E aos mais velhos, como ajudar a lidar com a pandemia?

Uma comunicação adequada vai permitir-nos cumprir três dimensões essenciais na relação com os nossos pais ou com as pessoas mais velhas da nossa família: a protecção, o cuidado e o amor.

Foto
Rod Long/Unsplash

Nas minhas muito escassas e imprescindíveis saídas dos últimos dias, na minha experiência pessoal e nas conversas com vários amigos e conhecidos, tenho constatado uma espécie de resistência, por parte da população mais velha, em adoptar as precauções adequadas ao momento que vivemos, particularmente, no que respeita à permanência em casa, ou à manutenção das distâncias de segurança, em matéria de prevenção do contágio.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Nas minhas muito escassas e imprescindíveis saídas dos últimos dias, na minha experiência pessoal e nas conversas com vários amigos e conhecidos, tenho constatado uma espécie de resistência, por parte da população mais velha, em adoptar as precauções adequadas ao momento que vivemos, particularmente, no que respeita à permanência em casa, ou à manutenção das distâncias de segurança, em matéria de prevenção do contágio.

Tenho, ainda, lido vários artigos acerca de como ajudar os mais novos a lidar com o actual cenário de pandemia, mas a verdade é que me parece ser tanto ou mais importante fazer o mesmo com a população mais velha, sobretudo considerando que são eles quem se encontra em situação de maior risco e, por isso, de maior necessidade de isolamento.

Viver a situação actual em família é, no que respeita aos mais velhos (os nossos pais, tios, avós), vivê-la à distância.

Uma distância forçada, dolorosa, mas necessária e por isso hoje, mais do que nunca, é importante ajudar os nossos pais (e ajudarmo-nos) a lidar com as questões do seu envelhecimento e da sua vulnerabilidade acrescida.

A comunicação tem aqui um papel fundamental: devemos comunicar com os nossos pais reforçando os alertas para os riscos, mas sem cair na tentação de inverter os papéis ou de os infantilizar. Afinal, e como já várias vezes escrevi, ser mais velho não é ser, de novo, uma criança!

Assim, as recriminações e as zangas não só não ajudarão a modificar os comportamentos, como servirão, apenas, para criar tensões e melindres familiares totalmente dispensáveis, num tempo que já é, por si mesmo, causador de tensão e ansiedade.

Não podemos cair na tentação de, para os proteger, nos convertermos numa espécie de pais dos nossos pais e, para tal, a comunicação deve ser feita da forma mais calma, equilibrada e madura (mesmo que, em certos – muitos – momentos, sintamos que a exasperação nos domina!) e com toda a família em consonância (por exemplo, é conveniente que todos os filhos transmitam a mesma mensagem e adoptem as mesmas atitudes).

Devemos, de igual modo, evitar a excessiva “instrumentalização” da comunicação, ou seja, para além de alertarmos para os riscos ou inquirirmos acerca das necessidades práticas, devemos guardar tempo e disponibilidade para ouvir. Para ouvir as histórias do seu dia, os comentários às notícias, as suas queixas e os seus receios.

Escutar é uma dimensão essencial do cuidado e, em período de isolamento forçado, este sentimento de ser escutado é ainda mais importante e securizante.

Uma comunicação adequada vai permitir-nos cumprir três outras dimensões essenciais na relação com os nossos pais ou com as pessoas mais velhas da nossa família: a protecção, o cuidado e o amor.

Relativamente à protecção, temos o dever de reforçar, por vezes traduzindo e adaptando às realidades, à história ou às circunstâncias específicas da nossa família ou dos locais onde residem, aquelas que são as medidas de segurança a adoptar pela população em geral, alertando para o potencial de risco das faixas etárias mais velhas, mas sem converter esse risco numa inevitabilidade, ou seja, sem criar pânico. Queremos que os nossos pais sejam prudentes e fiquem protegidos e não que fiquem aterrorizados!

Quanto ao cuidado, as limitações às saídas obrigam-nos a ajudar a encontrar soluções que mitiguem as eventuais consequências. É preciso garantir que os nossos pais têm alimentação e medicação suficientes, para estes dias de isolamento. Assim, se vivermos próximo, a solução será a de fazermos nós as compras (adequadas à dieta e necessidades da sua faixa etária) e deixá-las à sua porta.

No caso de vivermos longe e não podermos fazer este tipo de acompanhamento, as preocupações serão maiores, mas existirá, certamente, algum vizinho, amigo ou familiar a quem possamos solicitar o favor de realizar esta tarefa por nós.

Em tempos de crise, as redes de solidariedade são fundamentais e devem ser desencadeadas. Esta rede de ajuda será, também, essencial para nos alertar e para activar o socorro próximo, em caso de surgimento de algum problema de saúde.

Finalmente, a dimensão mais importante na relação com os nossos pais, no enfrentamento desta fase: o amor. Trata-se de garantir que a nossa ausência não é um esquecimento, nem uma negligência, mas uma forma de protecção.

Que a ausência física dos netos não significa uma falta de amor, mas apenas isso: uma ausência física, que há-de ser temporária.

E aqui reside o grande problema, para o qual temos de ter grande sensibilidade: o “temporário” para quem tem setenta ou oitenta anos não tem o mesmo significado do “temporário” para quem tem quarenta ou cinquenta.

Tentar aligeirar este “peso” depende de nós e, nesse sentido, os telefonemas frequentes, a utilização das vídeo-chamadas e de recursos tecnológicos acessíveis, que nos permitam conversar, animar e distrair constituem uma forma de colmatar a dor da ausência e esse seu medo de que o “temporário” se possa tornar num “para sempre”.