Recessão em 2020: Uma crise inesperada
A Ordem dos Economistas (OE) divulga os resultados do seu primeiro barómetro trimestral de 2020. Nesta particularmente difícil conjuntura atual, como não poderia deixar de ser, o tema afeto ao barómetro centra-se no impacto económico da atual pandemia de covid-19
Num período em que a economia mundial já se encontrava em desaceleração, a atual pandemia veio contribuir para o agravamento das previsões económicas, antevendo-se uma expectável recessão. A incerteza que permanece atualmente já não é relativa à vinda, ou não, dessa mesma recessão. Mas sim, simplesmente, sobre qual será a magnitude da mesma. Neste momento, as previsões mais recentes embora ainda marcadas por muita incerteza apontam para quebra no PIB na Europa, zona Euro e Portugal entre o intervalo de -3% e -10%.
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Num período em que a economia mundial já se encontrava em desaceleração, a atual pandemia veio contribuir para o agravamento das previsões económicas, antevendo-se uma expectável recessão. A incerteza que permanece atualmente já não é relativa à vinda, ou não, dessa mesma recessão. Mas sim, simplesmente, sobre qual será a magnitude da mesma. Neste momento, as previsões mais recentes embora ainda marcadas por muita incerteza apontam para quebra no PIB na Europa, zona Euro e Portugal entre o intervalo de -3% e -10%.
Nesse sentido, este barómetro pretende analisar o impacto económico da covid-19 ao nível do efeito de uma recessão dos mercados financeiros, bem como desenvolver algumas propostas que mitiguem os impactos negativos na economia.
Quando no trimestre anterior questionámos os membros da OE sobre a sua perspetiva do futuro da economia em 2020, nada faria antever que o cenário atual seria tão diferente do esperado. Nesse período, que já de si não era otimista, a maior fração acreditava que a economia iria ficar igual.
Contudo, o cenário mudou drasticamente, com 98% dos membros a considerar agora que a situação económica irá “piorar” ou “piorar bastante”.
Relativamente às metas orçamentais, é impreterível afirmar que pouco do que consta no Orçamento do Estado de 2020 fará sentido à luz dos acontecimentos atuais. De acordo com os cenários que traçámos, a maioria dos membros (75%) elegeu a opção em que Portugal não seria capaz de cumprir qualquer meta orçamental, devido ao risco de uma crise mundial que levará a derrapagens no défice, ao aumento do custo de financiamento da dívida e a um crescimento bastante abaixo do esperado.
O turismo foi destacadamente o setor designado como o que sofrerá o impacto mais negativo nesta crise. A crescente dependência de Portugal desde setor, que representa 13,7% do PIB, significa uma perda avultada de contribuições, que se deverá prolongar por alguns meses após o controlo desta pandemia.
Em seguida, a preocupação recai sobre o impacto nas exportações, sobre o impacto do aumento dos gastos em despesas de saúde (embora necessário), o efeito de contração da procura interna e, por fim, eventuais falhas nas cadeias de produção.
Numa avaliação do risco associado aos principais indicadores económicos - e ainda que exista uma interdependência entre todos eles - o desemprego foi o que reuniu as avaliações de risco mais elevado. Segue-se o crescimento, o aumento da dívida e do custo de financiamento, o défice e, por último, o investimento.
A hipótese de recessão é agora dada como provável, contrariamente à expectativa recente de um excedente orçamental, da manutenção dos níveis de desemprego, dos níveis de confiança anteriores e de uma redução da carga fiscal.
As quebras históricas em bolsa registadas na semana que terminou a 13 de março, marcam o término do otimismo dos últimos tempos, sendo os mercados financeiros o reflexo mais transparente das expectativas no futuro da economia. De acordo com a opinião dos membros, 76% considera que a incerteza deverá manter-se até à estabilização da pandemia, contribuindo para a contínua desvalorização das bolsas.
