Oito portugueses acusados de pertencer a célula terrorista vão a julgamento
Juiz Carlos Alexandre rejeitou argumento de um dos acusados, que está preso preventivamente desde Junho passado. Defesa critica decisão que diz “envergonha a Justiça portuguesa”.
Os oito portugueses que foram acusados em Dezembro passado de três crimes ligados ao terrorismo por terem feito parte de uma célula que começou no Reino Unido e que chegou a integrar o Estado Islâmico vão ser julgados por um colectivo de juízes em Portugal por adesão e apoio a organização terrorista, recrutamento para este tipo de organismo e financiamento a estas entidades. A decisão do juiz Carlos Alexandre, do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), datada de terça-feira passada, valida a acusação do Ministério Público.
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Os oito portugueses que foram acusados em Dezembro passado de três crimes ligados ao terrorismo por terem feito parte de uma célula que começou no Reino Unido e que chegou a integrar o Estado Islâmico vão ser julgados por um colectivo de juízes em Portugal por adesão e apoio a organização terrorista, recrutamento para este tipo de organismo e financiamento a estas entidades. A decisão do juiz Carlos Alexandre, do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), datada de terça-feira passada, valida a acusação do Ministério Público.
Rómulo, um dos portugueses acusados que residia há largos anos em Londres e que faz este domingo 41 anos, vai manter-se em prisão preventiva, uma medida de coacção a que foi sujeito em Junho do ano passado. Foi a defesa deste suspeito, o mais velho de três irmãos de Massamá que são visados por esta investigação, a única a pedir a abertura de instrução, tentando desta forma evitar o julgamento e conseguir o arquivamento do caso.
A estratégia não foi bem sucedida. O advogado de Rómulo, Lopes Guerreiro, não poupa nas críticas ao juiz Carlos Alexandre e à sua decisão que, diz, “envergonha a Justiça portuguesa”. “Esta decisão instrutória é a pior que já tive oportunidade de ler”, indigna-se o defensor, que se queixa que o juiz não teve qualquer preocupação em analisar os elementos que existem no processo contra o cliente, acusado de ser co-autor dos três crimes. Lopes Guerreiro argumenta que o fundamento da decisão de Carlos Alexandre “advém exclusivamente daquilo que foi vertido no relatório final da Polícia Judiciária e sublinha que o juiz de instrução “não se coibiu sequer de transcrever as cerca de 160 páginas que o compõem”. Num tom indignado, resume: “Esta decisão instrutória reflecte bem o estado em que se encontra o TCIC neste momento: um juiz/mil processos/nenhuma justiça.”
A decisão, com 446 páginas, inclui de facto mais de 150 páginas do relatório final da PJ, além de outras peças processuais, reproduzidas na globalidade ou em parte, que fazem parte do processo aberto em 2013. Trata-se de posições do Ministério Público ou de decisões da Relação de Lisboa que rejeitaram recursos apresentados pela defesa, a contestar, por exemplo, a prisão preventiva de Rómulo.
O juiz Carlos Alexandre rejeitou o principal argumento apresentado pela defesa que defendia a invalidade da acusação por esta não individualizar, para cada um dos arguidos, os factos que lhes eram imputados e a relevância criminal dos mesmos. O juiz opta por fundamentar as suas decisões com base em argumentos de terceiros, como a PJ ou o Ministério Público (MP). Numa análise ao terceiro interrogatório de Rómulo, basicamente a única diligência realizada durante a instrução, o MP nota que o arguido não teve a preocupação de explicar muitos dos factos apurados, nomeadamente por que razão fala dezenas de vezes em conversas que manteve com familiares e amigos na “morte aos porcos”. Ou o que queria dizer com “limpar mais uns quantos”. Ou explicar como um dos irmãos que foi para a Síria com a respectiva família (onde terá morrido, um facto que, como não é confirmado oficialmente, levou à sua acusação formal neste caso) usou o seu passaporte para conseguir iludir as autoridades, que já o tinham referenciado por ligações ao terrorismo.
O Ministério Público conclui, numa posição que mereceu a concordância de Carlos Alexandre, que a defesa quis “desviar a atenção do principal, dos factos que integram a prática de crimes tão graves que põem em causa a segurança nacional e internacional e transmitir a ideia de que não é possível que o arguido que, é um filho dedicado, que se preocupava com a sua mãe, tenha praticado actos desta natureza. Pretendeu a defesa mostrar o lado do arguido tio preocupado com os sobrinhos que estão na Síria e que tenta a todo o custo o seu repatriamento”. O MP sublinha, contudo, que a defesa se esqueceu que foi Rómulo quem ajudou o seu irmão, a mulher deste e os filhos, a viajarem para um palco de guerra, onde agora estão retidos.
O inquérito foi iniciado na sequência de uma informação das autoridades britânicas, na qual se dava conta do envolvimento de cidadãos portugueses no rapto de dois jornalistas, um britânico, John Cantlie, e outro holandês, Jeroen Oerlemens, ocorrido na Síria em Julho de 2012. Nessa altura, já a maior parte dos portugueses visados no processo se tinham radicado há mais de uma década em Inglaterra, onde se converteram ao Islão e se terão radicalizado.