Confinamento estimula as burlas digitais; MBWay é o mais comum

O Ministério Público alerta para burlas com o MBWay, mas outros métodos têm sido utilizados: MEO, EDP, CTT ou mesmo compras de materiais de protecção contra a covid-19 podem ser fraudulentos. “Consumidor português tem pouca literacia digital”, apontam especialistas.

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MBWay tem sido usado como veículo de burlas. Goncalo Dias

Mais tempo em casa, muitas horas ao computador e acesso facilitado a plataformas e compras digitais. Todas estas são consequências naturais dos tempos de confinamento domiciliário, mas são, também, veículos de estímulo a burlas e fraudes.

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Mais tempo em casa, muitas horas ao computador e acesso facilitado a plataformas e compras digitais. Todas estas são consequências naturais dos tempos de confinamento domiciliário, mas são, também, veículos de estímulo a burlas e fraudes.

Nos primeiros três meses de 2020 houve um aumento considerável em fraudes deste tipo, com o Portal da Queixa a registar 1377 reclamações, mais 34% do que no mesmo período de 2019.

Este aumento justifica-se pela forma como o confinamento domiciliário expõe, mais ainda, consumidores pouco informados às compras por aplicações e plataformas digitais.

Ministério Público preocupado com MBWay

Um caso concreto foi explicado pelo Ministério Público (MP), que lançou um alerta de cibercrime relacionado com a aplicação MBWay. Aponta para o “engano fraudulento provocado a muitas vítimas, por criminosos que, por esta via, pretendem obter ilícita e indevidamente valores monetários”.

Em causa está, sobretudo, a utilização de plataformas de venda online para escolha das vítimas. O MP explica que os vendedores de produtos são contactados por alegados compradores, que dizem querer pagar por MBWay.

Aí, existem dois caminhos: se a vítima conhece e domina a aplicação, o criminoso desiste da burla e desliga a chamada. Se a vítima desconhece o processo, então estará a abrir o caminho para a fraude.

O criminoso convence o vendedor a ir a uma caixa de multibanco e aderir ao MBWay, havendo, também aqui, dois caminhos possíveis: ou convence a vítima a colocar um determinado número de telemóvel no momento da adesão – número que pertence ao criminoso e que facilitará a burla – ou, caso a vítima insista em colocar o próprio contacto, então o criminoso alerta para a necessidade de ter acesso ao número em causa, bem como ao PIN, para que possa fazer o pagamento.

Por uma via ou por outra, o criminoso terá o número de telemóvel e o PIN MBWay da vítima, o que permite aceder à conta bancária e fazer transferências e levantamentos.

O MP reconhece que esta fraude “resulta da falta de conhecimento e da credulidade dos utilizadores”, recomenda “atenção redobrada perante a abordagem de estranhos que queiram proceder a pagamentos por via da aplicação MBWay” e aconselha que “nunca forneçam a desconhecidos dados dos seus cartões bancários, não aceitando nunca associar estes a números telefónicos de desconhecidos”.

Problema não está nas apps, está no desconhecimento

Para além das burlas pelo MBWay – que lideram a estatística do Portal da Queixa –, o organismo destaca outras fraudes comuns: sms e e-mails fraudulentos em nome dos CTT, pedidos para pagamento imediato de dívidas à EDP ou à MEO e passatempos em nome da Worten ou Continente.

Em tempos de combate à covid-19, também a compra de materiais de protecção contra o vírus tem sido utilizada como mecanismo de burla. O Portal considera que “não é aconselhável a compra destes produtos em sites que não apresentem as mínimas garantias de idoneidade na entrega e no preço praticado”.

Tito Rodrigues, jurista da DECO, explica que o problema não são as aplicações digitais em si, mas o saber usar aplicações deste tipo. Se souberem, “dificilmente serão enganadas”.

“A palavra de ordem é desconfiar. Dizemos sempre que o que se deve fazer é ler bem o texto, procurar por erros ortográficos, desconfiar de traduções muitas vezes mal feitas e nunca clicar no link que é enviado”. “Se houver alguma curiosidade, o que se tem sugerido é que se copie esse endereço e se procure no Google”, detalhou, à TSF.

Pedro Lourenço, CEO do Portal da Queixa e embaixador da Comissão Europeia para os Direitos dos Consumidores, aponta o que poderá esperar-se nos próximos meses.

“Esta será, certamente, uma tendência crescente nos próximos tempos, tendo em conta a obrigação da permanência dos consumidores em casa, alterando assim o seu comportamento e hábitos de consumo, que direcciona o fluxo de compra para os canais digitais”, explicou, ao Portal da Queixa, traçando um perfil desconhecedor aos consumidores portugueses.

“Nesta matéria, infelizmente, os consumidores portugueses ainda detêm pouca literacia digital, tornando-os muito vulneráveis a estes esquemas de burla”.