O atual momento de política monetária na zona euro (taxas de juro negativas) e a baixa flexibilidade da política orçamental, bastante rígida em função dos compromissos do Estado, do peso da demografia, e assente em níveis elevados de dívida criam dificuldades adicionais na disponibilidade dos mecanismos clássicos de combate às crises.
De acordo com 71% dos inquiridos, a probabilidade de se desencadear uma nova recessão é muito elevada. Num momento em que a economia também se encontra de “quarentena”, as consequências serão ainda mais nefastas, prolongando-se para lá da duração da atual crise de saúde pública. Para além de todas as medidas possíveis a adotar no sentido de minimizar mais mortes e contágios, é premente definir medidas que mitiguem os principais problemas económicos que já se fazem sentir.
Será um desafio encontrar o equilíbrio entre o fim da pandemia e as medidas que minimizem uma recessão económica. De um modo generalizado, a maioria dos inquiridos sugeriu uma intervenção concertada a nível europeu, uma política expansionista de relançamento da economia, linhas de liquidez para empresas ou uma atenuação/redução fiscal para o setor empresarial.
Em primeiro lugar a principal ameaça à economia surge do lado das empresas, onde é necessário garantir que as mesmas tenham liquidez para sobreviver ao congelamento atual, cumprindo com as suas obrigações, seja com salários, banca, fornecedores ou Estado.
O impacto afetará a maioria dos setores, sendo necessário que exista uma flexibilização das obrigações de crédito, benefícios fiscais para PME ao nível do IRC e TSU, flexibilização dos pagamentos fiscais referentes ao IVA dos primeiros trimestres de 2020 e ao IRC do ano de 2019 (bem como os pagamentos por conta de 2020), o acesso a linhas de financiamento com garantias de spreads baixos, sem que estas obriguem a uma grande carga burocrática que retire a celeridade imperativa do momento atual.
Simultaneamente, do lado das famílias, deverão ser dados benefícios somente a quem se vir privado do seu rendimento habitual, a fim de garantir níveis dignos de sobrevivência. Deverá haver especial atenção para casos com mais dependentes e menos rendimento, assegurando, por exemplo, uma maior flexibilidade no pagamento de créditos à habitação. Adicionalmente, não se poderá permitir o aumento/especulação de preços na distribuição, em bens de primeira necessidade.
As medidas aqui propostas, seguem uma lógica de aumento dos gastos públicos, bem como de contração da receita fiscal. Haverá uma forte deterioração das contas públicas, conduzindo o défice para valores elevados, possivelmente acima dos 5% ou mesmo próximo dos 10%. Se os atuais níveis de dívida pública já apresentam perigo de sustentabilidade, as consequências desta crise, que levará um aumento do volume da dívida, poderão traduzir-se em última instância, numa nova crise das dívidas soberanas e na necessidade de um novo resgate financeiro.
De modo a evitar tal cenário, e porque esta é uma crise comum a todos os países, fará sentido que exista uma resposta a nível europeu. A mesma poderá incidir sobre a emissão de eurobonds ou coronabonds, um mecanismo de mutualização de dívida associada ao impacto da covid-19, garantindo uma partilha do mesmo rating, de determinada maturidade e com uma taxa de juros comum a todos os países da zona euro.
O objetivo final é evitar ao máximo as insolvências, a redução da capacidade instalada e o aumento do desemprego, garantido consequentemente o rendimento das famílias. Todos os custos referentes a medidas de estímulo económico que não se tiverem agora, serão garantidamente imputados mais tarde sob a forma de subsídios de desemprego, abrandamento da economia, redução da receita fiscal, aumento dos custos de financiamento, etc.
Prioritariamente, é a saúde o bem fundamental a preservar, mas não é admissível que, ao fim da doença, venha uma crise económica e financeira e, para isso, é fundamental que as medidas de resposta sejam adequadas.
Os autores escrevem segundo o novo Acordo Ortográfico