É preciso redefinir o conceito de urgência dentária
Testemunho de Hugo Madeira, médico dentista. “Como reflexo das dificuldades que enfrentamos na aquisição de material médico de proteção individual, surgem os primeiros casos de pacientes que viram negada a sua urgência noutras clínicas, por estarem com rutura de stock.”
Os médicos dentistas estão, segundo alguns estudos, no topo das profissões de risco devido à produção de aerossóis, sendo o risco de contaminação no exercício profissional muito elevado, o que resultou nesta pausa na medicina dentária, para proteção do paciente e dentista. Estas são medidas excecionais, considerando que o gabinete clínico é um local seguro, de acordo com os protocolos para infeção cruzada que são muito rigorosos.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Os médicos dentistas estão, segundo alguns estudos, no topo das profissões de risco devido à produção de aerossóis, sendo o risco de contaminação no exercício profissional muito elevado, o que resultou nesta pausa na medicina dentária, para proteção do paciente e dentista. Estas são medidas excecionais, considerando que o gabinete clínico é um local seguro, de acordo com os protocolos para infeção cruzada que são muito rigorosos.
Enquanto atravessamos aquela que será a maior crise dos nossos tempos, muitos são os desafios. Por indicação da Ordem dos Médicos Dentistas, as clínicas encontram-se encerradas e apenas disponíveis para casos urgentes e inadiáveis; é realizada uma pré-triagem telefónica que permita a admissão da urgência, caso se qualifique como tal. Estamos adicionalmente a realizar telemedicina, em que o paciente poderá comunicar diretamente com o seu dentista.
No entanto, apesar do cumprimento rigoroso dos protocolos, é imperativo pensar nas consequências que poderão resultar a nível de saúde oral. Visto que a urgência permite, por exemplo, controlar a dor dentária de origem infecciosa, mas o tratamento e a restauração do mesmo são fundamentais para manter a sua viabilidade, evitando a perda do dente. Torna-se uma preocupação o período em que iremos estar sob estas condições, sendo necessário redefinir o conceito de urgência, uma vez que alguns tratamentos não podem ficar interrompidos por tempo indeterminado.
Como reflexo das dificuldades que enfrentamos na aquisição de material médico de proteção individual, surgem os primeiros casos de pacientes que viram negada a sua urgência noutras clínicas, por estarem com rutura de stock. Este é um problema que se prende com a necessidade de mais fornecimentos mínimos para tratar todas as urgências.
Desde que a clínica interrompeu o seu normal funcionamento, temos vindo a facultar online toda a informação útil e fidedigna aos pacientes, para a sua segurança e para que estejam devidamente informados e conscientes de que nós, equipa clínica, estamos do lado deles a acompanhar a evolução desta situação, até que possamos voltar à normalidade. É natural que o regresso ao funcionamento da medicina dentária venha acompanhado de algum receio por parte dos pacientes, que têm vindo a ser muito compreensivos com as condições de funcionamento atuais, respeitando a triagem de urgências e cumprindo os protocolos de segurança. Sabemos que no futuro serão necessárias condições de atendimento diferentes.
É natural que haja algum receio nos pacientes de regressar a uma clínica dentária. Por isso, tenho tentado manter a proximidade entre a minha equipa clínica e os pacientes, para que a relação de confiança que temos vindo a construir ao longo do tempo se mantenha durante o isolamento e, especialmente, após voltarmos a funcionar, numa normalidade que terá como prioridade o rigor e a segurança dos profissionais e dos doentes.
Por outro lado, de acordo com os últimos dados da OMD, a maioria dos dentistas está em regime de recibos verdes, que implica a remuneração mediante prestação de serviços nas respetivas clínicas, e que não são abrangidos pelo regime layoff empresarial ou qualquer outro subsídio. Quer para estes profissionais liberais quer para outros, não existem quaisquer medidas de apoio. Como eu, existem dentistas empresários que dependem do regime de layoff para garantir a subsistência das suas empresas, o que implica um grande esforço financeiro, de forma a garantir a manutenção de postos de trabalho. As medidas atuais não me parecem suficientes; os profissionais de saúde oral necessitam de maior apoio do Estado, sendo que os ativos das clínicas são os serviços que as mesmas apresentam. É expectável que sejam encerradas clínicas ou se encaminhem para uma situação de contração de dívida pós-pandemia. Sem apoios, como sobrevive uma empresa em tempos de crise?
É fundamental que se criem condições para relançar a profissão, com os devidos ajustes no funcionamento do pré e pós-consulta, que reforcem ainda mais a segurança dos pacientes e dos dentistas.
Na minha clínica, os médicos dentistas em quarentena encontram-se totalmente disponíveis para o esclarecimento de dúvidas e acompanhamento dos pacientes. Estamos expectantes quanto ao nosso regresso, que vai decorrer de forma gradual e cuidadosa, priorizando a segurança e a saúde dos nossos pacientes. Estes dias são também de reflexão sobre um regresso que esperamos breve, de forma a garantirmos uma experiência cada vez melhor a quem recebemos na nossa clínica. Uma das minhas missões diárias é manter a confiança dos meus pacientes.