Comissão Europeia: “Governos podem injectar o dinheiro que for preciso”
Comissão Europeia acciona cláusula de exclusão do Pacto de Estabilidade e Crescimento e elimina tecto de 3% para o défice dos Estados-membros.
Numa medida inédita, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, propôs a activação da chamada cláusula geral de exclusão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, suspendendo assim a obrigação de os Estados-membros limitarem o valor do défice orçamental ao tecto máximo de 3% do Produto Interno Bruto.
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Numa medida inédita, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, propôs a activação da chamada cláusula geral de exclusão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, suspendendo assim a obrigação de os Estados-membros limitarem o valor do défice orçamental ao tecto máximo de 3% do Produto Interno Bruto.
“Isto é único e nunca foi feito antes, mas activámos hoje a cláusula geral de exclusão [escape]”, anunciou a líder do executivo comunitário, numa mensagem divulgada através do Twitter em que assinalou que a partir de agora “os governos nacionais podem injectar na economia tanto dinheiro quanto for necessário”. “Relaxámos as nossas regras para permitir que façam exactamente isso”, acrescentou.
Depois de ter classificado a crise do coronavírus como um “acontecimento excepcional e fora do controlo dos governos”, a Comissão Europeia defendeu um regime de flexibilidade total para a aplicação das normas que regulam a política orçamental e económica, para libertar os países dos constrangimentos que os impediriam de acelerar o investimento e a despesa pública.
É o caso do Pacto de Estabilidade e Crescimento: na revisão de 2011 que ficou conhecida como o “six pack”, os países criaram provisões de excepção, para permitir um “desvio” temporário das recomendações e requerimentos habituais, para reagir a uma crise generalizada resultante de uma quebra severa da actividade económica.
“Queremos assegurar que respondemos a esta pandemia da melhor maneira possível, tanto na sua dimensão humana como sócio-económica”, vincou a presidente da Comissão. “A flexibilidade máxima das regras vai permitir que os governos nacionais apoiem os seus sistemas de saúde, os seus profissionais e toda a gente que está ser severamente afectada por esta crise”, acrescentou.
Na passada sexta-feira, a direcção-geral de Assuntos Económico e Financeiros da União Europeia avançou uma previsão de recessão técnica em 2020, em resultado do abrandamento da actividade por causa do surto de coronavírus. Os serviços têm estado a avaliar diferentes cenários, com as últimas estimativas a apontaram para uma contracção de 1% do Produto Interno Bruto da União Europeia.
Mas como admitem os técnicos, “os últimos desenvolvimentos indicam a probabilidade de um cenário ainda mais adverso”, em que a queda da actividade económica seria semelhante à da contracção de 2009, oficialmente o pior ano da crise financeira.
Estas previsões levariam, por si só, a Comissão Europeia a considerar a revisão dos requerimentos, por exemplo para o ajustamento estrutural, no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Mas além da travagem busca da economia, Bruxelas também está a ter em conta os “custos extraordinários” que os governos estão a ter tanto no combate à propagação da doença como à compensação dos sectores mais impactados e o apoio das populações.
A avaliação da Comissão Europeia foi, assim, de que se verificam todos os critérios que justificam a activação, pela primeira vez na história, deste mecanismo de excepção.
Cabe aos Estados membros da União Europeia aprovar a activação da cláusula geral de exclusão (também conhecida por escape ou derrogação) do Pacto de Estabilidade e Crescimento — na prática, com a sua mensagem desta sexta-feira, a presidente da Comissão está a pedir aos países que o façam o mais rapidamente possível.
A Comissão apresenta uma comunicação aos executivos, em que afirma que estão cumpridas todas as condições para activar esta cláusula excepcional. A activação da cláusula suspende as recomendações de Bruxelas para as contas públicas, e permite aos governos ultrapassar os objectivos estruturais ou nominais previstos no Pacto de Estabilidade e Crescimento, sem incorrer automaticamente no risco de sanções pelo incumprimento da disciplina orçamental.
Ainda assim, a Comissão avisa que se trata de um “desvio temporário” e lembra que as medidas dos governos não devem “comprometer a sustentabilidade orçamental” a médio e longo prazo. A situação excepcional será “aplicada pelo tempo necessário aos Estados-membros para implementar medidas para conter o surto de coronavírus e mitigar os seus negativos efeitos sócio-económicos”, diz a comunicação.
Numa altura em que as viagens para a Bélgica estão condicionadas e que as reuniões ministeriais do Conselho da União Europeia estão a decorrer num formato informal por videoconferência, coloca-se agora a questão da aprovação desta cláusula. Em situação normal, bastaria uma maioria qualificada para a sua activação ser decidida. Agora, a hipótese que está a ser estudada é se isso poderá acontecer através de um procedimento escrito.
A decisão foi anunciada por Ursula von der Leyen um dia depois de a Comissão Europeia ter adoptado um novo enquadramento temporário para as ajudas de Estado, e de ter apresentado uma comunicação aos Estados-membros sobre a forma de acesso ao novo instrumento financeiro para apoiar medidas de emergência em três sectores essenciais da economia impactados pela crise do coronavírus.
O novo instrumento está dotado com 37 mil milhões de euros, destinados a acções imediatas de apoio ao sector da saúde, mercado laboral e pequenas e médias empresas. “O orçamento europeu fará a sua parte”, garantiu Von der Leyen.