Plataformas de ensino à distância são um risco para os alunos e podem afectar o seu futuro, diz comissão de protecção de dados
Comissão Nacional de Protecção de Dados traça um retrato assustador dos riscos apresentados por plataformas electrónicas utilizadas no ensino à distância e apela a que estas sejam previamente analisadas por peritos.
As plataformas electrónicas utilizadas no ensino à distância têm capacidade para gerar perfis automáticos dos alunos, com informação sobre as suas “aptidões intelectuais e dados de saúde”, que, a prazo, podem “estigmatizar as crianças e jovens, prejudicando a sua integração na sociedade e no mundo laboral”. O alerta é da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), que nesta semana publicou um conjunto de “orientações para utilização de tecnologias de suporte ao ensino à distância” com o objectivo de minimizar os riscos da sua utilização, que irá prolongar-se até ao final do ano lectivo.
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As plataformas electrónicas utilizadas no ensino à distância têm capacidade para gerar perfis automáticos dos alunos, com informação sobre as suas “aptidões intelectuais e dados de saúde”, que, a prazo, podem “estigmatizar as crianças e jovens, prejudicando a sua integração na sociedade e no mundo laboral”. O alerta é da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), que nesta semana publicou um conjunto de “orientações para utilização de tecnologias de suporte ao ensino à distância” com o objectivo de minimizar os riscos da sua utilização, que irá prolongar-se até ao final do ano lectivo.
Estas orientações constituirão mais um desafio para as escolas que, devido à actual pandemia, se viram obrigadas, de um dia para outro, a transformar aulas presenciais em ensino à distância. Aliás é a própria CNPD a reconhecer que a generalidade dos estabelecimentos de ensino “não dispõe de recursos técnicos” para proceder à avaliação de cada uma das plataformas, “de forma a identificar correctamente os riscos para a privacidade e permitir que sejam adoptadas medidas mitigadoras”.
Sendo que esta avaliação prévia é uma das principais recomendações que constam do novo documento da CNPD, onde se informa que aquela análise “pode ser feita pelas entidades que disponibilizam e gerem as plataformas”. Mas que esta que será sempre uma tarefa em aberto já que “as evoluções tecnológicas e sociais podem representar novos riscos e devem ser tidas em conta durante o tratamento de dados, podendo exigir avaliações de impacto subsequentes”.
A CNPD alerta que o “risco de utilização descontextualizada” da informação recolhida pelas plataformas “não deve ser descurado”, salientando que o perigo principal está relacionado “com o tratamento de informação que diz respeito à vida privada dos utilizadores, sejam eles os professores, sejam os alunos”. Com muitos milhões de alunos em casa, devido à pandemia covid-19, estes danos colaterais do ensino à distância têm sido alvo de debate em vários países.
Por cá chegou agora pela mão da CNPD, apesar de nas redes sociais já existirem alertas vários. A comissão chama a atenção para o facto de que os riscos se acentuam quando “os alunos são crianças e jovens, por força da sua maior vulnerabilidade, da sua menor consciência dos riscos e ainda do impacto decorrente da recolha, conservação e análise de dados pessoais ao longo de um extenso período de tempo, com potenciais reflexos na sua vida adulta”.
Através das plataformas electrónicas, “são geralmente recolhidos dados como as imagens dos utilizadores e do ambiente em que se encontram, os relativos às declarações proferidas pelos participantes, seja por captação de som, seja por messaging”, enumera a CNPD. A informação não se fica por aqui já que “também podem ser recolhidos dados de outros indivíduos presentes no ambiente em que os utilizadores se encontram, que podem ser também eles crianças (filhos dos professores, irmãos dos alunos).”.
Por outro lado, “além dos dados directamente fornecidos pelos utilizadores e participantes, são ainda observados dados pessoais, tais como o número de acessos à plataforma, horas de acesso à plataforma, nível de participação nas actividades, dos quais é dedutível nova informação sensível dos utilizadores destas”, permitindo a criação dos tais “perfis individualizados”.
Perturbações são identificadas
Nesses perfis é feita também a “análise e previsão de aspectos relacionados, nomeadamente, com aptidões intelectuais, aptidões profissionais, traços de personalidade, desempenho profissional e mesmo com a saúde dos utilizadores”. Ora, frisa a CNPD, isto é “especialmente evidente nas plataformas que disponibilizam conteúdos pedagógicos especificamente adequados para cada utilizador, que se traduzem na tomada de decisões automatizadas assentes em sistemas de inteligência artificial que analisam o comportamento e desempenho dos alunos (learning analytics)”.
Acresce que certas plataformas “são programadas para efectuar análise preditiva, baseada no desempenho dos alunos, também com o propósito de identificar situações de dislexia, distúrbios do espectro do autismo, deficiência intelectual, hiperactividade, distúrbios de atenção, de memória, de percepção, de linguagem ou de interacção social ou outras perturbações dedutíveis em ambiente de aprendizagem”.
Na impossibilidade de evitar todos estes perigos, a CNPD remete para aquele que é o princípio de base da regulamentação europeia sobre protecção de dados: “a minimização de danos”. O que passa também por se escolher plataformas com “finalidades bem definidas e compatíveis com o ensino à distância” e que apenas recolham e tratem “os dados estritamente necessários para as finalidades especificadas”.
E ainda por zelar para que “os professores consigam identificar as correctas configurações para garantir que não decorrem riscos para a privacidade dos utilizadores, com especial enfoque nos alunos” ou por coisas mais simples como esta. “Sempre que possível, deve optar-se por tecnologias que impliquem a menor exposição possível do titular e do seu ambiente familiar (por exemplo fóruns de discussão por oposição a videoconferência)”.