Páscoa em casa, longe da família, mas vão celebrar o 25 de Abril no Parlamento, juntando centenas de pessoas num espaço fechado.
O Chega continuará a apoiar o Governo nas medidas de prevenção e da retoma da economia que sejam eficazes e que não atentem contra os direitos dos cidadãos.
O próximo mês será de desafios e é fundamental que o executivo conte com a oposição que, porém, não pode desistir de o escrutinar. A democracia não está suspensa.
Agora é tempo de reabrir o país, com confiança, para que não tenhamos de voltar atrás nestas medidas, tal como sucedeu em Singapura.
As empresas e as famílias precisam de sentir que o Estado é seu parceiro e não apenas um cobrador de impostos que se esquece de pagar as suas próprias dívidas aos seus concidadãos.”
10. Estatuto de profissão essencial
Joacine Katar Moreira, não-inscrita
“As restrições impostas não serão todas levantadas no próximo mês para continuarmos a fazer face à emergência sanitária, o que faz todo o sentido. O último mês foi catastrófico para muitas pessoas e famílias que viram os seus empregos destruídos, os seus pequenos negócios em baixa e as diferentes situações de emergência social e económica fazem-se sentir de forma bastante visível.
As condições de confinamento mostram-nos desigualdades gritantes, a exclusão de trabalhadores informais e precários, a exclusão digital de estudantes, condições de habitabilidade impróprias e indignas de muitas famílias e cidadãos, a necessidade do Estado de tomar para si o cuidado da população idosa, de investir em e reforçar o SNS e nos seus profissionais, mas também de tomar para si entidades que foram privatizadas como os CTT, por exemplo. Todos percebemos hoje que as pessoas socialmente mais vulneráveis correspondem às que mais estarão propensas a sucumbir em casos de pandemia viral e é fundamental garantirmos melhores condições de vida às mesmas.
A luta contra a covid-19, e será nisso que estarei focada nas próximas semanas, mostra-nos a necessidade imperiosa de reconhecermos as profissões essenciais à sociedade para garantir bens e serviços imprescindíveis e por isso apresentarei uma iniciativa legislativa para o reconhecimento do estatuto de profissão essencial, com complemento salarial fixo. Assim como também a recomendação ao Governo para o aumento do salário mínimo nacional em sede própria, a fixação de tectos para rendas de casa, que reverta a especulação absurda a que estas foram sujeitas, e apoios para micro e pequenas empresas.”