O Bloco Central está vivo, mas não é uma aliança Rio-Costa
Não sei se esta espécie de guerra nos vai reconciliar com a política e com os políticos, mas pode ser uma boa oportunidade para isso.
O Bloco Central está vivo. Tão vivo quanto seria de esperar num momento como o que se vive hoje. Suficientemente vivo para não ser preciso falar em Governo de salvação nacional, no sentido da sua existência histórica, de um executivo gerado por iniciativa presidencial para responder a uma ruptura política.
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O Bloco Central está vivo. Tão vivo quanto seria de esperar num momento como o que se vive hoje. Suficientemente vivo para não ser preciso falar em Governo de salvação nacional, no sentido da sua existência histórica, de um executivo gerado por iniciativa presidencial para responder a uma ruptura política.
E quando digo que o Bloco Central está vivo não estou a referir-me às tréguas que Rui Rio anunciou em nome do combate à “calamidade pública” que é a pandemia de covid-19. O líder do PSD disse que o seu partido “apoia o Governo neste combate” e recusou ver no executivo adversário, mas também deixou claro que os sociais-democratas vão preparar uma task force para, no day-after, preparar um programa alternativo “de recuperação da economia nacional”. Não penso, como alguns têm escrito e dito, que o PSD esteja a ver nesta crise (que em primeiro lugar é sanitária, mas que depois será económica e até política) uma oportunidade para entrar num Governo com o PS.
Repito: o Bloco Central que existe não é uma aliança entre Costa e Rio. É uma parceria entre São Bento e Belém, entre António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa que, com as suas personalidades diferentes e os seus modos operantes distintos, têm em vista um objectivo comum. Não pensam o mesmo, como se percebeu aquando da primeira declaração do estado de emergência (o primeiro-ministro preferia esperar, ao contrário do Presidente), mas têm demonstrado respeito institucional e têm funcionado em dupla. Em bloco. Um é mais à esquerda, outro é mais à direita e essa é uma diversidade com a qual, à partida, podemos ganhar.
Além disso, vivendo Portugal num período em que a democracia não está suspensa mas muitas das suas regras estão — nunca pensei que viessem a ser proibidos de novo os ajuntamentos ou que a liberdade de circulação pudesse ser restringida — é conveniente termos chefes de Estado e do Governo que se entendam sem se anularem mutuamente e que se escrutinem sem se digladiarem.
Se a palavra-chave para fazer frente à crise sanitária é, como aqui escrevi há uma semana, “solidariedade”, há outra ideia que também é importante: estabilidade política. Mas isso não significa que a oposição deixe de fazer o seu trabalho ou que o Presidente deixe de ser o fiel da balança. Não. É tão importante que a oposição faça propostas construtivas, responsáveis e consequentes como que o Governo oiça os contributos que os outros partidos, além do seu, têm para dar. Todos têm (temos) de estar de olhos abertos.
Não sei se esta espécie de guerra nos vai reconciliar com a política e com os políticos, mas se houver espírito de missão e responsabilidade, se os portugueses se identificarem com as soluções encontradas, pode ser uma boa oportunidade para isso. E para aprendermos a distinguir aqueles que são acessórios, pelo seu populismo e pelo seu extremismo, dos que são essenciais.
Apesar de haver um certo optimismo nas minhas palavras, não ignoro os avisos que chegam do coração da Europa, onde há regimes que aproveitam a ocasião para reforçarem o poder das suas lideranças autocráticas e para ferirem de morte a democracia e a lei fundamental.