Presidente da Cruz Vermelha quer hospital só para covid. Médicos discordam
Conselho de administração reúne-se na segunda-feira. Francisco George diz que a unidade tem de apoiar combate à pandemia e que no início da próxima semana estará apta a receber estes doentes. Corpo clínico considera que o hospital “não tem condições nem estrutura física para tratar doentes covid-19”
O Hospital da Cruz Vermelha vai passar a receber apenas doentes com o novo coranavírus, a partir da próxima semana. É este o desejo e a convicção do presidente da Cruz Vermelha Portuguesa (CVP), Francisco George. Mas a opção não é unânime. O corpo clínico considera que o hospital “não tem condições nem estrutura física para tratar doentes covid-19 e que daria melhor resposta ao Serviço Nacional de Saúde aceitando outras doenças que neste momento estão a ter uma resposta mais limitada.
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O Hospital da Cruz Vermelha vai passar a receber apenas doentes com o novo coranavírus, a partir da próxima semana. É este o desejo e a convicção do presidente da Cruz Vermelha Portuguesa (CVP), Francisco George. Mas a opção não é unânime. O corpo clínico considera que o hospital “não tem condições nem estrutura física para tratar doentes covid-19 e que daria melhor resposta ao Serviço Nacional de Saúde aceitando outras doenças que neste momento estão a ter uma resposta mais limitada.
As razões dos médicos estão expressas na acta de uma reunião que se realizou na passada segunda-feira, assinada à cabeça pelo director clínico e a que o PÚBLICO teve acesso. Os profissionais referem que os elevadores não são adequados à circulação de doentes covid, que o tratamento do ar é deficiente ou inexistente, que não tem quartos de isolamento ou de pressão negativa e que não existe a possibilidade de se fazerem circuitos separados para doentes com e sem a infecção.
Salientam ainda que o laboratório está externalizado, assim como o são as equipas de limpeza do hospital. Adiantam ainda que o corpo clínico composto por médicos do quadro e prestadores a tempo inteiro tem cerca de 30 elementos. Para eles, uma parte teria de ser excluída por razões de idade ou de saúde. Deixam ainda a questão sobre o acompanhamento que será dado aos doentes que seguem nesta altura.
Na acta, os profissionais começam por lembrar que “após reflexão conjunta do corpo clínico com a administração, foi inicialmente decidido que o melhor papel para a comunidade seria manter o hospital livre de coronavírus para se concentrar no tratamento de doentes urgentes do SNS em áreas” em que têm competência reconhecida. Segundo o documento, a decisão foi contrariada com a indicação de que essa teria sido a decisão tutela, mas ao jornal Expresso Francisco George referiu que foi uma decisão da própria administração.
Contactado pelo PÚBLICO, o director clínico Manuel Pedro Magalhães reafirma a posição que está na acta. “Perante essas circunstâncias, e tendo em linha de conta que continuam a existir pessoas que precisam de ser operadas a problemas urológicos ou a fracturas das pernas, consideramos que devíamos ser um hospital não covid e ajudar o SNS no que fosse preciso”.
Reunião segunda-feira
“Não estando reunidas as condições e não estando o país numa fase que tenha de ser assim [transformar o hospital numa unidade dedicada a covid], a não nos pareceu fazer sentido”, disse, salientando que os médicos “não se recusaram de maneira nenhuma” a tratar doentes positivos. Manuel Pedro Magalhães disse aguardar a decisão que será tomada na reunião do conselho de administração, que se realiza na segunda-feira.
O hospital da Cruz Vermelha tem dois accionistas. O maioritário é a CVP e a Parpública possui os restantes 45%. O primeiro tem três elementos na comissão executiva, entre eles Francisco George que é presidente do conselho de administração não executivo do hospital. A Parpública tem dois elementos.
Ao PÚBLICO, o antigo director-geral da Saúde disse que a reunião será “uma formalidade” e que a “reunião do conselho de administração tem na sua ordem de trabalhos a aprovação” de transformar o hospital numa unidade dedicada ao covid. “Disse aos meus colegas que respeitava a opinião deles, que é naturalmente fundamentada, mas há um interesse maior que é a resposta à epidemia”, afirmou Francisco George, salientando que esteve na reunião da qual saiu a acta.
“Os hospitais gerais não têm as regras ideais que teriam se fosse hospitais de doenças infecciosas. Mas não é impedimento, senão não havia transformação de hospitais em lado nenhum. Este é um hospital geral com uma dimensão muito humana e não faz sentido ignorar a epidemia”, afirmou. Disse que a unidade conta com 600 profissionais e 110 camas. Tem ainda sete blocos operatórios, a que se juntam blocos operatórios híbridos, e uma unidade de cuidados intensivos com 17 camas.
Francisco George garantiu que as questões levantadas na reunião estão a ser resolvidas, como a questão do ar condicionado e o reforço das equipas. Quanto aos doentes que o Hospital da Cruz Vermelha segue, “está a ser estabelecido um acordo de cooperação com o hospital de Sant'Ana, em Carcavelos, e no contexto desse acordo serão atendidos lá”. Há mais protocolos a ser negociados, disse o presidente da CVP, que espera que “na próxima semana” o hospital esteja apto para receber só doentes covid.