Ministra da Justiça guineense está refugiada numa missão diplomática em Bissau

Ministério Público acusa Ruth Monteiro de não ter devolvido viaturas do Estado e de assinar passaportes indevidamente. O advogado da ministra diz que esta está “a ser ameaçada” porque “é muito incómoda no combate ao narcotráfico”.

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A ministra da Justiça foi impedida duas vezes de sair da Guiné-Bissau DR

A ministra da Justiça do Governo constitucional da Guiné-Bissau refugiou-se numa missão diplomática na capital guineense por “questões de segurança”, referiu esta sexta-feira ao PÚBLICO o seu advogado. “Está num lugar seguro, numa das missões diplomáticas em Bissau”, disse Luís Vaz Martins.

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A ministra da Justiça do Governo constitucional da Guiné-Bissau refugiou-se numa missão diplomática na capital guineense por “questões de segurança”, referiu esta sexta-feira ao PÚBLICO o seu advogado. “Está num lugar seguro, numa das missões diplomáticas em Bissau”, disse Luís Vaz Martins.

“Na história da Guiné-Bissau foi a ministra que coordenou a apreensão da maior quantidade de cocaína no país”, lembra o jurista, daí que “obviamente, tema pela sua vida”. “Sabemos que o actual regime está muito ligado a essa questão do narcotráfico. Tanto assim é que, mal se deu o golpe de Estado, houve movimentação de pessoal ligado ao narcotráfico”, explica. Por isso, “a ministra acredita piamente que, pelas informações que possui, e pelo facto de ter sido muito renhida no combate ao narcotráfico, está a ser vítima dessa mesma situação”.

Ruth Monteiro pôs a circular pelas redes sociais na quarta-feira uma mensagem a pedir ajuda por sentir que a sua vida corria perigo: “Este email constitui um grito de socorro, no sentido de, ainda hoje [quarta-feira], poder ser colocada em local seguro.”

O PÚBLICO falou com o Ministério dos Negócios Estrangeiros para saber se o Governo português estava a fazer alguma diligência em relação ao caso, tendo em conta que a ministra tem nacionalidade portuguesa e foi impedida por duas vezes de sair da Guiné-Bissau, apesar de não haver nenhum processo contra ela a correr na justiça e nenhum juiz ter decretado qualquer medida preventiva.

O MNE esclareceu que “a Embaixada de Portugal na Guiné-Bissau tem mantido contacto com a Dra. Ruth Monteiro, que tem também a nacionalidade portuguesa, no respeito pelas convenções internacionais aplicáveis e pelas questões internas à Guiné-Bissau”.

A ministra foi notificada por telefone para comparecer na quinta-feira de manhã no Ministério Público para prestar declarações, “mas foi protelada a audiência para o dia 8”, adiantou Luís Martins-O advogado ainda não teve acesso ao processo, mas sabe que a ministra está a ser acusada de não devolver três viaturas do Estado, que estariam ao seu serviço enquanto titular da pasta, e de a sua assinatura figurar na emissão de passaportes (quando Suzi Barbosa se demitiu de ministra dos Negócios Estrangeiros, o primeiro-ministro, Aristides Gomes, atribuiu-lhe a pasta interinamente, enquanto não fosse nomeado um substituto).

“Acontece que ela nunca recebeu nenhuma viatura da parte do governo, ela usava uma viatura emprestada pelo PNUD [Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento] e mal se deu o golpe de Estado ela devolveu a viatura. E este facto ficou provado porque o PNUD fez questão de levar ao aeroporto o documento que atesta a devolução da viatura”, explicou o advogado.

Isto tudo aconteceu no aeroporto de Bissau, quando Ruth Monteiro procurava sair do país pela segunda vez, momento em que soube que o MP tinha um processo contra si e que, por isso, estava proibida de viajar para fora da Guiné-Bissau.

“O MP guineense aplicou a medida de obrigação de permanência, uma medida de coacção que o MP é incompetente para aplicar, só pode ser aplicada por um juiz de instrução criminal”, explica o jurista, antigo presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), para quem isto é tudo uma manobra para impedir a ministra de viajar: “Estão a usar os poderes do MP para pressionar a ministra a que permaneça na Guiné-Bissau, no sentido de virem a prendê-la, mas de forma arbitrária, sem qualquer pressuposto legal.”

O mesmo se depreende da descrição que o advogado faz da forma como o MP guineense foi apresentando o seu caso. “Como não encontraram saída por via dessa primeira viatura, alegaram que havia uma segunda viatura” que a ministra também não tinha devolvido. Uma viatura blindada que o Estado põe ao dispor do titular da Justiça por causa das ameaças do narcotráfico.

Só que, diz Luís Martins, a ministra nunca usou essa viatura porque estava e está avariada, parada no “quintal do ministério”, facto rapidamente esclarecido, pois pessoas da LGDH tiraram a fotografia ao carro estacionado junto ao ministério e enviaram a imagem para comprovar que o que a ministra dizia era verdade. “Foi aí que falaram numa terceira viatura fantasma, que a ministra nunca chegou a receber”, mas que lhes servia o propósito de manter a sua história.

Mas a questão não se resume às viaturas, o MP também alega que Ruth Monteiro assinou passaportes sem autorização, em lugar da demissionária ministra dos Negócios Estrangeiros, Suzi Barbosa, que acabou por transitar para o Governo não reconhecido internacionalmente, nomeado pelo autoproclamado Presidente, Umaro Sissoco Embaló.

“Só que, relativamente a essa matéria, houve um despacho público conhecido, assinado pelo primeiro-ministro do Governo constitucional, Aristides Gomes, a delegar na ministra da Justiça toda a competência daquela pasta enquanto não fosse nomeado um novo ministro dos Negócios Estrangeiros”, afirmou Luís Vaz Martins.