Começaram a sair os primeiros presos das cadeias
Como muitos reclusos não moram no concelho da cadeia, os serviços prisionais passaram-lhes um comprovativo para poderem circular.
Começaram a sair este sábado das cadeias os primeiros presos abrangidos pelo regime decretado pelo Governo para proteger os reclusos da infecção por coronavírus. Segundo dados dos Conselho Superior da Magistratura, até às 17h deste sábado foram libertados 240 reclusos, estimando-se que até ao final do dia esse número ainda viesse a subir.
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Começaram a sair este sábado das cadeias os primeiros presos abrangidos pelo regime decretado pelo Governo para proteger os reclusos da infecção por coronavírus. Segundo dados dos Conselho Superior da Magistratura, até às 17h deste sábado foram libertados 240 reclusos, estimando-se que até ao final do dia esse número ainda viesse a subir.
Ao todo, e pelas informações fornecidas esta semana ao Parlamento pela ministra da Justiça, Francisca van Dunem, serão libertadas até 2000 pessoas, mas estimativas do próprio Ministério da Justiça fazem subir este número até aos 2246 reclusos. Seja como for, isto não inclui ainda os indultos que o Presidente da República irá decretar pelo mesmo motivo, processo que está mais atrasado e que terá como alguns dos principais critérios a idade e o estado de saúde dos presos que vierem a pedir clemência a Marcelo Rebelo de Sousa. O Ministério da Justiça tinha fixado os 65 anos como idade mínima para ser indultado. O grupo parlamentar socialista tinha apresentado uma proposta para a aumentar para 70, que foi porém rejeitada.
Já o perdão decidido pelo Governo, e que abrangerá os tais 2246 reclusos, destina-se a pessoas que estão a cumprir os dois últimos anos de pena ou que estão presas por crimes menores, e às quais foram decretadas penas com uma duração máxima de dois anos.
Quem cometeu considerados hediondos, como homicídio ou abusos sexuais, manter-se-á preso, o mesmo sucedendo com quem está a cumprir pena por corrupção. Os delitos praticados por políticos ou representantes do Estado em exercício de funções também estão excluídos, tal como acontece com a violência doméstica.
A sair das cadeias estão ainda reclusos aos quais foi dada uma saída precária de 45 dias, que em circunstâncias normais não dura mais de três. Estes presos estão proibidos de sair de casa praticamente em todas as circunstâncias, período ao fim do qual poderão ou não ter de regressar à prisão. Caso voltem, serão sujeitos a uma quarentena de 14 dias atrás das grades. O Governo decidiu que esta licença de saída pode ser renovada por mais de uma vez e por períodos igualmente de mês e meio, em função do comportamento do recluso e do contexto sanitário decorrente da pandemia. O tempo passado em casa conta para efeitos de cumprimento de pena.
O director-geral da Reinserção e serviços prisionais, o procurador Rómulo Mateus, confirmou ao PÚBLICO que as libertações estão a ter lugar desde este sábado de manhã, à medida que os tribunais de execução de penas vão deixando pronto o expediente necessário. É por exemplo o caso da cadeia de Custóias, em Matosinhos.
Como muitos reclusos não moram no concelho da cadeia, os serviços prisionais passaram-lhes um comprovativo para poderem circular, uma vez que é obrigatório o recolhimento em casa até ao próximo dia 13 por causa da pandemia covid-19, explicou o mesmo responsável. “Aqueles que não tiverem transporte para chegarem a casa sairão na terça-feira”, acrescentou Rómulo Mateus.
Segundo dados do Conselho Superior da Magistratura, até às 17h deste sábado foram libertados 240 reclusos, estimando-se que até ao final do dia esse número ainda viesse a subir. O presidente do Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional, Jorge Alves, critica a forma no seu entender apressada como está a ser feita esta libertação e dá alguns exemplos: “Como não tinham medicamentos suficientes para todos os que vão sair por 45 dias, as farmácias dos estabelecimentos prisionais estão a dispensar-lhes medicação apenas por uma semana, passando-lhes receitas para o restante tempo. Mas como estes reclusos têm a obrigação legal de ficarem em casa, se quiserem sair para ir à farmácia vão ter de pedir autorização para o fazerem aos serviços prisionais”. Também não havia nos cofres das cadeias dinheiro suficiente para lhes entregar, acrescenta.
“Foi tudo feito em cima do joelho pelo director-geral dos serviços prisionais para não deixar mal o Governo”, resume o dirigente sindical, acrescentando que na cadeia de Izeda, em Bragança, quatro dos 20 reclusos que podiam ser libertados preferiram ficar atrás das grades, por não querem sujeitar-se aos 14 dias de quarentena em caso de regresso.
À saída da cadeia de Custóias, onde o esperava a família, o feirante André Maia, de 29 anos, foi um dos que saíram mais cedo do que esperavam. Não que a pena fosse longa: ser apanhado a guiar sem carta custou-lhe quatro meses lá dentro, metade dos quais já passaram. O ambiente dentro de muros ficou diferente desde que se soube que alguns iam poder ir-se embora antes do tempo, descreve: “Quem ia sair ficou satisfeito, claro, mas os colegas a cumprir oito ou dez anos, por assaltos e droga, ficaram tristes, porque vão ter de ficar”.
Agora que as feiras estão suspensas, André Maia, que tem mulher e filhos, ainda não decidiu o que vai fazer à vida. “Tenho de pensar no dia-a-dia”, responde, antes rumar a casa, em São Mamede de Infesta.