Covid-19: livrarias de BD viram-se para vendas online
Dias “seguidos a zeros” na facturação e o encerramento da maior distribuidora norte-americana de BD preocupam livreiros especializados em banda desenhada.
As livrarias portuguesas de banda desenhada vivem dias de sobressalto, com portas fechadas, a reforçar as vendas online e preocupadas com o fecho da maior distribuidora norte-americana de BD, como contam três livreiros à agência Lusa.
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As livrarias portuguesas de banda desenhada vivem dias de sobressalto, com portas fechadas, a reforçar as vendas online e preocupadas com o fecho da maior distribuidora norte-americana de BD, como contam três livreiros à agência Lusa.
“É inegável que estamos de porta fechada desde o dia 18 de Março e que a quebra de facturação foi brutal, são dias seguidos a zeros. [...] Está tudo a acontecer ao mesmo tempo. É viver um dia de cada vez”, afirma Paulo Costa, da BD Mania, em Lisboa, a propósito das restrições provocadas pela pandemia da covid-19.
Situada no Chiado, com uma renda mensal a rondar os dois mil euros, a BD Mania subsiste agora com vendas por correio e respondendo a um sistema de assinatura com a qual já funcionava habitualmente, com clientes mais ou menos regulares.
Apesar de venderem livros de autores portugueses e obras europeias, o grande foco da BD Mania é a banda desenhada norte-americana e o acesso a ela depende da distribuidora Diamond, monopolista na distribuição de comics dentro e fora dos Estados Unidos.
A empresa, que distribui “gigantes” como a Marvel e a DC Comics, anunciou há dias o fecho de actividade por causa da pandemia da doença covid-19, afectando as milhares de livrarias especializadas em todo o mundo que dela dependiam, incluindo portuguesas.
“O que [a Diamond] nos comunicou é que não está com previsões de pensar em abrir a curto e a médio prazo. Presumimos que o mercado vai ter de se adaptar e as editoras vão ter que repensar a sua distribuição e pôr os livros a circular”, explicou Paulo Costa.
Acabado de receber a última remessa mensal de encomendas dos Estados Unidos, o livreiro da BD Mania teme que “de um momento para o outro deixe de ter o que vender”.
Mário Freitas, fundador da editora e livraria Kingpin, em Lisboa, também sublinha esse problema da distribuidora “a montante”, porque significa deixar de receber novidades em inglês por um tempo indeterminado. “Pode levar a uma transformação completa do modelo de distribuição e pode demorar. Estamos numa incógnita e numa certa ansiedade. Não é uma catástrofe, mas não é nada de muito animador”, afirma à Lusa.
Tal como a BD Mania, a Kingpin também está a vender apenas online, com Mário Freitas a trabalhar na livraria e dois outros trabalhadores em regime laboral em casa. Apesar de as vendas online terem subido, vendendo BD e merchandising, Mário Freitas calcula que em Março tenha tido uma quebra de cerca de 40% na facturação.
Este tempo de estado de emergência fá-lo lembrar a crise de há dez anos, com retracção de consumo.
Sobre os próximos meses, o livreiro tenta fazer cálculos a curto prazo, “até final de Setembro”, e aponta baterias para a Comic Con, a convenção internacional dedicada à BD, jogos e entretenimento que está marcada para Setembro no Passeio Marítimo de Algés (Oeiras).
“É fundamental que haja a Comic Con. Mexe muito, de todos os pontos de vista. Se vai haver e em que circunstâncias, é o que falta saber”, diz Mário Freitas.
Em Coimbra, a livraria de BD Dr. Kartoon faz contas às despesas desde que fechou portas em Março e espera reabri-las em Maio, porque “não dá para ficar eternamente fechados em casa”, conta o livreiro João Miguel Lameiras.
“Março não foi trágico, porque estivemos abertos meio mês e tivemos o festival de BD em Coimbra. Facturámos um bom mês e deu para equilibrar um bocado as coisas. No mês de Abril vamos estar fechados e acredito que as encomendas por correio se tornem mais complicadas”, lamenta.
Segundo João Miguel Lameiras, as vendas pela Internet não compensam o que vendem habitualmente em loja e calcula que este micro-negócio se aguente pouco tempo nestes termos, mesmo tendo apenas dois sócios-funcionários. “Não há os custos inerentes a uma livraria com mais empregados. Nesse aspecto é mais fácil aguentar um mês ou dois, mas não dará para aguentar muito mais”, sublinha.
O livreiro explica ainda que não está tão dependente da distribuidora norte-americana Diamond como a BD Mania e a Kingpin, porque o catálogo abrange também muita produção europeia, em particular franco-belga e portuguesa.
Com o cancelamento ou adiamento de eventos como a Feira do Livro de Lisboa e o Festival de Banda Desenhada de Beja, João Miguel Lameiras espera “alguma pequena normalização ainda durante o Verão”. “O problema é se as coisas se mantêm abertas ou se há o risco de fechar outra vez. Se [a pandemia] afectar o Natal, aí é que seria trágico”, afirma.