Os meninos e as meninas que não podiam sair de casa
Acredito que as crianças olham para nós, adultos, sorriem e emocionam-se com o que lhe estão a ler, mas nós, adultos, somos demasiado infantis para deixar que sejam elas as leitoras. Hoje é o Dia Internacional do Livro Infantil.
A porta de casa trancou-se. Tudo aconteceu depois de um som muito alto ter acordado todos os meninos e todas as meninas.
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A porta de casa trancou-se. Tudo aconteceu depois de um som muito alto ter acordado todos os meninos e todas as meninas.
Pela manhã, a maioria estava habituada a acordar com a luz do dia – a ver o sol a entrar pela janela, a escutar o chilrear dos pássaros e muitos a sentir o cheiro do pequeno-almoço acabado de fazer. Mas, no dia de hoje, tudo mudou. Slam! Tranca-se a porta. Acordam todos os meninos e todas as meninas.
Ainda com muito sono, os olhos estavam a tentar abrir. Quando abrem os olhos, espreitam pela janela, mas não encontram o sol, nem os pássaros. Começam a pensar sobre o porquê do dia de hoje estar a ser diferente. Mas, como sabiam que tinham de se preparar para sair de casa, dirigiram-se à cozinha para tomar o pequeno-almoço. Quando chegam à cozinha, o pequeno-almoço não está preparado. O dia de hoje estava mesmo a ser diferente dos dias a que já estavam habituados e habituadas. E eis que de novo se ouve: Slam! De um lado para o outro olham e de boca aberta ficam. Slam! Slam! Slam! Todas as portas se trancam.
“O que é que está a acontecer?”
“Onde é que está o sol e para onde voaram os pássaros?”
“Porque é que a porta de casa se trancou? Não vamos conseguir sair de casa?”
Muitas perguntas começam a ser feitas em quase todas as casas, de algumas aldeias e de muitas cidades, na maioria dos países. O dia de hoje, para todos os meninos e para todas as meninas, ia ser diferente.
Este podia ser o começo de uma história para celebrar o Dia Internacional do Livro Infantil, hoje dia 2 de Abril do ano 2020. As histórias infantis devem ser assim – tratar de assuntos das vidas das crianças, escritas com o cuidado do seu complexo mundo simbólico. Em tempos de incerteza para os adultos, estes encontram nas palavras danças organizadas que possibilitam ajudar a compreender às crianças aquilo que juntos vivemos. Os adultos costumam estar nesta posição – ajudar as crianças a compreender. Acredito, sem o partilhar com mais nenhum adulto, que as crianças – aqueles seres infantis para quem se escreve – olham para nós, adultos, sorriem e emocionam-se com o que lhe estão a ler, mas nós, adultos, somos demasiado infantis para deixar que sejam elas as leitoras.
Nós, adultos, ao estarmos dispostos a aprender com as crianças e, portanto, deixarmos que sejam elas as leitoras, implica que, para lá de começarmos a ouvir sobre o que têm a dizer, possamos começar a compreender sobre o que têm a contar. Não é à toa que este Dia é celebrado na data comemorativa do aniversário de Hans Christian Andersen.
Mesmo que o vosso filho ou filha, neto ou neta, sobrinho ou sobrinha ainda não saiba ler, já lhe pediram para ler?