Curry Cabral: administração admite cancelar transferência de doentes hepáticos
O director da Área Cirúrgica e Transplantação e responsável da Cirurgia, Geral do Hospital Curry Cabral confirma ter apresentado a demissão, mas o conselho de administração diz que desconhece esse facto.
A evolução da covid-19 “bem mais lenta e controlada” do que aquilo que se esperava poderá levar ao cancelamento da transferência do Centro Hepato-bilio-pancreático e de Transplante (CHBPT) do Hospital Curry Cabral para outra unidade do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (CHULC), disse ao PÚBLICO fonte desta estrutura. Esta informação surge depois de o director da Área Cirúrgica e Transplantação e responsável da Cirurgia, Geral, Américo Martins, ter apresentado a demissão de funções, por não ter sido acolhida a proposta que apresentou para que o CHBPT pudesse manter-se no Curry Cabral, num circuito independente da área covid-19. O CHULC diz desconhecer o pedido de demissão.
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A evolução da covid-19 “bem mais lenta e controlada” do que aquilo que se esperava poderá levar ao cancelamento da transferência do Centro Hepato-bilio-pancreático e de Transplante (CHBPT) do Hospital Curry Cabral para outra unidade do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (CHULC), disse ao PÚBLICO fonte desta estrutura. Esta informação surge depois de o director da Área Cirúrgica e Transplantação e responsável da Cirurgia, Geral, Américo Martins, ter apresentado a demissão de funções, por não ter sido acolhida a proposta que apresentou para que o CHBPT pudesse manter-se no Curry Cabral, num circuito independente da área covid-19. O CHULC diz desconhecer o pedido de demissão.
Américo Martins foi o responsável pela proposta apresentada ao conselho de administração do CHULC para que o centro de referência se mantivesse no Curry Cabral, através da criação de um circuito independente que impedisse o contacto com os doentes tratados na zona dedicada à covid-19. E é o próprio que confirma ao PÚBLICO ter apresentado, esta quarta-feira, a demissão das funções que exercia. A razão, adiantou, prende-se com o facto de a proposta referente ao CHBPT não ter tido uma resposta favorável por parte da administração. “Estamos a falar de fechar uma porta e mudar a zona de acolhimento dos doentes com covid-19, algo que se fazia em duas horas. Não sei por que não aceitam isto, ou é teimosia ou falta de competência”, disse ao PÚBLICO Américo Martins.
Na proposta enviada aos responsáveis do CHULC, na passada segunda-feira, o médico até admitia a possibilidade da transferência do centro para o Hospital de Santa Marta, mas colocava a responsabilidade dessa decisão exclusivamente nas mãos da administração, por considerar que esta unidade não tem condições para receber o centro de referência. Esta quinta-feira explicou o que significa com essa falta de condições: “Tenho 18 camas atribuídas em Santa Marta e eu tenho 30 doentes para transferir. Onde é que os vou pôr? E ocupando as camas todas, como opero? Se me aparecer uma jovem de 20 anos com falência hepática fulminante ou morre ou vou ter de a transferir para Coimbra ou o Porto”, disse.
Contactada pelo PÚBLICO fonte do CHULC diz que “a administração desconhece qualquer intenção de demissão da parte de qualquer médico ou dirigente do centro hospitalar”. E acrescenta que a decisão anunciada de transferir o centro de referência do Curry Cabral poderá nem sequer vir a realizar-se. “A covid-19 está a evoluir de forma bem mais lenta e controlada do que se estava a prever, por isso, pode dar-se o caso de nem sequer ser necessário transferir o serviço para o Santa Marta. Perante tal cenário, que o próprio doutor Américo Martins conhece, menos razão há para qualquer atitude da parte dele”, diz.
O médico não acha que assim seja. Reiterando que a demissão foi entregue, e que a mantém, Américo Martins afirma que a possibilidade de o CHBPT se manter no Curry Cabral “não é suficiente” para o sossegar e à restante equipa médica que, garante, o apoia nesta questão. “O hospital vai ter de qualquer forma internamento de doentes com covid-19 e é necessário o tal circuito independente que propomos, para garantir a segurança de toda a gente”, afirma.
Américo Martins garante que todos os doentes e pessoal do CHBPT foram testados para a covid-19, com resultados negativos, e que é essencial que assim se continue.
Nesta quinta-feira, o corpo clínico do CHBPT escreveu uma carta aberta ao conselho de administração do CHULC, em que expressa “a total solidariedade” com a decisão de Américo Martins em apresentar a demissão.
No documento, a que o PÚBLICO teve acesso, insiste-se que “o Hospital de Santa Marta não apresenta as condições mínimas para receber um centro com as características e necessidades do CHBPT do Hospital de Curry Cabral” e que é possível criar “circuitos independentes” dentro desta unidade de saúde, “sem necessidade de quaisquer obras”.
O corpo clínico do CHBPT deixa um apelo “às entidades competentes” para que estas intercedam “junto da tutela para evitar o desmantelamento de um dos maiores centros de referência do país e da Europa”.
O CHULC tinha anunciado que quatro serviços do Curry Cabral seriam transferidos para outras unidades do grupo. Além do centro de referência, o serviço de Medicina Física e Reabilitação iria para o Hospital de Santo António dos Capuchos e dois serviços passariam a funcionar temporariamente no S. José: Ortopedia e Cirurgia Geral. O prazo para a mudança era o final desta semana.
Contudo, na conferência de imprensa diária, para apresentar a evolução da covid-19 em Portugal, o secretário de Estado da Saúde, António Lacerda Sales, disse que este não é o momento para falar da transferência de doentes do Curry Cabral para outros hospitais, garantindo que “essa questão [ainda] não se coloca”.
“Tem havido um plano do ponto de vista organizacional, feito de acordo com a evolução do próprio surto. Nesta fase ainda não se põe nenhuma questão de que outros serviços sejam transferidos para quaisquer outros hospitais”, afirmou. Frisando que ainda esta noite se realizou um transplante no Curry Cabral, o responsável disse que o hospital “tem zonas bem diferenciadas e que os serviços mantêm a sua actividade.” Por isso, por enquanto, a única coisa que irá acontecer é ir analisando a evolução da covid-19 . “Essa questão só se colocará se, de acordo com a evolução do surto, vier a ser necessário. Se não vier a ser necessário, manteremos, como é óbvio, os serviços nos respectivos locais em que estão actualmente”, disse.
Notícia actualizada com informação do secretário de Estado e a carta aberta do corpo clínico.