A Europa ou é solidária ou não é nada
A UE tem de ser capaz de escolher entre a solidariedade entre Estados-membros e a desunião provocada por um umbiguismo trágico.
A covid-19 é uma doença democrática, imune a géneros, fronteiras, fusos horários ou regimes. Mas este novo coronavírus não é ainda suficientemente pandémico para convencer três ou quatro países da União Europeia sobre o desafio que agora se coloca de forma veemente, como se não fosse um problema de todos, mas apenas um castigo para o desleixo e incompetência de alguns.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A covid-19 é uma doença democrática, imune a géneros, fronteiras, fusos horários ou regimes. Mas este novo coronavírus não é ainda suficientemente pandémico para convencer três ou quatro países da União Europeia sobre o desafio que agora se coloca de forma veemente, como se não fosse um problema de todos, mas apenas um castigo para o desleixo e incompetência de alguns.
Não é difícil concordar com Guntram Wolff, director do think tank europeu Bruegel, quando este diz, em entrevista ao PÚBLICO, que o que está a impedir a emissão de dívida conjunta é algo tão prosaico como isto: a crise provocada pelo coronavírus não se está a fazer sentir com a mesma intensidade em todos os países e que só haverá consenso quando o vírus se espalhar da mesma forma em todo o lado. O egoísmo nunca terá sido tão trágico.
A UE tem de ser capaz de escolher entre a solidariedade entre Estados-membros e a desunião provocada por uma miopia e um umbiguismo realmente repugnantes. Tem de ser capaz de uma resposta única, como no processo do “Brexit”, e de evitar a repetição da indiferença e altivez da crise das dívidas públicas, com mais desemprego, empobrecimento e exclusão, agora a níveis bem mais alargados e profundos. Se a UE persistir nas divisões, bem patentes no último Conselho Europeu, e na sua incapacidade de uma resposta comum, capaz de responder à sua maior ameaça desde a sua existência, a distopia de hoje destruirá a utopia do pós-guerra.
O Banco Central Europeu tem feito o seu papel: injectou 750 mil milhões de euros, travou a subida das taxas de juro que afectavam os países mais atingidos pela pandemia e com isso colocou as bolsas europeias em terreno positivo, para que a economia também possa sobreviver. Ursula Von der Leyen tem feito, igualmente, o seu papel com denodo. Angela Markel titubeia, mas sem ela não haverá solução possível. Paradoxalmente, o seu momento é este, quando a sua saída já está agendada. Ou opta pela solidariedade com Áustria, Finlândia e Holanda, na tese do quanto pior, melhor, ou opta por salvar o que ainda pode ser salvo.
O problema não reside nas instituições; no pleonasmo Bruxelas. O problema está em quem ignora os fundamentos do que foi e do que é a construção desta união na Europa. E esse é o pior dos vírus para nós, para a economia e para as instituições. Seria uma morte lenta. A inteligência consiste, dizia Bachelard, em não repetir o mesmo erro duas vezes. Oxalá.