Juízes trabalham de casa, mas admitem dificuldades
Mais de 86% dos 390 magistrados que já responderam a um inquérito realizado pela Associação Sindical dos Juízes Portugueses dizem que se deslocaram pontualmente aos tribunais nas últimas duas semanas de Março
Noventa e sete por cento dos juízes dizem que estão a trabalhar a partir de casa, mas 70% afirmam demorar mais a realizar as tarefas remotamente do que em circunstâncias normais. A maioria é obrigada pontualmente a deslocar-se ao tribunal, principalmente para consultar processos. Isso mesmo mostram os resultados preliminares de um inquérito realizado pela Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) sobre a actividade judicial nas últimas duas semanas de Março, divulgado esta sexta-feira, em que já participaram 390 magistrados. Tal significa que responderam 18% do universo total de juízes, que é de 2118 profissionais.
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Noventa e sete por cento dos juízes dizem que estão a trabalhar a partir de casa, mas 70% afirmam demorar mais a realizar as tarefas remotamente do que em circunstâncias normais. A maioria é obrigada pontualmente a deslocar-se ao tribunal, principalmente para consultar processos. Isso mesmo mostram os resultados preliminares de um inquérito realizado pela Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) sobre a actividade judicial nas últimas duas semanas de Março, divulgado esta sexta-feira, em que já participaram 390 magistrados. Tal significa que responderam 18% do universo total de juízes, que é de 2118 profissionais.
O elevado números de juízes que trabalham remotamente só é possível, nota a ASJP no relatório com os dados preliminares, “uma vez que na maioria os processos se encontram desmaterializados e digitalizados nos sistemas Citius e SITAF e que a generalidade dos juízes dispõe de acesso aos sistemas”. Isto porque os magistrados judiciais possuem computadores portáteis com VPN, que permitem o acesso remoto aos sistemas informáticos da Justiça (o Citius nos tribunais comuns e o SITAF nos administrativos e fiscais).
Dois terços dos juízes que trabalharam remotamente consideraram a experiência “fácil” ou “muito fácil” e simultaneamente “rápida”. Quase 31% qualificou-a como “difícil/lenta” e 3,2% como “muito difícil/lenta”. Uma parte significativa sentiu uma evolução da experiência ao longo das duas semanas. “Depois de uma fase inicial de maior dificuldade no acesso aos processos, por causa do aumento repentino no número de juízes que utilizavam os meios de comunicação disponíveis, o sistema estabilizou e diminuiu substancialmente o reporte de impossibilidade ou lentidão das ligações”, lê-se numa nota que faz parte do relatório.
A esmagadora maioria (88%) considera que o facto de ter trabalhado remotamente não prejudicou a qualidade do seu trabalho. Já em relação à demora a percepção é bem diferente: 70% dos juízes acreditam que demoraram mais tempo do que teriam gasto em circunstâncias normais. As principais razões apontadas como causa de maior demora foram, por ordem decrescente de grandeza, a morosidade decorrente do facto de alguns processos (nomeadamente os criminais e os de insolvências) não estarem totalmente digitalizados, as dificuldades da ligação remota e ainda os constrangimentos familiares na residência. Este factor também é referido entre os 12% que consideram que o trabalho remoto teve impactos negativos na qualidade do resultado. Esta minoria, apontou como explicação para a redução da qualidade, por ordem decrescente de grandeza, a falta do processo físico para consulta, a falta de digitalização total do processo, constrangimentos familiares na residência e, por fim, problemas na ligação remota. As referências aos constrangimentos familiares não serão alheia ao facto de cerca de 60% dos juízes serem mulheres, um grupo que socialmente gasta uma maior parte do seu tempo em tarefas domésticas e no acompanhamento dos filhos menores.
Apesar da esmagadora maioria dos juízes estar a trabalhar em casa, mais de metade (52%) diz ter-se deslocado ao tribunal entre 16 e 29 de Março. Destes, a maioria fê-lo menos de cinco vezes. O principal motivo das deslocações foi a consulta de processos (103 num total de 198 respostas) e a realização de despachos (66). Referem-se igualmente dar orientações à secretaria e realizar julgamentos. A maioria (92%) deslocou-se no âmbito de processos urgentes.
A maioria das diligências que motivaram a deslocação realizaram-se, tendo apenas 9% sido adiadas. Mesmo assim, houve mudanças nos procedimentos adoptados, nomeadamente a utilização de meios de comunicação à distância, a separação/distanciamento físico dos intervenientes, a desinfecção dos espaços e uso de meios de protecção individual (máscara e luvas), a utilização de sala de maiores dimensões ou até a realização do julgamento ao ar livre, no espaço adjacente ao tribunal. Apesar de ser uma opinião minoritária, cerca de 27% dos juízes (entre os 100 que responderam a esta questão) referiram que os novos procedimentos tiveram um impacto negativo na qualidade da diligência, essencialmente, devido às limitações ou à falta de qualidade da comunicação à distância.
Dadas as condições com que se deparou, receou pela sua segurança/saúde?, perguntava-se. Sessenta e um por cento dos 116 inquiridos que responderam admitiu que “um pouco” e 14% “muito”. Um quarto disse “nada”. Questionados sobre se outros intervenientes verbalizaram receios, 74 juízes responderam que sim. Os funcionários judiciais (57), os advogados (53) e os procuradores (38) foram indicados como os principais autores das queixas.